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sábado, julho 16, 2011

O futebol feminino do Brasil por quem conhece

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Depois da derrota da seleção brasileira para os Estados Unidos nos pênaltis, no Mundial da de futebol feminino, choveram avaliações sobre o porquê do Brasil ter perdido. O Futepoca não se arriscou na área e foi conversar com quem entende de futebol feminino no país: Luciane Castro, do Futebol para Meninas e titular do blogue Laço de Chuteira. Na entrevista abaixo, ela fala sobre a eliminação do Brasil, o esquema adotado pelo técnico Kleiton Lima durante o Mundial e a organização da modalidade que ainda engatinha no Brasil. 

Futepoca - Você criticou bastante a preparação da seleção para o Mundial. Como foi esse período pré-Mundial?

Luciane Castro - O Brasil disputou o Sul-americano no ano passado, e as seleções vizinhas estão muito aquém da nossa seleção. Nessa competição, nos classificamos para o Mundial e para as Olimpíadas de Londres. Depois, teve o Torneio Cidade de São Paulo, com Canadá, México e Coreia do Norte. Preparação mesmo a seleção não teve, foi o que cansei de falar. Enquanto a maioria das seleções que disputaram o Mundial participaram de torneios da Europa e fizeram uma série de amistosos, com oportunidades de jogar contra rivais que disputariam o Mundial, o Brasil planejou dois amistosos, contra o Chile, que foi mais uma festa para a Marta; e com a Argentina, no Recife, que acabou não sendo realizado por causa das cinzas do vulcão. De qualquer maneira, segundo informações que tive, a CBF foi convidada para a Algarve Cup, e recusou. Ela não teria aceitado porque o que se pagava era pouco para levar a seleção feminina pra lá.
Mesmo assim, apesar de todas essas dificuldades, elas chegaram lá e fizeram frente. O que faltou foi uma orientação, o que prejudicou a seleção foi a disposição das atletas em campo.

Futepoca - O técnico Kleiton Lima inventou demais?

Luciane - Até comentei que o Kleiton estava “carpegiando”, porque a Maurine, por exemplo, alguns falam que é lateral, mas a vi de meia direita, e foi excepcional. Comentei que vi essa menina dando um passe à la Didi na Copa de 1958 que fiquei passada, ela jogou o fino nessa posição porque mete correria, tem visão de jogo. Na seleção, vi a Maurine correr nos três jogos pelo lado esquerdo, dominando com a canhota, mas conduzindo com a direita. Já a Rosana é lateral, e foi deslocada pra uma função que matou o jogo dela, a Marta tinha que voltar e armar a jogada, a Érika jogou como líbero. Até um jornal alemão criticou essa disposição tática que o Kleiton impôs, porque libero é uma função primitiva. A Cristiane, por exemplo, vejo mais como uma pivô, e quase não fez essa função no Mundial.
Kleiton Lima inventou demais no Mundial?
E sobrou pra quem? Pra zaga segurar o rojão, e pra Formiga e pra Estér. Quero conversar com o Kleiton e pedir pra ele explicar. As vitórias da primeira fase enganaram de algum modo, estava dando certo, então, vamos manter. Mas estávamos tomando sufoco por pouco. Alguns técnicos querem ser o Rinus Michels do século 21, querem inventar um esquema tático sensacional quando poderiam utilizar as atletas nas suas melhores condições.

Futepoca - Na partida em que o Brasil foi eliminado, ele demorou pra mexer quando a seleção ficou com uma jogadora a mais?

Luciane - Ele demorou pra mexer em todos os jogos, geralmente não mexia, não substituía, só mudava a posição das meninas em campo. Em um dos jogos [contra Guiné Equatorial], ele avançou a Érika, foi quando ela fez um golaço. Eu credito a eliminação a ele, não é uma questão pessoal, não entro no mérito da pessoa, entro no mérito do treinador, não vi uma liderança em campo. Faltou não só mexer na hora certa, mas mudar o esquema.

Futepoca - Curioso pensar que, nessas condições diante da seleção masculina, ele não seria mantido no cargo...

Luciane - Não sei, mas fico pensando quem poderia assumir. Tem outros fatores pra considerar, a preparação física, que tem que ser super diferente. Fui conversar com o fisiologista do Hospital das Clínicas e é tudo diferente, é preciso ter uma comissão técnica especializada para a modalidade feminina, e não sei se isso acontece. O jogo das meninas não é igual ao jogo dos homens, não dá pra ser igual. Porque não culpo as jogadoras? Porque a gente sabe em que condições elas estão, como são os estaduais... Em relação aos estaduais que temos, por exemplo, o Paulista, é o mais organizado do país, mas o carioca, os do norte/nordeste não são, são poucas as federações que trabalham de forma séria, com datas definidas.
Não estamos só chorando apoio, mas temos que mudar a postura de que não é só pedir, é exigir, tem que mudar as atitudes das meninas. Tem um medo relacionado ao que aconteceu num episódio de uma das convocações do Kleiton, quando uma blogueira colocou uma opinião dela e começaram a pipocar comentários anônimos com acusações pesadas contra o técnico. Ela foi processada, tirou o blogue do ar, e uma repórter da ESPN foi fazer uma matéria com algumas meninas, que acusaram o Kleiton de forma anônima, mas tinham medo de falar publicamente por correrem o risco de não ser convocadas pra seleção. Pensavam em si, na convocação, não no coletivo.

