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terça-feira, março 24, 2009

'Sem a cachaça, ninguém segura esse rojão'

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A frase que dá título ao post é um fragmento da canção "Meu caro amigo", que Chico Buarque e Francis Hime endereçaram ao diretor de teatro Augusto Boal em 1976. O trecho completo diz: "Muita mutreta pra levar a situação/ Que a gente vai levando de teimoso e de pirraça/ E a gente vai tomando, que também, sem a cachaça/ Ninguém segura esse rojão". Pois então, desde que tive a feliz (ou infeliz) ideia de me enfiar no jornalismo, uma dúvida cruel, no estilo Tostines, passou a rondar meu cérebro: será que virei jornalista por ser um bêbado ou virei um bêbado por ser jornalista? Perguntas difíceis, mas acho que foi um pouco de cada coisa. Eu já era um bêbado, só que, uma vez no exercício da maldita profissão, meu consumo de álcool subiu à estratosfera (aliás, "maldita" é sinônimo de pinga). Porque, como diz a música, "sem a cachaça ninguém segura esse rojão" - ou "esse patrão" ou "esse cliente" ou "essa pauta entrolhada" ou "esse salário mixo" ou "essa jornada de trabalho 24 horas" ou "essa enganação de leitores" etc etc. Haja mutreta pra levar a situação!

Mas há um outro sentido nisso. Porque o próprio vício de escrever acaba sendo uma espécie de "cachaça". Veja só o exemplo do coletivo de jornalistas aqui do Futepoca: todos se matam de escrever nos seus empregos ou freelances e, na hora de relaxar e descontrair, o que fazem? Escrevem mais ainda, aqui no blogue! Não é coisa de viciado? Ou antes: não é coisa de bêbado? No blogue "Invasão bárbara", Amanda Luz escreve justamente: "Jornalismo é uma cachaça". E descreve: "O jornalista, em geral, não tem horários certos de trabalho, quase não tem férias, vive com a cara no computador". Em outro blogue, "Os olhos da lua", Luana Dias completa: "Confesso que às vezes a rotina é desgastante e eu tenho vontade de mandar tudo às favas, porém, quando percebo, já me embebedei de outra história e estou com vontade de saber qual será a próxima. Um amigo me disse que esta profissão 'é uma cachaça'. Concordo. Eu já estou viciada". E eu também viciei: na escrita e na bebida.

Luana utiliza ainda, como epígrafe, uma frase da genial escritora Clarice Lispector: "Escrever é abençoar uma vida que não foi abençoada". Gostei, tem a ver comigo. Mas acrescento, em relação ao meu trabalho de cada dia (cara de pau para entrevistar qualquer pessoa ou escrever qualquer porcaria, por exemplo), a máxima do médico Willian Osler: "O álcool não faz as pessoas fazerem melhores as coisas; ele faz com que elas fiquem menos envergonhadas de fazê-las mal". É exato. E tá na hora de ir ao buteco tomar mais uma "branquinha" e brindar aos pobres dos (meus) leitores!

5 comentários:

Glauco disse...

Pior que escrever é um vício que se adquire desde pequeno, é predisposição genética mesmo. Se bem que álcool também é, mas que o fator ambiental ajuda, ajuda.

Olavo Soares disse...

Escrever é um vício do qual não abro mão. Assim como o futebol (assistir e/ou comentar, e não jogar).

Já a cachaça... dessa sou praticante eventual. Não sou viciado, para sorte do meu corpo, já mal-tratado pela ingestão regular de calorias acima dos índices recomendados pela OMS.

Anselmo disse...

esse texto é um manifesto?

tem outro vício que tá ligado a escrever, mas que pode existir separadamente, que é o de contar histórias e causos. Esse acho que o bar fomenta mais.

me lembro do olavo dizendo uma vez (por favor, me corrija se for besteira ou se você tiver mudado de ideia) que aceitaria trabalhar numa campanha eleitoral do Maluf para acumular um repertório de histórias sobre o folclórico político de ascendência libanesa. Pra acumular causos.

Até onde sei, não houve oportunidade pra ele decidir por isso, mas é curioso.

Olavo Soares disse...

Opa, é por aí mesmo, Anselmo.

Marcão disse...

Esse vício de contar histórias e causos eu não sei muito bem se tenho...