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Nove da noite de sexta-feira. A moça pede para eu esperar no buteco enquanto vai ao apartamento dar comida para o cachorro. Peço uísque. E minha antena auricular capta os primeiros sinais da mesa ao lado:
- Pede mais uma, larga a mão de ser chato.
- Pode ser. Mas me fala uma coisa, você continua casado?
- Há 24 anos. Casei em 85.
- Tá tudo bem em casa?
- Olha, vou te contar uma coisa... De Reinaldo pra Reinaldo: é foda.
- É. Eu sei. (...)
Baixa um silêncio sepulcral. Passa uma gostosa fazendo cooper. Um ônibus vira a esquina e derruba o cone da parada de táxi. Uma criança aparece vendendo chicletes. O papo anexo reflui.
- Mas você ainda tá jogando tênis?
- Só enganando. Hoje eu ia, mas fui ver meu sogro. Tá em coma.
- Ih, rapaz, nem fale. O meu sogro também tá ruim, teve um AVC.
- É foda.
- O véio não dura seis meses. Mas você já vai? Senta aí!
- Preciso ir. Minha mulher ligou duas vezes.
- Fica aí, rapaz!
- Não dá. Dessa vez não dá, meu irmão.
- Vou pedir a última.
Minha moça volta ao bar. Com o cachorro. A antena se distrai por um momento da frequência alheia. A moça vai ao banheiro e me deixa segurando o cão pela coleira. Tento sintonizar o fim da conversa vizinha. Só silêncio. Resta um na mesa. Calado. O outro Reinaldo arribou.
Sem beber a saideira.
3 comentários:
excelente a crônica do boteco. uma conversa de "reinaldo pra reinaldo" é ótema. os caras são espelhados até no sogro convalescente!
Bem capaz dos "personagens" descobrirem o papo.
Afinal, quantos Reinaldos com sogros convalescentes são amigos de outros Reinaldos com sogros convalescentes?
Digamos que os nomes não sejam exatamente Reinaldo. Mas a narração dos dois sogros moribundos, por incrível que pareça, ocorreu.
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