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Por volta das 16h30 a concentração em torno do Largo da Batata, na 
zona Oeste de São Paulo, já era grande. Mas uma hora mais tarde a 
quantidade de pessoas já era muito maior, lotando vias de acesso 
próximas pouco antes de finalmente a marcha se pôr em movimento.
Cartazes, faixas e bandeiras de partidos apareciam em meio à 
multidão, mas enfrentavam a reação de boa parte dos presentes. “Sem 
partido! Sem partido!” e “Aqui não é comício”, gritavam, buscando 
reforçar o caráter apartidário da marcha. Um rapaz, mesmo com evidente 
desvantagem física, arrancou duas bandeiras de um militante do Partido 
Pátria Livre, quase criando uma animosidade.
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Início do protesto, no Largo da Batata (Mídia Ninja) 
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A imagem da mídia tradicional também não era das melhores. Com 
palavras de ordem pouco elogiosas à Rede Globo e a Arnaldo Jabor, 
manifestantes conseguiram impedir a gravação de uma repórter da emissora
 que tentava fazer uma entrevista com uma drag queen que protestava contra a PEC 37. “Depois passa a entrevista sem editar”, teve que ouvir a jornalista.
Entre os presentes no protesto, muitos vieram motivados pela reação 
violenta da polícia nos últimos dias. O ator Gero Camilo contava que era
 a primeira das manifestações contra o o aumento da passagem a que ele 
comparecia. “O que me fez de fato vir para a rua, além de ser contra o 
aumento, foi a forma agressiva e violenta com que a polícia reagiu aos 
manifestantes. E mais que isso, essa manifestação é uma gota d’água de 
uma paciência esgotada do povo brasileiro, não são só 20 centavos”, 
contou.
Questionado sobre a crise de representatividade dos partidos, Camilo 
disse acreditar na “mobilização das pessoas”. “É evidente que um aparato
 policial repressivo se joga brutalmente contra a população quando o 
presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara é o Marco 
Feliciano. Que possibilidade há para o povo, nesse momento, a não ser se
 manifestar, independentemente de seu partido ou organização?”, 
ponderou. “Não temos um referencial de projeto político consequente, não
 é à toa que esse projeto está sendo discutido na ágora, na volta às 
ruas. Nunca vi um Facebook tão inteligente como nesses dois dias. Nunca 
li tantos comentários e posts inteligentes numa tentativa de construção 
política, nenhum jornal me deu isso, nem 
Folha de S. Paulo, nem 
Estado de S. Paulo, nem o Jornal Nacional.”
“A polícia tá na rua agora, mas cadê a polícia nas ruas, na hora de proteger nossos filhos?”, dizia uma das 
Mães na Manifestação.
 Já outra delas, Maeve Vida, falava sobre quanto o movimento havia a 
animado. “Sou mãe de três filhos e estava muito preocupada com a 
letargia dos jovens de hoje, alienados em um mundo consumista, achando 
que o bacana era ter um celular novo, que ser rebelde era ter um 
jeans
 rasgado, consumir um filme de arte rebelde. Pra mim, é uma grande 
alegria ver os jovens saindo dessa rebeldia enlatada e se manifestaram. 
Isso pra mim é vida.”
Sobre oportunistas
A marcha acabou se dividindo em três direções. Uma parte muito grande
 seguiu adiante na Avenida Faria Lima, um dos pontos financeiros mais 
importantes de São Paulo. Mesmo tendo alguns prédios e estabelecimentos 
luxuosos, que poderiam ser alvo de manifestantes anticapitalistas em 
qualquer lugar do mundo, nenhum deles correu riscos. E isso mesmo sem 
policiamento na maior parte do trajeto, o que leva à reflexão sobre o 
papel do aparato policial na produção da violência dos últimos atos.
Um 
shopping dos mais elitistas de São Paulo, o Iguatemi, 
está fechado. Do lado de dentro, algumas pessoas olham a marcha atrás de
 vidros e grades, quando uma manifestante chega perto para tirar uma 
foto com seu celular. Logo, um segurança surge:
– Não pode tirar foto.
– Estou na calçada, a calçada é pública – responde.
– Aqui só tem gente trabalhadora, pra tirar foto de vândalo é do outro lado.
Mas a moça continuou tirando as fotos.
Em meio à Faria Lima, dois engravatados destoam da multidão e correm 
em meio a ela com um enorme cartaz enrolado. Chegando à frente da 
marcha, abrem o material contra o ex-presidente Lula, o adjetivando como
 “câncer”. São dois ativistas de um grupo de direita que dificilmente 
consegue reunir cinquenta pessoas em suas manifestações, mas que buscava
 ali o melhor posicionamento para fotos e vídeos que devem circular o 
mundo, tentando dar um caráter que o movimento como um todo 
definitivamente não tem. Quinze minutos depois, são convidados a se 
retirar e a guardarem sua faixa. Saem recebendo alguns gritos de 
“fascistas”.
Não são os únicos oportunistas do movimento. Um dos presentes vê duas
 garotas e se sai com essa: “É a primeira vez de vocês no movimento?”. 
As garotas ensaiam uma resposta, mas param percebendo as segundas 
intenções do militante. “Depois a gente pode dar uma volta”, ainda 
ouviram, sem dar resposta.
Eram 19h30 e os manifestantes seguiam. Sem polícia, sem violência e 
ganhando ainda mais o respeito de quem viu, sem filtros midiáticos, 
aquilo que se passava. Filtros, aliás, que uma parte da sociedade, e a maioria dos manifestantes,  já não aceita mais.
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