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sexta-feira, outubro 15, 2010

Serra: Direita, volver?

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No longínquo mês de maio deste ano, alguém que concorria à Presidência da República disse: "Do ponto de análise convencional, sim (sou de esquerda). (Se eleito) vou estar comprometido até o fundo da alma com os trabalhadores e os desamparados, (ser de esquerda) é ser aliado de empresas que gerem empregos".


Em 13 de outubro, o Radar Político, blogue político de O Estado de S.Paulo divulga um santinho do mesmo candidato. Mas é um santinho no mais stricto sensu jamais praticado em uma corrida à Presidência da República. "Neles esta estampada, como nos santinhos convencionais, a foto de Serra na parte da frente com o slogan 'Serra é do bem' e, atrás, a inscrição 'Jesus é a verdade e a Justiça' assinada pelo próprio candidato". Quando se escreve "assinado" é porque está posicionada uma assinatura em letra cursiva.

O motivo por que o material foi produzido é mais importante do que o panfleto. Foi a necessidade de se afirmar cristão e instrumentalizar as acusações contra sua concorrente em temas sensíveis da parte dos católicos e evangélicos. Circulam boatos de que Dilma é a favor do aborto – e não da discriminalização das mães que recorrem à prática – e de que teria dito que "nem Cristo" lhe tiraria a vitória. Ambas as assertivas são falsas.

Foto: Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
A curta caminhada
Usar setores da sociedade como trampolim eleitoral em uma conjuntura específica não é uma exclusividade de José Serra. Mas é preocupante quando se dá vazão, se aproveita e incentiva a disseminação de falsas informações que afetam o lado mais conservador e retrógrado da sociedade brasileira.

Para chegar até ali, o candidato do PSDB percorreu uma caminhada curta, com alguns degraus.

Houve a acusação da "República Sindicalista" , termo criado por Carlos Lacerda em um factóide histórico. Ele usou seus jornais para dizer que o então Ministro do Trabalho de Juscelino Kubitcek teria recebido uma carta de um ministro argentino prometendo armas para dirigentes de sindicatos brasileiros. Tudo para a instação de uma "República sindicalista". Era mentira, a carta não existiu.

Por trás da crítica aos setores ligados a entidades de representação de classe está uma postura extremamente carregada ideologicamente. É a ideia que apenas diretores de sindicatos empresariais poderiam ascender a cargos do primeiro e segundo escalões do poder Executivo.

Outro episódio dessa escalada foi o material do Instituto Plínio Correia de Oliveira – batizado em homenagem ao criador da Tradição, Família e Propriedade (TFP), um líbelo do ultraconservadorismo brasileiro – no comitê do PSDB.

Foram cinco meses para percorrer, no discurso, o espectro da política: da esquerda na "análise convencional" para o apoio da TFP.

O problema
Se Serra mantiver o crescimento apresentado nas pesquisas e sagrar-se vencedor na disputa, terá uma dívida de gratidão a saldar com esses setores conservadores. Seria futurologia do pretérito tentar vislumbrar como essa fatura seria paga. Muito menos importante do que cargos, a questão seriam políticas efetivas adotadas.

9 comentários:

Moriti disse...

Ótimo texto, Anselmo. Nos últimas dias, tenho conversado com várias pessoas sobre isso.

A candidatura Serra pactuou com a ala mais reacionária/radical da sociedade brasileira.

Setores ultra conservadores de igrejas, Clube da Aeronáutica, velha mídia, associações como a TFP e o empresariado reaça etc. Não vai ter como não pagar essas dívidas se - toc, toc, toc - ganhar a disputa.

Além da questão dos direitos civis não avançar, vai queimar patrimõnio público para "abastecer" certos aliados, retroagir conquistas sociais e fazer voltar o país para um papel menor internacionalmente.

Sobre educação e comunicação, a coisa vai ficar (mais) feia. Sem falar no que vão sofrer os movimentos sociais, com a costumeira truculência desses caras.

E esses reaças que apoiam a candidatura terão bala na agulha para cobrar, pois vão se ver como grandes responsáveis pelo resultado eleitoral.

Isola!

Nicolau disse...

