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quinta-feira, fevereiro 16, 2012

Uma prancheta sem poesia

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Por Luciana Nepomuceno


Eu sou cearense, nascida e criada. Moro no Nordeste. Só conheci o Maracanã em 2010. Quando me interpelam – e fazem isso com frequência, creiam – sobre minha paixão pelo Flamengo, eu sempre respondo que a origem geográfica de Caravaggio, Nina Simone ou Patativa do Assaré nunca foi pré-requisito para a beleza que eles produziram me comover. Aprendi a torcer como consequência da admiração, do enlevo, do encantamento. Aprendi a torcer pela impressão que abeleza das jogadas em vermelho e preto produziam em mim. Ainda hoje, sou desses seres estranhos que se agradam mais com um jogo bem jogado que com uma vitória sem graça. E, ainda mais esquisita, sou daquelas idealistas que acreditam que estas coisas – bom jogo e vitória – não são excludentes por princípio. Não sou, digo logo, contra um time que joga bem na defesa, ainda lembro a elegância dos desarmes de Juan, o posicionamento inteligente de Junior e só uma pessoa com muita má vontade não reconheceria o engenho de um jogador como Gamarra.

Isto posto, já dá pra imaginar que eu não gostei nada, nada, do empate em 1 a 1 de ontem à noite, contra o argentino Lanus. Sim, blá-blá-blá, casa do adversário, blá-blá-blá, não deixaram jogar, mas o que eu vi em campo foi um time irritantemente aferrolhado. Como listar todas as ofensas? Entrar com Airton, Maldonado, Williams. Ver, jogo após jogo, o Renato Abreu se posicionar mal, perder bola na intermediária, facilitar contra-ataques e ser redimido por um gol qualquer de bola parada. Ouvir, minuto após minuto, condenarem o (fraco, é certo) futebol do Ronaldinho, como se um meia perdido entre quatro volantes e o Deivid (sem comentários) pudesse fazer alguma coisa significativa a não ser por sorte ou fortuita manifestação de talento. Adivinhar que o gol obtido nos últimos minutos do primeiro tempo só pioraria a postura da equipe. Ter que reconhecer que Léo Moura é a única esperança de jogada de ataque. Tentar entender que gosto tem uma vitória magra e mal jogada, tendo Bottineli – não exatamente um craque, mas, pelo menos, capaz de passes precisos com mais de meio metro – disponível no banco. E, claro, colocar o Negueba faltando dois minutos pra acabar o jogo só pode ser deboche.

Desligada a TV, fica a certeza de que o mais discutido (e discutível) foi a imagem obtida pela emissora de televisão da prancheta do Joel. E tudo isso não é o que mais me entristece ou assusta. Sabe o que é pior? Não há nada no passado do Papai Joel que indique uma mudança de rumos. Resta-me lembrar que somos, eu e Joel, transeuntes, e esperar que um tiquinho de criatividade, leveza e empolgação surjam, aqui e ali (mais ali, por favor). Porque, ontem, o Flamengo em campo passou longe de justificar minha resposta, arte e beleza passaram longe e nem mandaram lembrança:



PS: E como é irritante jornalista e narrador comentando Ilariê no meio da transmissão.

Luciana Nepomuceno, flamenguista, é dessas. Dessas que reescrevem tudo, que gostam de ficar na rua vendo a lua virar sol, que riem alto, que borram o batom e que se exaltam. Tem o hábito de ser feliz. Se espalha em alguns blogs, quase sempre no Borboletas nos Olhos

10 comentários:

Nicolau disse...

Tenho uma birra histórica do Renato Abreu (quando jogava no Corinthians ele não tinha sobrenome) desde os idos de 2001, 2002. Acha que joga muito mais do que realmente faz. E tem uns cabra que acreditam...

No mais, boas vindas para a Luciana, que traz mais poesia para este ébrio fórum. Valeu!

PS.: Muito boa essa música!

Glauco disse...

Bem vinda, Luciana! Belo texto e vale a reflexão como nenhum dos brasileiros que estrearam na Libertadores, mesmo os que venceram, jogaram um futebol que desse de fato pra animar suas torcidas. No caso do Flamengo, ainda tem o agravante do "Papai Joel" no banco, que não é exatamente um amante do futebol ofensivo...

Mas acredito e espero que isso mude (pelo menos para o Santos, rs).

Moriti disse...

"Ainda hoje, sou desses seres estranhos que se agradam mais com um jogo bem jogado que com uma vitória sem graça. E, ainda mais esquisita, sou daquelas idealistas que acreditam que estas coisas – bom jogo e vitória – não são excludentes por princípio.".

Que ótima estreia, Luciana! Seja bem-vinda!

Luciana Nepomuceno disse...

Obrigada, Nicolau, pelo gentil convite e ainda mais pela acolhida. Também embirro com o Renato Abreu -ele não tinha sobrenome, nem futebol, rá!

Glauco, você pode ter esperança porque, afinal, Neymar e Ganso fazem diferença. Mas o senhor do seu banco não é tão melhor que o meu, não...

Moriti, obrigada pela leitura com olhos generosos.

estou bem contente de escrever aqui!

Maurício Ayer disse...

Que som legal!

Parabéns pelo texto!

Luciana Nepomuceno disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Luciana Nepomuceno disse...

Zaz é uma delícia que não canso de (re) descobrir.

Obrigada pelas boas vindas ;-)

[patife] disse...

A coisa que Luciana mais sabe fazer é encher os olhos nossos com suas letras.

Parabéns, queridona, pela estréia! ;)

Anselmo disse...

que som legal (2).

agora, deixa o Ilariê! Ou melhor, deixa o narrador (no mudo)... Aliás, o Futepoca deveria retomar uma ideia já jogada ao ar há um tempão de pedir que as emissoras transmitissem o som ambiente, sem comentários nem narrações por outro canal de áudio, acessível via tecla SAP.

Mas isso tem nada a ver com o ótimo texto de estreia da Luciana no Futepoca. Bem-vinda!

Luciana Nepomuceno disse...

Anselmo, muitas vezes deixo a tv sem som quando estou vendo um jogo, de tão chato que é (ok, confesso, eu gostava do Sílvio Luis)...adoro a idéia do som ambiente. E obrigada pelas boas vindas!

* - *

Patife, querido, você por aqui? ;-)