Futepoca - Uma mudança de postura é fundamental então.

Luciane - Sim, a minha briga é quase todo dia. Organizamos em parceria com o Museu do Futebol e fizemos um bate papo sobre o futebol feminino, convidamos o ex-presidente do Santos, Marcelo Teixeira, que fez um trabalho espetacular fomentando o futebol feminino, ele trouxe a Marta e a Cristiane, ganhou a mídia... Convidei a Rose do Rio, primeira técnica de futebol feminino do Brasil, porque a mulheres era proibidas de de praticar futebol no país; e o Dema, gestor do Palmeiras feminino. Cansei de tentar divulgar o evento com as boleiras no Facebook, mas só compareceu a Renata Capobianco e a Indianara iria, mas estava doente. A mulherada tem que se unir e mudar essa postura, penar mais coletivamente.
A mídia também poderia abrir esse espaço pras meninas, tem tanta coisa pra abordar no futebol feminino, boleiras, CBF, federações. É sofrido até cobrir futebol feminino, poucos clubes têm assessoria de imprensa. Mesmo com tudo isso, a seleção é competitiva, mandei um dossiê para a Alemanha, um texto mostrando como é a organização aqui porque lá fora os caras acham que, pela qualidade da nossa seleção, tudo é muito organizado. Mas a coisa só vai mudar mesmo quando as boleiras conseguirem entender que tem que mudar a postura, não pode mendigar como se a CBF estivesse fazendo um favor pro futebol feminino.

7 comentários:

Thalita disse...

sabe quando o futebol feminino vai ter apoio sério da CBF e federações? Nunca, pelo menos com os atuais e eternos mandatários.
Muito boa a entrevista, pra gente entender o que está por trás dos repetidos quases da seleção. Mas não deixa de ser frustrante.

Pre não passar em branco, BEM JAPÃO! Novas campeãs mundiais de futebol!

fredi disse...

Bela entrevista, Glauco.

Acompanhei alguns jogos do mundial, mas não a eliminação.

A entrevista revela alguns pontos interessantes para entender por que o time da melhor jogadora do mundo perde nos momentos decisivos.

Aliás, de onde vêm esses técnicos desconhecidos que dirigem a seleção feminina e as seleções de base do Brasil? Alguém sabe?

Bárbara disse...

Gostaria apenas de ressaltar o maravilhoso trabalho da Lu Castro no blog dela e dar os parabéns também pela entrevista. E sobre o Kleiton... Bom, ele não é desconhecido visto que conquistou diversos títulos pelo time feminino do Santos mostrando não ser tão incompetente assim não. Mas falhou e muito nessa copa do mundo e foi sim, um dos principais motivos para a nossa eliminação. Agora vamos ver o que a nossa tão querida CBF fará...

Glauco disse...

Vi uma entrevista do Kleiton Lima dizendo que a preparação física era um ponto importante, já que o Brasil não tem trabalho de base e isso prejudicaria o condicionamento das atletas mais à frente. Isso é um fato, mas se houvesse um campeonato de clubes regular no país e se a CBF se atentasse ao problema, como diz a Luciane, o problema seria minorado.

Lembro de um jogo que vi in loco, a final da Libertadores feminina em 2009, e o Santos era bem superior ao Universidad Autónoma, do Paraguai, mas terminou o primeiro tempo com uma vantagem de 2 a 0. A partida terminou 9 a 0, e foi muito por conta do preparo das Sereias da Vila ser muito superior ao das paraguaias. Se for feito um trabalho específico nessa área, a impressão é que as brasileiras vão fazer valer (ainda mais) a sua técnica.

Akino disse...

Gostei do comentario, a realidade do futebol feminino é critica, e vai ser muito dificil mudar esse quadro porque os investimentos não chegam, o masculino que ja está estabelecido absorve tudo, é muito dificil convencer os investidores que vale a pena, o que deu pra ver no pam do Rio é que a torcida vai, mais dai a montar um campeonato decente esta muito longe, principalmente porque os cartolas não acreditam, acho que só mesmo utilizando uma formula nova, algo que nunca foi usado, faria com que a arte das meninas do Brasil fosse valorizada, eu até tenho essa idéia e espero colocar em pratica.

Anônimo disse...

Essa Luciana Castro entende tanto de futebol que está cuidando de cachorros em um chacara e já não trabalha mais no meio. Tremenda corneteira e oportunista.

Anônimo disse...

As meninas que o acusaram anonimamente responderam ao processo civil e criminal e já tiveram que pagar uma indenização pelas acusações absurdas e levianas. É por essas e outras que o Futebol Feminino no Brasil não vai para frente. Elas não merecem nem respeito, nem dó.