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'Pepe' Mujica manda brasa na rabada e nas cervejas do Bar do José, no Rio de Janeiro |
'Pepe' Mujica manda brasa na rabada e nas cervejas do Bar do José, no Rio de Janeiro |
Estou lá, apreciando minha loira gelada, quando ouço, na mesa em frente:
- A mentira é uma verdade que se esqueceu de acontecer!
É por causa de coisas como essa que sou viciado em buteco...
Tenho especial apreço por aqueles butecos que, de tão acolhedores, os clientes habituais não se importam muito com a higiene e, justamente por isso, acabam dando apelidos carinhosos ao local, como "Sujinho", "Porquinho" etc. Alguns ficam até conhecidos pelos animais insólitos que às vezes dão as caras no bar, como o "Minhoca's" (por causa de uma larvinha flagrada em uma cuia de feijão) e o "Moskão" (devido aos insetos sobrevoando os salgados, na estufa). É por isso que não gosto de comer em butecos. Como diz o meu pai, lugar de comer é em restaurante, bar é lugar pra beber. Pois outro dia eu estava lá na Urca, no Rio de Janeiro, e paramos para uma Skol gelada (carioca odeia Brahma) num buteco frequentado por universitários. E que, não sei se pela fumaça de "mato" queimado que eventualmente surge no bar, recebeu o simpático apelido de "Mosca feliz". Fiquei freguês!
O nome do buteco é Seja Cerveja, em Jaú, interior de São Paulo.
- Minha vizinha cansou de fazer o serviço de casa mas não quer contratar empregada.
- Ué, e tem outro jeito?
- Ela diz que não quer explorar ninguém, mas mora sozinha.
- Como explorar? Não vai pagar?
- Ela é do movimento das mulheres, é feminista. Não quer subjugar outra mulher.
- Que besteira. Cada uma com sua função, é só tratar como igual.
Um cachorro entra no recinto. Um velho pica fumo e dá uma escarrada. O dono do bar espanta moscas com um pano imundo.
- Mas se a moça mora sozinha, será que não dá conta do serviço?
- Ela bebe muito. Disse que tomou uma garrafa de vinho e foi lavar roupa, vomitou tudo em cima, encheu o tanque de comida.
- Sério? Que foda...
- É, e outro dia jogou um balde d'água no chão de taco, pra lavar. Estragou tudo.
- Então ela deve estar querendo empregada pra poder beber em paz.
- Pode ser. Mas ela é doida.
O dono do bar aparece e oferece fatias de queijo mineiro. Uma mulher de seios fartos passa rebolando e tira a atenção dos manguaças. A tarde cai e o frio aumenta. Está na hora de uma dose de conhaque com mel e limão.
Quatro da tarde. Sábado. Bar da Graça. Cinco elementos jogam baralho.
- Ô, Valdir, para de tomar conhaque! Vai passar mal.
- Vou nada, rapaz. Aqui é só fortaleza.
Alguém surge com um prato de esfihas, não se sabe de onde. Oferecem, mas declino. A dona do bar aparece com mais uma garrafa de Dreher. Eles alternam com cerveja.
- Sabe que uma vez tomei um porre desse negócio? Quase morri.
- Foi numa pescaria, não foi?
- Não, eu tava no sítio do meu tio. Bebi três garrafas desse conhaque e fiquei passando mal. Não conseguia botar pra fora.
- E aí? Foi parar no hospital?
- Não, eu fui tentar subir no cavalo e caí. Ele me deu um coice na barriga e eu despejei toda a bebida pra fora.
Risadas gerais. Passa um cachorro e jogam um resto de esfiha pra ele. Peço a conta.
Entre uma caipirinha e outra antes da tradicional feijoada de quarta-feira, o amigo João comentava que um conhecido dele respondeu a uma provocação dizendo "- No cu alofa!". Antes que conseguisse rebater, mandando-o alofar o da mãe ou coisa do gênero, o conhecido tratou de explicar que havia dito, simplesmente, o nome da capital de Tonga (foto), uma das Ilhas Amigáveis da Polinésia. Pior é que é verdade. Daí, espírito de porco que sou, procurei o significado de Nuku'alofa. Em português nada encontrei, mas, no Tonga Faqs, em inglês, descobri que, em tonganês, o exótico nome quer dizer algo como Abode of love. Tradução aproximada: Residência do amor...
