Morreu hoje um dos meus maiores ídolos: José Alves dos Santos, o JOSÉ RICO, da famosa dupla com Milionário (Romeu Januário de Matos). Com 68 anos, não resistiu a uma parada cardíaca, depois de ter sido internado ontem, em Americana (SP), ao passar mal durante uma partida de futebol (aliás, o gosto dele por esse esporte ia muito além de disputar "peladas": chegou a construir uma mansão no formato da Taça Jules Rimet). Zé Rico é o autor de um dos maiores hinos populares do país: "Estrada da vida", que virou até filme, em 1981, no auge da fama da dupla, batizada como "Os Gargantas de Ouro do Brasil". Naquela época, Milionário e José Rico fizeram shows no México, no Japão e na China. Ainda hoje, mesmo quem não gosta de música caipira (ou sertaneja), já deve ter ouvido em algum lugar, pelo menos uma vez, os versos: "Nesta longa estrada da vida/ Vou correndo e não posso parar/ Na esperança de ser campeão/ Alcançando o primeiro lugar". Pra quem insistir em dizer que não conhece, segue a gravação original desse clássico:
Pelo menos para mim, um caipira do interior de São Paulo (mais precisamente de Taquaritinga, região de Ribeirão Preto), essa e muitas outras gravações da dupla estão eternamente fixadas nas memórias mais longínquas da minha infância, com a profusão de cornetas mexicanas como pano de fundo para os gritos do Zé Rico - "Ui-ui-ui! Farrúpa! Zuuummm! Alôôôô! Uuuuiiiii! Rí-rí-rí!" - e os "provérbios" que ele costumava "declamar" no meio das músicas, segurando um dos ouvidos com a mão: "É isso aí, amigo! Enquanto você descansa, a gente carrega mais um caminhão de pedra!". Digam o que quiserem, mas Zé Rico foi uma das figuras mais originais e peculiares do nosso cenário artístico, um personagem único, algo comparável a Raul Seixas - e comparável mesmo, pois a dupla com Milionário possui uma legião de milhões de fanáticos por todo o Brasil. Como o Emerson Pereira, meu amigo dos tempos de faculdade, com quem eu costumava fazer o dueto de "Taça da amargura", música que batizou a república de estudantes onde morávamos:
Me lembro também de uma festa numa quitinete onde morei, em Ribeirão Preto, aos 18 anos, em que o vinil "Volume 4" de Milionário e José Rico era um dos únicos disponíveis, e tocou a madrugada inteira na pequena sonata de plástico, embalando os casais que já se agarravam (mesmo os que tinham preconceito contra a dupla). Pra mim, apesar de não gostar de música sertaneja, Zé Rico está acima de qualquer preferência ou preconceito. É um dos "puros", dos "autênticos", imune a rótulos e desdéns. Numa entrevista ao site Clube Sertanejo, ele resumiu as origens da dupla: "Eu sou nordestino, nasci no sertão pernambucano [em São José do Belmonte], me criei no cantinho do Norte do Paraná, na cidade de Terra Rica, onde recebi o nome de José Rico. Aí, vim pra São Paulo, encontrei com Romeu, formamos a dupla e começou a luta". Luta que rendeu fama, dinheiro e sucessos estrondosos. Minha gravação preferida, que tocou naquela noite em Ribeirão, é essa:
É emblemático - e nada gratuito - o Zé Rico falar em "luta", pois, pela origem, pelo nome e pelo apelido, trata-se de um legítimo BRASILEIRO, um Garrincha da música. Um gênio - ainda que incompreendido por muitos que defendem o temível e subjetivo "bom gosto". E termino esse post (triste pelo Zé Rico, e com a certeza de que
derrubarei um gole de cachaça pra ele), reproduzindo mais um trecho da
citada entrevista ao site Clube Sertanejo (o grifo é meu): "Nós tivemos a
sorte e felicidade de, quando praticamente não se vendia disco,
ultrapassar as expectativas. E hoje é mais difícil, através de outros
intercâmbios. Mas dá pra ir tocando. Mais uma vez, eu afirmo: aqueles que se dedicaram com respeito e amor permanecem". JOSÉ RICO PERMANECERÁ. "Farrúpa! Zuuuuuummmmm..."
HINO NACIONAL DOS CACHACEIROS DO BRASIL (Composição: Elton Saldanha)
Cairon e Gustavo
Eu bebo dez, eu bebo cem, eu bebo mil A minha casa é uma alambique, eu moro dentro do barril Eu bebo dez, eu bebo cem, eu bebo mil Esse é o hino nacional dos cachaceiros do Brasil
Amigo me dá licença, mas preciso me benzer Arado não lavra sem boi e eu não canto sem beber Atraca uma talagada, me dá um trago de água benta Um lisão de pinga pura pra nós regular a lenta
Certa vez eu fiz promessa de deixar a pinga em paz Mas esqueci da palavra e cada vez eu bebo mais Eu sei os dez mandamentos, eu rezo e tiro o chapéu O corpo se vai pro chão e alma se vai pro céu
Eu bebo dez, eu bebo cem, eu bebo mil A minha casa é uma alambique, eu moro dentro do barril Eu bebo dez, eu bebo cem, eu bebo mil Esse é o hino nacional dos cachaceiros do Brasil
Amigo sou biriteiro, me serve sem cerimônia Diz que a cachaça dá sono e eu to sofrendo de insônia No concurso de pinguço sou eu que escrevo o exame Eu vou ficar muito rico se vender meu vasilhame
Minha mulher pra me agradar toma banhos de licor Mulher com cheiro de pinga dá mais tesão pro amor Fui batizado com mé na festa dos bodegueiros Eu canto de quatro pé, o hino dos cachaceiros
Eu bebo dez, eu bebo cem, eu bebo mil A minha casa é uma alambique, eu moro dentro do barril Eu bebo dez, eu bebo cem, eu bebo mil Esse é o hino nacional dos cachaceiros do Brasil
(Do CD "Sertanejo Universitário Ao Vivo", Independente, 2009)
Não entendo por que é Que o coração da gente Quando menos esperamos Por alguém ele se prende Por exemplo, esse é meu caso Vacilei, marquei bobeira E agora meus amigos É aquela bebedeira! Apaixonado, alucinado E dominado por esse amor
(Do CD "Zezé di Camargo e Luciano", Sony, 2003)
BEBEDEIRA(2) (Composição: Rick e Renner)
Rick e Renner
Tô chegando no rodeio Procurando diversão Tô traiado, tou no meio Da galera de peão
Abre o brete, solta o bicho Deixa levantar poeira Bate palma e dá um grito A galera da bebedeira
É bebedeira, é bebedeira É só zoeira, é só zoeira Toda festa de peão É curtição, azaração É mulherada de primeira
É bebedeira, é bebedeira É só zoeira, é só zoeira A noite é feita pra zoar Vamos pular, vamos cantar O resto é pra segunda-feira
Bebo com moderação A de garrafa ou de latinha Dou uma pro coração Quando a menina tá na minha
Jogo o meu chapéu pro céu Quando acerto na cantada Dou um trato na cautela E deixo ela apaixonada
Onde tem festa de peão Meu coração vira cowboy Leva fumo da paixão Só se machuca e dói-dói
Dou um boi para entrar Uma boiada pra não sair Bate palma e dá um grito Quem não quer sair daqui