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quarta-feira, setembro 16, 2015

Arrigo Barnabé traçava um 'X-Banana' no Bar do Vavá

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Num post (clique aqui) sobre o maravilhoso show "Caixa de Ódio – o universo de Lupicínio Rodrigues", do Arrigo Barnabé (confira uma palhinha clicando aqui), em agosto de 2011, o camarada Maurício "De Marcelo" Ayer registrou: "Numa dessas noitadas, o Marcão contou que viu um documentário em que aparecia o senhor Barnabé, lhe perguntavam sobre um lugar de São Paulo que achasse significativo, e ele de bate-pronto indicava o Bar do Vavá". Depois do tal show, "De Marcelo" teve o prazer de manguaçar com o Arrigo e tocou no assunto: "[Ele] logo reavivou recordações do saudoso Gardenburger, sob o olhar curioso de nossos colegas de mesa. [...] Não sabia da morte do Vavá, ficou bastante triste, e me perguntou sobre seu irmão João (o chapeiro)".

Trecho do documentário mostra a localização do extinto 'Gardenburger Rest. Lanch.'

Pois então, durante todos esses anos eu pelejei para encontrar o tal documentário, mas não sabia sequer seu título. Lembro vagamente de ter ligado a TV na madrugada, acho que na Cultura (mas não tenho certeza), e tomado o susto de ver o Arrigo Barnabé sentado no balcão do nosso inesquecível Bar do Vavá, já extinto - e de ter me espantado mais ainda ao ver o próprio Vavá falando no documentário. Já deve fazer uns seis ou sete anos isso. E, por mais que eu fuçasse o Gúgou ou o IuTubi, não tinha qualquer referência para achar essa preciosidade. Pois no início desta semana, zapeando a esmo, trombei por acaso, novamente, com o tal vídeo no canal fechado "Curta!". Estava no fim, nem vi a sequência do Vavá. Mas li o nome nos créditos finais e o localizei! Ei-lo:



Trata-se do primeiro episódio de uma série chamada "Mapas Urbanos", do diretor Daniel Augusto, produzido em 1998. Vários artistas, poetas, músicos e compositores falam sobre a cidade de São Paulo, o maior centro urbano do país e da América Latina. Nesta primeira parte, além do Arrigo Barnabé, aparecem Arnaldo Antunes, Itamar Assumpção, José Miguel Wisnik, Luiz Tatit, Nelson Ascher, Paulo Vanzolini, Régis Bonvicino e Tom Zé. E o Vavá, é claro! Quem quiser ir direto ao ponto pode levar o cursor até o minuto 12:11, mais ou menos, e, logo depois de o Arnaldo Antunes falar sobre uma estátua antiga que até então estava preservada numa lanchonete da Avenida Paulista, aparece o Arrigo aboletado no saudoso balcão do não menos saudoso Bar do Vavá.

Cena do documentário 'Mapas Urbanos', com Arrigo Barnabé no saudoso Bar do Vavá

Logo de cara, ele fala: "Esse bar aqui... Eu morava aqui na [rua] Virgílio de Carvalho Pinto. Isso em 1973. Em 1973, 1974, a gente morou aqui, numa república. Um monte de gente. E volta e meia a gente vinha aqui no Bar do Vavá, que naquela época era uma espécie de um 'inferninho', tinha uns neons vermelhos aqui, assim. E a gente vinha à noite, aqui. E eu conversava com o Vavá". E na sequência aparece o Vavá relembrando: "O Arrigo vinha depois do... Acho que aquela época ele era amador, e ele vinha fazer os lanches dele, um sanduíche de queijo, um X-Banana, um queijo quente com alface, tomava um suco, a gente conversava muito" (Nota do Autor do Post: quem conheceu o X-Elvis e outras "iguarias" daquele bar não duvida que misturassem queijo com banana).

Vavá, o mito, no documentário de 1998: inspirador do Futepoca faleceria 11 anos depois

E prossegue Vavá, o mito, inspirador do Futepoca e protagonista do nosso Post 1000: "Aquele tempo eu era universitário, tava fazendo medicina em Ribeirão Preto. Nos finais de semana, quando eu vinha pra São Paulo, a gente conversava, [o bar] ficava aberto até altas horas da madrugada e ele [Arrigo Barnabé] vinha". Em seguida, o artista dá um testemunho histórico: "Certamente que esse tipo de bar está no universo das minhas canções". Mas Arrigo observa que o Bar do Vavá não tinha "balcão de fórmica vermelha", como na canção "Diversões eletrônicas", parceria sua com Regina Porto que venceu o 1º Festival Universitário da MPB, realizado pela TV Cultura em maio de 1979, um marco do movimento musical Vanguarda Paulista (assista clicando aqui).

Fradique Coutinho, 390: hoje, no lugar do saudoso boteco de Pinheiros, há uma ótica

"Eu não sei que bar tem o balcão de fórmica vermelha, acho que eu inventei na hora", diz Arrigo Barnabé, no documentário "Mapas Urbanos". Interessante é a que letra da tal canção começa falando em um "antro sujo" e em um "luminoso". Seriam referências ao "inferninho" e aos "neons vermelhos" de suas recordações do Bar do Vavá de 1973-74? Provavelmente. Durante 52 anos, entre 1956 e 2008, o glorioso, simpático e hospitaleiro boteco do bairro Pinheiros arregimentou uma fauna peculiar de frequentadores, serviu de palco para milhares de situações inusitadas (como essa aqui, exemplarmente narrada pelo camarada Glauco "De" Faria) e até de cenário para uma história em quadrinhos (do camarada Don Luciano, veja aqui). Mas, infelizmente, acabou.

Maio de 2007: Thalita, Glauco, Mauro Beting, Olavo, Anselmo, Marcão, Frédi e Edu

Apesar da saudade, fica aqui a confirmação de que o tal documentário com Arrigo Barnabé no Bar do Vavá (e com o próprio) realmente existe. E que não é mais uma lenda urbana ou "estória" (de bêbado) - "Ih, lá vem o Marcão com suas 'estórias'...". Engraçado é que conheci o boteco e seu dono em 1999, provavelmente pouco depois da gravação dessas entrevistas do "Mapas Urbanos". E passei a frequentar mais assiduamente o Gardenburger a partir de 2003, levando pra lá, dois anos depois, todos os futepoquenses, amigos, familiares, simpatizantes e convidados (como o Mauro Beting e o Antônio Martins). Enfim, vida que segue... Avoé, Arrigo! Avoé, Daniel Augusto, pelo documentário! E avoé, Vavá! Até um dia.

P.S.: Tem duas frases nesse episódio do "Mapas Urbanos" que me chamam a atenção. Primeiro, como se falasse do próprio Bar do Vavá, o compositor Luiz Tatit diz (o grifo é meu): "Nem há tanto tempo para a pessoa se envolver tanto com as coisas [na cidade de São Paulo]. Tudo o que você viveu desapareceu". E o poeta Régis Bonvicino resume muito bem o que sinto - e sempre senti - (sobre)vivendo nessa metrópole (os grifos são meus): "Aqui eu vivo a experiência do confinamento. Essa sintaxe do confinamento, da impossibilidade, da interdição". Deve ser por isso que o Bar do Vavá me faz tanta falta.

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