Traçando um bife à cavalo com batata frita num sujão da vida (sujinho é buteco fresco), o nome do prato me lembrou "O rancho da goiabada", composição de Aldir Blanc e João Bosco imortalizada por Elis Regina. Vai daí, uma memória puxa outra e me veio à mente uma paródia que fiz dessa música, em 2005, quando conheci quase todos os manguaças e colaboradores que fazem esse blogue. Tem piadas internas, nomes próprios e de bares, situações e bizarrices que só a coletividade poderá identificar, mas serve como registro de uma fase pré-Futepoca - que surgiu, também, como extensão das noitadas de bar e dos "debates" que elas provocavam entre os membros desse grupo e outros frequentadores do Bar do Vavá (foto), Moskão, Minhoca, Primus, 666, Padrogas, Sinuca, Seu Nenê e outros fóruns não menos adequados. Quando, muitas vezes em uníssono, entoamos essa "canção". Peço perdão pelos palavrões, mas quis manter o "espírito" original (sem confundir com a cerveja). Vamos a ela:
O RANCHO DA MANGUAÇADA
Os jornalistas, quando tomam
Umas birita, espantando a moleza
Sonham com o Bar do Vavá, o Minhoca e a Sinuca
Mas tem certeza
Que é só ligar pro Moskão
Que vem cerveja
Depois costela, salsicha e o cigarro da estagiária
Chamada Leonor
Ou Bruna Rosa...
Pensar
Na porra do texto que o cliente quer
E que só nos adia o bar
Onde os açougueiros se encontram
Cantando a Moscuda pra poder suportar, ai
Mas os clientes, persistentes, são carniça
São uns veados, são dementes, vigaristas
Cabaços, muquiranas, animais, todos pirados
Pedindo e cobrando a pica do texto
E só aumentando a azia
Dos jornalista embriagado
É aquilo: o cara tem 18 anos, acabou de entrar numa faculdade que você nunca ouviu falar e tem no currículo duas notinhas no jornal mural da escola e um blogue sobre videogames. Só que você conheceu o cabra durante uma bebedeira num buteco podre, ele gosta de manguaçar, falar de futebol, torce pro teu time e parece ser gente boa. Pra completar, aceita ganhar R$ 200 por mês, sem carteira assinada, sem benefício algum e com um caminhão de serviço diário. Beleza, era isso mesmo o que você queria. Chegando na redação, você orienta, didaticamente: "Só precisa ler, editar e requentar o material das agências e mandar bala. Toma cuidado com as siglas, se não estiver por extenso, escreva. E publique o quanto antes no site, pra notícia não esfriar. Depois eu olho". Você ouve um sonoro "Pódexá, amizade!". E mais tarde, ao conferir o serviço, se depara com uma coisa dessas:
MARCÃO PALHARES
Eram duas da tarde e eu seguia uma bunda pela avenida principal. A mulher entrou numa casa de artigos para bebês e eu fui atrás, hipnotizado. Um vendedor me perguntou o que eu queria ali e me tirou do transe. Encabulado, comprei um jogo de babadores (algo muito apropriado para o vexame do meu instinto carnal mal reprimido). Peguei o embrulho, dei de presente para um padre que esbarrou em mim na calçada e corri sedento para o bar da esquina. Fazia um calor piauiense e já fui pedindo a primeira gelada. Tomei em quatro goles e puxei outra. Havia um cara de boina xadrez e anel de pedra vermelha, com um violão. E outro, com a camisa do Tuna Luso, tocando pandeiro. Ali por perto, no balcão, uma moça tinha os olhos fixos neles. Não era tão feia quanto parecia. Com o tempo, achei até que foi ficando interessante.
Devidamente encervejado, pedi um rabo de galo para reforçar. Pra comer só tinha ovo cozido, daqueles azuis, boiando num vidro de líquido nefasto. Pensei em pedir algum lanche, mas a visão de uma gaiola de periquitos cheia de excrementos, bem perto da chapa, me fez considerar que a mesma talvez não estivesse muito limpa. Talvez. A moça, que exalava um desodorante deveras enjoativo, dizia ao violeiro que era cantora. Queria dar uma canja. O homem palitou os dentes com a unha comprida do mindinho esquerdo e, entediado, assentiu. Ela escolheu uma música do Julio Iglesias, "Coração enamorado", e soltou o gogó. Deus pai todo poderoso!
