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terça-feira, junho 28, 2011

Ainda sobre Paulo Renato

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A mídia comercial em peso ressaltou o "legado" que o ex-ministro Paulo Renato deixou para a Educação no Brasil, como já destacou nesse post o Idelber Avelar. Em geral, são considerações puramente laudatórias ou vagas mesmo, mas alguns articulistas (e políticos no Twitter também) aproveitaram para fazer um contraste com a gestão de Fernando Haddad, fazendo desta algo bem inferior àquela.

Quem quiser de fato saber um pouco mais sobre a gestão de Paulo Renato, recomendo o post do Idelber. Ali, ele lembra que, durante sua estada no ministério, o tucano não pôde apresentar "uma única universidade ou escola técnica federal criada, nem um único aumento salarial para professores, congelamento do valor e redução do número de bolsas de pesquisa, uma onda de massivas aposentadorias precoces (causadas por medidas que retiravam direitos adquiridos dos docentes), a proliferação do “professor substituto” com salário de R$ 400,00 e um sucateamento que impôs às universidades federais penúria que lhes impedia até mesmo de pagar contas de luz".

Mas lembrei também de outro dado curioso, ainda mais em tempos nos quais se discutem as "consultorias" e a relação entre o interesse público e o privado. Em uma matéria que fiz para a revista Fórum, quando ainda se falava de reforma universitária no governo Lula, em 2005, o foco era analisar como o ensino privado havia crescido tanto no governo FHC.  E o trecho abaixo mostrava como a mistura de interesses de homens públicos já era algo complicado (embora menos visado) em governos anteriores:

Na prática, mesmo havendo um vácuo na legislação que garantia ampla liberdade de movimento às instituições privadas, o MEC trabalhou para facilitar o caminho dos mecenas da educação. No decorrer do processo, mesmo tucanos de carteirinha acabaram afastando-se da área.O filósofo José Arthur Gianotti, por exemplo, se retirou do Conselho Nacional de Educação (CNE) quando as faculdades Anhembi-Morumbi adquiriram o status de universidade, em 1997. “A câmara [de Educação Superior, uma das que compõe o Conselho] se transformou numa reunião de lobbies, num fórum de partilha de interesses privados”, denunciou à época o filósofo. Quem substituiu Gianotti foi a antropóloga Eunice Durham, que saiu do CNE em 2001 por discordar da política de expansão do ensino superior praticada por Paulo Renato. “Tem havido um crescimento desmesurado do sistema privado de ensino superior, que ameaça a credibilidade do sistema porque desequilibra a proporção público e privado”, declarou à Folha de S. Paulo ao sair.

Durante a gestão Paulo Renato, outros fatos curiosos mostravam que a relação entre o interesse público e o privado era bem mais estreita do que se podia imaginar. Eda Machado, esposa de seu chefe de gabinete, Edson Machado, conseguiu, no ano de 1998, autorização do MEC para abrir o Instituto de Educação Superior de Brasília (Iesb) com seis cursos de uma só vez. Dois anos depois, a faculdade já havia dobrado o número de cursos e contava com três mil alunos. Alguns membros do CNE também prestavam serviços de consultoria para faculdades particulares.

Mas, para aumentar o espaço das privadas no ensino superior era preciso subsidiar a ampliação do seu espaço físico. Por isso, em 1997, o Ministério da Educação, em conjunto com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), estruturou o Programa de Recuperação e Ampliação dos Meios Físicos das Instituições de Ensino Superior que, só no ano 2000, ofereceu R$ 750 milhões a juros camaradas, principalmente para entidades privadas, já que as públicas tinham dificuldades para ter acesso aos recursos devido às restrições impostas pelo governo para evitar endividamento de órgãos públicos.

Entre as instituições agraciadas com dinheiro público estava o Grupo Positivo, do Paraná, um dos maiores grupos privados de ensino do Brasil. Hoje, a consultoria criada pelo ex-ministro Paulo Renato tem como um de seus clientes justamente o conglomerado paranaense. “Somos nós que entendemos desse negócio”, gabou-se o ex-ministro ao anunciar a abertura de sua consultoria, em sociedade com o seu filho.

(A matéria completa está aqui)

O pau que hoje bate (com razão, a meu ver) em Chico (ou Antonio), não bateu em Francisco. Àquela altura, já era mais do que hora de se debater a regulação das ditas consultorias de pessoas que ocuparam cargos públicos e depois migraram com seu "conhecimento" para a iniciativa privada. Vamos esperar o próximo episódio nebuloso?

6 comentários:

Nicolau disse...

Sempre que vejo esse tipo de coisa, fico em dúvida se as motivações do cara foram egoístas, do campo da corrupação mesmo, ou se foram ideológicas. Quer dizer, se o cara acreditava mesmo que a privatização do ensino superior é o melhor caminho a ser seguido para o pais como um todo ou se era só um discurso para encher os bolsos de seus amigos de grana. Talvez uma coisa não exclua a outra. E talvez essa seja apenas uma dúvida um tanto ingênua, rs...

Marcão disse...

"Está morto: podemos elogiá-lo à vontade." - Machado de Assis

Geopolêmica disse...

Quando se propalava a necessidade de expansão do ensino superior privado argumentava-se coisas do tipo: "Há uma demanda represada por mais vagas" e "O estado não terá como investir para criá-las".....sempre no mesmo tom de todas as demais privatizações ocorridas nos anos FHC. O problema é que se abriu uma faculdade em cada esquina, a maioria de qualidade duvidosíssima,, cursos à distância e para fins de semana, baratinhos e ruinzinhos ao mesmo tempo.

Nicolau disse...

Geopolêmica, o problema é esse mesmo, concordo. Mas só pra gerar uma polêmicazinha, lembro de um pessoal do Pará que encontrei num evento do movimento sindical e que defendia muito os cursos à distância. Num estado daquele tamanho e com dificuldades de locomoção, parecia a eles uma opção importante. Eu, que rejeitava a ideia de cara, tie que pensar um pouquinho a respeito, rs. Será que dá pra ter qualidade num esquema desses?

Anselmo disse...

boa... bem lembrado.

Maurício Ayer disse...

Engraçado como se constroem imagens nesse país. Objetivamente, se formos comparar a gestão do Paulo Renato com a do Haddad não ia sobrar pedra sobre pedra pro tucano. Uma avaliação completa do trabalho do atual ministro da Educação é coisa muito necessária.

Se posso me dar ao luxo de apontar um feito positivo de Paulo Renato foi o início dos provões, ou seja, a instauração de um mecanismo de monitoramento do aprendizado dos alunos no Brasil. Mas difícil ir além desse ponto.