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segunda-feira, setembro 03, 2007

O exemplo do Liverpool

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Ontem, antes do clássico entre Santos e Corinthians, 500 torcedores rivais brigaram em frente ao Emilio Ribas, próximo ao Pacaembu. Após a partida, nova confusão. Sobrou até para o santista Mano Brown, que tentou apartar o conflito e acabou preso. Desfeito o "engano", foi liberado. Nada incomum, infelizmente no futebol brasileiro, e o público de onze mil pessoas deixa claro o efeito que isso tem em quem quer ir torcer mas não pretende arriscar acabar apanhando.
Introdução feita, na Inglaterra, país dos famosos hooligans que, depois de um trabalho sério do Poder Público local dão muito menos trabalho que qualquer organizada tupiniquim atualmente, vem um exemplo comovente de integração de equipes rivais. A parceira Bia está em Liverpool e foi assistir a partida entre o time dos Beatles e o Toulose, para decidir quem iria para a fase de grupos da Liga dos Campeões da Europa.

Mas a cidade ainda estava em choque. Na quarta-feira passada, dia 22, Rhys Jones, de 11 anos, foi assassinado com um tiro na cabeça enquanto jogava bola, no estacionamento de um pub em Liverpool. Provavelmente, mais um crime de gangues juvenis que estão ganhando corpo em alguns lugares da Europa.

Ao centro, a mãe de Jones ao lado do pai e do irmão do garoto






O garoto era torcedor do Everton, maior rival do Liverpool, e tinha ingressos para todas as partidas do time na temporada. Isso não impediu que o menino fosse homenageado pelo clube rival no jogo contra o Toulose. Bia descreve assim a homenagem:

No jogo contra o Toulouse, da França, que valia vaga para a fase de grupos da Liga dos Campeões, o Ainfield recebeu os pais e o irmão de Rhys. O azul da camisa do Everton contrastava com o vermelho das 43 mil pessoas que lotavam o estádio. A princípio, os dirigentes estavam com receio de que os torcedores do Liverpool não recebessem bem aqueles três “rivais”.

Mas a recepção foi melhor do que todos ali poderiam imaginar. A começar pelo profundo e respeitoso silêncio que tomou conta do estádio enquanto os auto-falantes tocavam Johnny Todd, hino da torcida do Everton. Traduzindo para o futebol brasileiro, é a mesma coisa que os palmeirenses respeitarem e aplaudirem a execução de “Corinthians minha vida”, em pleno Palestra Itália, onde os torcedores chiam até com o preto e branco no banner do patrocinador. Os torcedores do Liverpool, que também não admitem a cor azul em Ainfield, tiveram essa atitude e, em seguida, dedicaram o próprio hino, “You’ll never walk alone”, para o menino.

Foi a cena mais bonita que presenciei em um estádio de futebol. É fato que, se a cada rodada, fossemos homenagear as mortes estúpidas que acontecem no Brasil, seriam horas, não minutos de silêncio. E um silêncio que não seria respeitado. Afinal, respeito é uma palavra que passa longe do futebol brasileiro, onde o hino nacional é vaiado e jogador precisa ir a um programa de televisão dizer que é macho.

O comportamento dos torcedores do Liverpool foi tão sensacional que, ao final da partida, apesar da goleada por 4x0, a barulhenta torcida do Toulouse cantou e aplaudiu o nome do Liverpool. Na saída do gramado, a mãe de Rhys declarou que o menino deve ter aberto um sorriso ao saber que foi o motivo da execução de Johnny Todd na casa do maior rival.

Mas muito mais do que o feito histórico, Rhys fez os ingleses provarem que ainda há pessoas que cultivam valores mais importantes do que o inexplicável, louco e, muitas vezes, violento, amor por um clube de futebol. Nem tudo está perdido!

Sim, há coisas mais importantes que o futebol. E são muitas.

Leia o post completo da Bia.

8 comentários:

Anônimo disse...

Certa vez entrevistei um especialista em "hooligans" aqui na Inglaterra e ele disse que isso não era mais um problema para o futebol inglês. Aprontou dentro ou fora do estádio, é cadeia e punição.
Assim como é impossível imaginar um gesto como o dos torcedores do Liverpool no Brasil, não dá pra acreditar que, um dia, esses marginais serão punidos... Infelizmente...
bjs Glauco!

Marcão disse...

Como sempre, eu estava distraído, lesado e desinformado (e ainda meio bêbado) quando resolvi sair de casa, no domingo, por volta de 14h, com a camisa do São Paulo. Peguei o metrô e fui até a Liberdade, comprar aquário e peixes que havia prometido para minha filha.
Depois, voltei para o metrô Clínicas. Quando desci, tava cheio de polícia e um deles, educadamente, me perguntou se eu pretendia subir para a Dr. Arnaldo.
Foi só nesse momento que me lembrei do jogo no Pacaembu - e a estação Clínicas é tradicional ponto de encontro de torcedores, que descem dali, a pé, para o Pacaembu.
O pior é que a provocação parecia dupla: além da camisa do São Paulo, eu tava com um saco plástico com dois peixes dentro!
Respondi ao policial que, óbvio, não ia pra Dr.Arnaldo. Saí pelo outro lado, do Hospital, e dali peguei o rumo de casa.
Mas, apesar de já ser umas 15h30, juro, não tinha UM torcedor com uniforme (do Curíntia ou do Santos) nas imediações.

Anselmo disse...

é impressionante imaginar esse tipo de homenagem na Inglaterra. Se seria impensável no Brasil, também era impensável na Ingleterra até esse jogo.

prova disso é que os dirigentes estavam apreensivos com a possibilidade de a hostilidade contra os adversários fosse maior do que a noção.

excelente o relato.

Anônimo disse...

Sensacional o post. Por aqui, eles cantam hinos de guerras, como se faz na Escócia ou em Zagreb. Ou seja, não estamos sozinhos no saco da violência, muito menos quando se trata de ter esperança num futuro pacífico.

Anônimo disse...

Certamente inimaginável por estas plagas ... Emocionante o relato.

Vinicius Grissi disse...

Maravilhoso texto!!!! Realmente o Brasil está anos luz atrás do futebol europeu, em todos os sentidos. Precisa melhorar, e muito, em muitas coisas.

Anônimo disse...

Belo relato. Realmente essas atitudes das massas no esporte emocionam.

Aqui no Rio, ocorre um fenômeno interessante (na verdade, interessante só no sentido de estudo, porque é uma constatação triste).
O Flamengo tem levado todo jogo no Maracanã, 50.000 torcedores. Mesmo nos clássicos.
Constata-se aí, que o clássico contra o Flamengo, afasta torcedores dos rivais, além de afastar inclusive flamenguistas que possivelmente fogem de confusão.

Glauco disse...

É isso mesmo, Victor. E ainda tem gente que acha que a violência não afasta os torcedores dos estádios...