Além de desafinada, a moça gaguejava e tinha uns cacoetes estranhos, ora adiantando, ora atrasando a letra. "Não pergunta nem responde/ Simplesmente satisfaz/ Sonhar/ Que existe amor cada vez mais". Uma voz aguda, irritante, perfurante. Mas o manguaça levou a música até o final no violão e, educado, agradeceu a "cantora". Ela até insinuou um "Agora toca aquela...", mas o pandeirista se encarregou de atravessar a inconveniente e apressou a voz num samba do Benito di Paula: "Você/ Ficou sem jeito e encabulada/ Ficou parada sem saber de nada...". Não sei se a moça percebeu a maldade da letra e o corte que levou do Tuna Luso, mas se calou com a sua boca sem feijão.
Eu já estava ali pelo segundo copo de Jurubeba Leão do Norte e me apiedei da criatura. Sentimentalismo de pinguço. Amor, paixão, casamento. Tudo isso passa pela cabeça de uma pessoa que começou o dia seguindo uma bunda e prosseguiu deglutindo nove cervejas, cinco doses de pinga da pior espécie com vermute barato e três jurubebas. "Você vem sempre aqui?", me lembro de ter perguntado. Não sei o que houve. Na cena seguinte, a moça estava no meu colo. Eu apertei sua mão e a marca dos meus dedos ficou impressa. Não entendi. Ela disse algo sobre doença de pele, erisipela, fungos ou coisa parecida. Depois me beijou, com hálito de Tatuzinho e tubaína de uva.
No pequeno apartamento, os colchões eram separados por varais com lençóis. Uma mulher gorda e com touca na cabeça, fumando, fazia miojo numa caçarola. Não tenho certeza, mas acho que me deitei e apaguei. A moça não gostou muito, pois buscou um balde com roupas de molho e atirou sobre mim. Fiquei atônito, no colchão encharcado. Houve bate-boca, a mulher do cigarro ameaçou me jogar o miojo na cara. Assim que tive a oportunidade, abri a porta e saí correndo. A moça do bar veio atrás, pelas escadas, me dando vassouradas. Cheguei à rua e entrei no primeiro táxi que vi, ainda molhado e fedendo sabão em pó vagabundo.
Parei num buteco de periferia e pedi um conhaque. O rádio tocava Julio Iglesias e comecei a divagar. Depois da décima segunda cerveja, me convenci de que tinha conhecido o amor da minha vida. Estava decidido: eu iria procurá-la. Não a moça, mas a mulher da touca, cigarro e miojo. Uma deusa! A vida é assim. Ninguém escapa.
(Continua quando o autor estiver sóbrio o suficiente para escrever...)
Quatro e vinte da madrugada. Buteco sujo. Dois amigos, 15 cascos vazios de cerveja e três maços de Derby vermelho amassados.
- Ô, Mortadela, pede a saideira.
- Garçom! Garçom! Pô, foi embora...
- Mas ele falou alguma coisa antes.
- É, mas eu não entendi necas de pitibiribas.
- Necas de pitibiribas?!?? Que treco é esse?!?
- Cê nunca ouviu, Trubija? Cara, essa todo mundo conhece!
- Ah, só se for você, que é tiozão. Eu nunca ouvi isso.
- Pois existe, sim: necas de pitibiribas!
- E o que significa esse negócio?
- Sabe, uma vez eu tive curiosidade de saber. Daí descobri que a expressão surgiu lá em Pirituba, distrito de São Paulo. Antigamente, parece que tinha uma pequena vila no local chamada Pitibiriba. E lá morava uma velha meio caduca que tinha o apelido de Neca. Quando alguém tentava explicar alguma coisa, ela nunca entendia nada. A partir de então, toda vez que alguém se confunde, fala que não tá entendendo Neca de Pitibiriba. Sacou?
- Sinceramente, não entendi chongas...
- O que?!? Chongas?!?!?? Queísso???
- Ah, deixa pra lá! Garçom, apressa a saideira e a conta, pelo amor de Deus!
A Fórmula-1 está às portas de um acontecimento histórico. No próximo final de semana, será disputada a primeira prova noturna da história da categoria. O palco da competição será Cingapura, ilha-estado espremida entre as gigantes Malásia e Indonésia, no Sudeste Asiático. Corridas disputadas à noite não chegam a ser novidade. Pilotos da MotoGP, Nascar e F-Indy já experimentaram a sensação de acelerar sob os efeitos da iluminação artificial. Mas, de toda a forma, será interessante ver Felipe Massa, Lewis Hamilton & Cia rasgando a noite asiática a 300 quilômetros por hora.
