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sexta-feira, julho 05, 2013

Quando a mídia começou a mandar no futebol

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Rede Globo e CBF: relações promíscuas
Em 2012, as cotas de TV representaram 40% do faturamento conjunto de R$ 3,08 bilhões dos 20 maiores clubes brasileiros em 2012, segundo estudo do consultor Amir Somoggi divulgado recentemente. Isso explica a ingerência explícita de grupos de comunicação como a Rede Globo na (des)organização do calendário futebolístico nacional, no dia e horário dos jogos, na cartolagem da CBF e dos clubes e em outras questões decisivas. Mas esse tipo de promiscuidade vem de muito longe. O livro "O Marchal da Vitória - Uma História de Rádio, TV e Futebol", biografia do finado empresário e cartola Paulo Machado de Cavalho, de autoria dos jornalistas Tom Cardoso e Roberto Rockmann (Editora A Girafa, 2005), aponta momento exato em que política, poder, dinheiro, futebol e comunicação se cruzaram no Brasil.

Record engajou-se na 'Revolução'
Depois de comprar a minúscula Rádio Record em 1931, Machado de Carvalho conseguiu projetá-la no ano seguinte ao engajar-se fortemente na "Revolução Constitucionalista" do ano seguinte, insurreição da elite paulista contra o ditador Getúlio Vargas que contou com a adesão total da referida emissora de rádio para mobilizar a população. Após três meses de batalhas, o governo federal venceu os paulistas e fechou a Record - que seria reaberta graças aos contatos amistosos de Carvalho, filho de tradicional família "quatrocentona" paulistana, com o general Cordeiro de Farias, indicado por Vargas como novo chefe de polícia em São Paulo. Mais do que isso: o ditador se interessou pelo poder da emissora a usaria para seus fins populistas. Porém, no rescaldo daquele pós-"Revolução Constitucionalista", a Record teve que acabar com o noticiário político.

Plantão da Record nos anos 1930
Foi então que o empresário de comunicação resolveu apostar todas as suas fichas na programação esportiva. Como ainda não se narrava jogos em São Paulo, a Record criou o primeiro plantão esportivo do Brasil, com cinco telefones de manivela ligados aos estádios e pistas de corridas de cavalo. "A cada gol ou páreo, um repórter discava para a sede da Record e dava a notícia". Essa cobertura "ao vivo" não existia e fez enorme sucesso. As emissoras concorrentes ouviam as notícias "frescas" da Record e, minutos depois, divulgavam para seus ouvintes na maior cara dura. E, assim como contou com a sorte ao comprar a emissora logo antes da "Revolução" de 1932, movimento que selou a ligação da Record com a população, Paulo Machado de Cavalho acertou instintivamente outra vez ao apostar no esporte justo em 1933, quando o futebol se profissionalizou no país.

Rio-SP de 1933: Palestra campeão
Para celebrar a mudança, dirigentes paulistas e cariocas deram uma trégua nas rixas bairristas e organizaram naquele mesmo ano, em parceria, o primeiro Torneio Rio-São Paulo. A Record contratou mais funcionários para a equipe do "Esporte nas antenas" e aumentou de cinco para sete o número de linhas telefônicas instaladas em campos das duas cidades. Com isso, liquidou a concorrência. Mas a Rádio Cruzeiro do Sul, de propriedade do milionário Alberto Byington, resolveu acabar com essa hegemonia. E, com isso, inaugurou o poder dos meios de comunicação sobre o futebol brasileiro. Terminado o Torneio Rio-São Paulo, a Associação Paulista de Esportes Atléticos (Apea) enviou uma carta à Record anunciando que a partir de 1934 só a Cruzeiro do Sul teria permissão para transmitir jogos de futebol.

Inauguração do Pacaembu, em 1940
O preço? Byington comandava o comércio de vendas de material de iluminação e propôs aos clubes, em troca da exclusividade nas transmissões, iluminar (a preços camaradas...) todos os estádios de futebol da cidade. Fora isso, ofereceu salários milionários para tirar a equipe que cobria esportes na Record. Somente em 1940, com a inauguração do estádio municipal do Pacaembu - que hoje tem o nome de Paulo Machado de Carvalho - foi que todas as emissoras da cidade passaram a ter cabine à disposição para transmitir os jogos, sem pagar nada por isso. Mas o dono da Record estava escaldado: embarcou diretamente na cartolagem futebolística, como diretor e presidente do São Paulo e, depois, como chefe das delegações brasileiras que venceram as Copas de 1958 e 1962, quando ganhou o apelido de "Marechal da Vitória".

Bellini com Paulo Machado de Carvalho, o 'Marechal da Vitória'
Assim, já proprietário da Rádio Panamericana e da TV Record, conseguiu respaldo político para que suas emissoras voltassem a transmitir futebol e estruturassem coberturas esportivas que marcaram época. Curioso é que, em 1965, proibido pela Federação Paulista de Futebol (FPF) de transmitir os jogos do Paulistão, pois os clubes reclamavam da baixa bilheteria nos estádios, Paulo Machado de Carvalho teve que tirar da cartola qualquer coisa que pudesse preencher o horário televisivo das tardes de domingo. Foi assim que surgiu o programa "Jovem Guarda", sucesso estrondoso entre a juventude que projetou para o estrelado Wanderléa, Erasmo Carlos e, principalmente, Roberto Carlos. Mas isso já é outra história...

1 comentários:

Maurício Ayer disse...

Fantástico, Marcão!