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terça-feira, abril 22, 2014

Mesa de bar, encontro casual entre dois bambas. Assim nasceu um dos maiores clássicos da MPB

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Recorte do jornal 'Luta Democrática' de julho de 1976

Por CHICO NETO*

Sempre digo aos amigos que a música "Juízo Final", imortalizada na voz de Clara Nunes (veja o vídeo e a letra abaixo), não é de autoria apenas de Nelson Cavaquinho, mas sim parceria dele com um poeta desses que não receberam o devido reconhecimento da História. O poeta se chama “Seu” Élcio Soares, e frequentei muito a casa dele quando eu era criança, de uns 10 a 13 anos.

Era muito amigo do filho dele e passávamos horas brincando no quintal de "Seu" Élcio, em Sepetiba, RJ. Na época, eu não tinha a mínima ideia de que ele era da mesma cepa de craques como Cartola, Nelson Cavaquinho e outros ícones do samba e da MPB. Anos depois, já morando em São Paulo, descobri esse fato e fiquei emocionado por saber que ouvi tantas histórias desse senhor bonachão, que, se minha memória não falha, foi quem me apresentou um torresmo de porco.

Com a globalização da internet, pude retomar o contato com Naélcio, filho do "Seu" Élcio, e recebi dele o recorte de jornal que está no início deste post. Entre outras curiosidades, "Seu" Élcio diz na entrevista que "Juízo Final" nasceu de um encontro casual entre ele e Nelson Cavaquinho, no Centro do Rio de Janeiro, no final dos anos 1960.

Os dois sentaram em um bar e compuseram a música a pedido de Nelson, que já tinha a melodia na cabeça. Fico feliz de poder fazer esse registro, pois sempre considerei uma covardia só ver "Juízo Final" creditada ao grande Nelson. Fica aqui minha homenagem a "Seu" Élcio Soares, um dos grandes.

* Chico Neto, 49 (por muito pouco tempo!), é jornalista formado, publicitário por acaso, bebum, torcedor de F1 (Sennista) e, acima de tudo, Flamenguista que viu Zico, Adílio, Júnior e todo aquele timaço de 1981 jogar no Maracanã!



JUÍZO FINAL
(Nelson Cavaquinho e Élcio Soares)

O sol... há de brilhar mais uma vez
A luz... há de chegar aos corações
Do mal... será queimada a semente
O amor... será eterno novamente

É o Juízo Final
A história do bem e do mal
Quero ter olhos pra ver
A maldade desaparecer

O amor... será eterno novamente


O apagão de água em São Paulo e a semântica

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“Mas não estamos melhor apenas porque choveu. Não ficamos dependendo apenas da chegada das chuvas. A ajuda do nosso povo foi fundamental, ele aderiu ao racionamento de forma decidida.”

O trecho acima é de um discurso de Fernando Henrique Cardoso, então presidente da República, anunciando o fim do racionamento de energia para março de 2002. Os grifos anteriores são para exemplificar que, à época, o consumidor de energia elétrica no Brasil foi obrigado a economizar seu consumo de energia elétrica e, caso não o fizesse, seria punido ao ter que pagar uma multa de 50% sobre o excesso do limite estabelecido.

Ontem, Geraldo Alckmin anunciou que o governo de São Paulo vai “estabelecer o ônus para quem gastar mais água". Diz notícia do Uol:

Alckmin e a água: nada de apagão, qualquer coisa, a culpa é de São Pedro
Segundo o governador, a partir de maio, os moradores da região metropolitana abastecidos pela Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo) deverão ser multados se aumentarem o consumo de água. Para Alckmin, a medida vem se somar ao desconto de 30% para quem economizar ao menos 20%.

A medida é bastante semelhante a uma das principais adotadas pelo governo FHC à época da crise do apagão. Mas Alckmin é muito melhor em comunicação do que o ex-presidente e só em ato falho utilizaria a palavra “racionamento”. O jargão do governo paulista utiliza palavras como “rodízio” e a multa existe para evitar “desperdício” de água.

Estranha (só que não) a mídia tradicional utilizar o mesmo vocabulário do tucanato de São Paulo. Abaixo, você pode ver como duas manchetes, uma do G1 e outra do Uol compram fácil, fácil, a versão de que o governo quer evitar desperdício de água. Desnecessário listar situações em que existe aumento de consumo de água ou de outro bem e que não envolve necessariamente desperdício. O governador também deve saber, até porque o consumo do Palácio dos Bandeirantes cresceu 22% em janeiro, mês em que ficou evidente a existência da crise hídrica.



Por enquanto, aliás, sabe-se apenas que o “ônus” será de 30%, mas não se diz qual a média que será usada para se fazer o cálculo nem se ele abrange todo tipo de consumidor de água ou é restrito ao residencial. Nas páginas da Sabesp e do governo do estado, muito confete e pouca informação até a manhã desta terça.

Algo pouco discutido até agora são os prejuízos decorrentes do “racionamento voluntário (mas nem tanto)” de água em São Paulo. O do apagão de FHC custou R$ 27 bilhões ao consumidor de forma direta e R$ 18 bilhões ao Tesouro Nacional, e o crescimento do PIB caiu de 4,3% em 2000 para 1,3% em 2001. Quais seriam então os prejuízos para o estado em caso de restrições ao consumo de água?

De acordo com matéria do R7, o presidente da General Motors para a América do Sul, Jaime Ardila, diz que “um racionamento de água em São Paulo teria efeitos mais danosos” sobre a montadora do que de energia: “A situação está ficando difícil e um racionamento de água é um cenário para o qual não temos alternativa”.

Enquanto a crise se desenrola e depois de as ações da Sabesp terem experimentado uma queda superior à dos papeis da Petrobras, seguimos com o jogo de palavras. Quando interessa, a qualquer falha de fornecimento de energia é atribuída a palavra "apagão", estigmatizada pela crise de 2001/2002. Mas nunca se fala em "racionamento" de água "apagão" do sistema hídrico, justamente pela maldição que as palavras carregam. A diferença, sempre, é o destinatário.

Aguarda-se menos preocupação com a semântica e mais contato com a realidade.