Que Serra e PSDB são de direita não tenho dúvida desde o primeiro governo FHC. Mas a candidatura deu um passo além nesse sentido, sem dúvida. De arautos de uma pretensa modernidade neoliberal, passaram a cópias de Carlos Lacerda.

Manter essa galera longe do poder é fundamental para quem acha que o futuro do país passa por diminuição das desigualdades e inclusão social. Levou oito anos para recuperar minimamente a capacidade de ação do Estado para enfrentar essas questões, depois do desmanche feito pelos tucanos. Quebrar isso agora seria um retrocesso grave.

Leandro disse...

♫ Com Serra essa certeza a gente tem: Serra é do DEM, Serra é do DEM. ♫

Maurício Ayer disse...

É assustador. Ou melhor, asqueroso.

Glauco disse...

Serra incorpora nessa eleição o "vale-tudo" típico de alguns segmentos políticos brasileiros. Não tem pudor sequer de utilizar sua família no horário eleitoral para fazer seu marketing político de "vítima" (coisa que, pelo telemarketing contratado para difamar, panfletos apócrifos, e-mails e trolls, definitivamente ele não é).

Adhemar Santos disse...

"Se Serra mantiver o crescimento apresentado nas pesquisas e sagrar-se vencedor na disputa, terá uma dívida de gratidão a saldar com esses setores conservadores. "

Texto muito pobre, mas o final, reproduzido acima, chega a ser hilário. Até parece que a Dilma não está associada ao que há de mais conservador e retrógrado na política brasileira - Collor, Sarney, Temer, Jader Barbalho.......e a lista não tem fim.

Nicolau disse...

Adhemar, é sempre possível fazer a disputa de quem cospe mais longe: Tasso Jereissati, Marco Maciel, Orestes Quércia, Joaquim Roriz (e seu apadrinhado - e subitamente esquecido - José Roberto Arruda) e Roberto Jefferson (o herói do mensalão) estão aí ao lado do Serra para quem quiser ver.

Mas creio que o Anselmo está mais preocupado com setores sociais e com as ideias que eles representam. Associar-se a certos setores implica votos e compromissos de governo. Se Serra está se associando a gente capaz de dizer sem dó para fiéis possivelmente desavisados que Dilma e o PT querem matar criancinhas (uma variante do discurso do comunista que come a criancinha), jogando na sarjeta um debate necessário e absurdamente complexo como o tema do aborto, é realmente preocupante qual a conta que esses setores cobrariam. Nos EUA, George W. Bush andou com essa galera e teve gente defendendo ensino de criacionismo no ensino público.

De minha parte, acho preocupante, mas mais importante queminha opinião é que as pessoas têm o direito de saber no que estão votando. E o candidato Serra tem demonstrado nessa campanha problemas sérios de personalidade - ou muita falta de caráter.

O discurso do candidato e de sua aliança passou por mudanças bastante drásticas, com uma série de posições contrditórias sendo lançadas ao mesmo tempo. No começo, colocou Lula no progrma eleitoral e tentou posar de aliado do presidente - mesmo que em seu grupo político estejam trocentos políticos que chamaram o Bolsa Família de "esmola" e alguns que falaram coisa das mais indignas sobre o presidente (Arthur Virgílio e ACM Neto - outras pérolas da aliança serrista). Ao mesmo tempo, acusou o PT de ter ligação com o narcotráfico e o presidente boliviano Evo Morales de ser complacente com o crime, no que poderia resultar num grave problema diplomático - tivesse a opinião de Serra alguma relevância. E mais todas as bobagens sobre "republica sindicalista", ressucitando direitistas e golpistas históricos.

Enfim, convém ao candidato definir um perfil e assumi-lo. Se quer ser um representante da direita religiosa da TFP e integrar o comando de caça aos comunistas, tudo bem, a democracia (que essa galera aí detesta) permite. Mas que tenha a dignidade de bater no peito e assumir suas posições.

Marcão disse...

O próprio Anselmo me resumiu, outro dia: "Com Serra e o PSDB, o Brasil rumo ao século 12".

E, no Twitter, Plínio Arruda Sampaio acrescentou: "Se a Dilma não é o governo dos nossos sonhos, certamente o Serra é o governo dos nossos pesadelos".

É isso.

FORA, SERRA!
VAI, DILMA!

Nicolau disse...

Mas o Plínio não tinha anunciado que votará nulo?