E eu estarei de olhos bem abertos em Kimi Raikkonen (foto acima). Nessa hora, o finlandês da Ferrari, que por seus gostos e hábitos é o piloto preferido desta coluna, costuma acelerar em outras pistas, digo, balcões. Fico imaginando a contrariedade do manguaça quando informado do horário da disputa, cuja largada está prevista para as 20hs locais. No Brasil, infelizmente, a prova começa, como sempre, às 9hs da manhã do domingo. Mas, como todo cachaceiro que se preze, creio que Raikkonen já esteja tramando algo para compensar as quase duas horas de bebedeira perdida.
Desconfio que a garrafinha de água que os pilotos levam no cockipit será abastecida com outros aditivos. Em decorrência do calor do lugar, que a noite costuma passar fácil dos 30 graus, a coluna sugere, além da vodca, o destilado favorito do cara, drinques que combinem com a temperatura da região, como caipirinha, dry martini e mojito. Só cuidado com o bafômetro...
Troque seu óleo composto por um "azeite de combate"
Em uma conversa com meu grande amigo e companheiro de copo, o também jornalista Eduardo Marini, estávamos lamentando a dificuldade de encontrar um azeite qualquer nos pés-sujos em que almoçávamos. Confesso que sou louco por esse divino suco de azeitona prensada. E, para a minha desilusão, os botecos são territórios dominados pelo chamado óleo-composto, aquele que vem com um 1% de azeite e 99% de óleo de soja. É o reinado do Maria (à direita), o mais famoso deles. Nada contra o simpático produto, que por anos irrigou as saladas lá de casa. Mas, de uns tempos para cá, os chamados "azeites de combate" - e nem estou falando de um badalado extra virgem da Toscana ou do Peloponneso - se tornaram mais acessíveis.
Os grandes atacadistas já dispõem de uma boa oferta de azeites de segundo escalão portugueses, argentinos e espanhóis. A diferença de preço diminuiu sensivelmente. Ao trocar o óleo composto por um azeite modesto, o dono do buteco, além de agradar a freguesia cotidiana, ainda poderia conquistar novos clientes, pois teria um algo a mais a oferecer em relação à concorrência. Deixo aqui meu apelo para os meus queridos Zés, Antônios e Raimundos. Façam as contas e entrem nessa campanha. Seus fregueses ficariam imensamente agradecidos.
Hoje pela manhã, no programa Sportcenter, da ESPN, José Trajano bateu um papo com o músico e compositor carioca Moacyr Luz (foto) - que, ao que parece, está para publicar a continuação de "Manual de sobrevivência nos butiquins mais vagabundos" (livro de sua autoria lançado pela Editora Senac em 2005, coordenado pelo jornalista Marcelo Moutinho e ilustrado pelo cartunista Jaguar). A primeira edição trouxe 25 crônicas baseadas em fatos reais e ambientadas naquilo que nós, manguaças, costumamos chamar afetuosamente de "butecos pé sujo", onde a falta de higiene é apenas um charme a mais. Em seus livros, Moacyr Luz faz um apanhado desses simpáticos estabelecimentos na cidade do Rio de Janeiro, inclusive com entrevistas de personalidades que os freqüentam. Questionado por Trajano sobre as novidades da segunda edição, Luz citou um tal de "Bip Bip", butiquim de um metro por dois em Copacabana. Segundo consta, uns gringos pararam certa vez diante da tapera, embasbacados, e decidiram entrar. O dono, Alfredinho, cortava as unhas impavidamente sobre o balcão. E teriam travado o seguinte diálogo:
- Mister, please. Tienes chope?
- Não, aqui só tem cerveja - respondeu Alfredinho, cortando as unhas e sem levantar a cabeça.
- Ok. Uno para nosotros.
- Seguinte, a geladeira é pequena e só tem meiota. Se quiser, tem que pegar duas de uma vez - prosseguiu o dono do buteco.
- Ok, ok.
- Outra coisa: aqui não tem garçom. Vai lá no fundo, pega as meiotas na geladeira e anota pra mim no caderno que tá amarrado no balcão - orientou didaticamente Alfredinho.
- Ok, ok.
Não contente, o dono do bar arrematou:
- Ah, e aproveita que tu vai lá no fundo e mata aquela baratinha ali na parede, ó!