Destaques

quarta-feira, dezembro 30, 2015

Anarquia, oi, oi!

Compartilhe no Twitter
Compartilhe no Facebook

Passando pela Praça do Patriarca, em São Paulo, que homenageia José Bonifácio de Andrada e Silva (aquele que pregava que "a embriaguez é o vício geral, porque combate a tristeza e dá energia, quebra as cadeias de opinião e faz esquecer os desprazeres da vida; mas como ela dura pouco, é preciso continuá-la"), notei que a estátua do manguaça histórico, patrono de nossa independência, agora exibe o símbolo de outro credo político:


Por isso, fecho o ano - e minhas postagens - com Garotos Podres (abaixo). Hasta la vista.



ANARQUIA OI!

Um dia você vai descobrir
Que todos te odeiam e te querem morto
Pois você representa perigo ao poder!!!
Anarquia oi, oi! Anarquia oi, oi! Anarquia oi, oi!
Eles não querem que você viva
Destrua o sistema - antes que ele o destrua
Não acredite em falsos líderes
Pois todos eles vão te trair!!!
Anarquia oi, oi! Anarquia oi, oi! Anarquia oi, oi!
A-NAR-QUI-A! A-NAR-QUI-A!
Anarquia oi, oi! Anarquia oi, oi! Anarquia oi, oi!
 OI !


Para a ressaca, 'Minha enxada, minha vida'

Compartilhe no Twitter
Compartilhe no Facebook

No meio da esbórnia gastronômica e etílica de fim de ano, a manchete do caderno "Comida", da FAlha de S.Paulo de hoje, me chamou a atenção: "X-ressaca". Na hora, meu pensamento, meu estômago e meus intestinos relembraram, entre espasmos e engulhos, iguarias da estirpe do X-Elvis (do Bar do Vavá), da salsicha com molho de tomate (do bar Moskão, em Pinheiros), do Cala-Frango (da Avenida Antonio Emerich, em São Vicente) ou da temível dobradinha com cenoura (do buteco Tom Cat, no Terminal Jabaquara). Mas a proposta do jornal, claro, é "coxinha" (no mau sentido): "Comida light ou detox para curar os exageros das festas? Cozinheiros e comilões preferem 'aliviar' o estômago com guloseimas, de chocolate a bacon". Buenas, depois dos quatro "frutos do bar" que descrevi acima, gostaria de saber o que eles batizam como "detox"... Mas passei o olho pelas "dicas" do tal caderno e algo chamou a atenção de minhas retinas tão fatigadas:


Ah, que fófis! "Faz carinho na barriga"! E eu pensando no meu tradicional método "cura-ressaca", o caldo de cana (afinal, a cana estraga mas cura também). Daqui da minha trincheira, ogro, bebum e ranzinza, fiquei matutando sobre esse mundinho "coxinha", "gourmet", "detox", "vilamadalena" e "folhadesãopaulo" que vem, cada vez mais, assolando a humanidade. E lembrei dos irmão Daniel e Nicolau, que, como eu, costumam recomendar, em situações de especial FRESCURA e FALTA DO QUE FAZER, uma boa enxada pra carpir um mato. "Carinho na barriga?!? Ah, vai carpir um terreno!". Há variantes mais urbanas: "vai lavar um banheiro", "vai encarar um tanque atolado de roupa", "vai lavar uma pia cheia de louça" etc etc. Mas "vai pegar na enxada e carpir um mato" me parece mais apropriado. Por isso lanço, aqui, na esteira do "Serviço conscientizador obrigatório" proposto pelo Nikolaos Papadopoulos, o programa "Minha enxada, minha vida".

Porque o que faz "carinho na barriga" é uma costela com cynar, um pingado com resto de cachaça e carne de porco, uma dose de Zvonka ou qualquer outra beberagem vagabunda. Uma Feliz Páscoa - ou o que quer que seja - pra todos. Saravá! E um gole pro santo.

(Crédito: André Dahmer, 'Revoluções em Curso')



Tipos de cerveja 89 - As Spice/ Herb/ Vegetable

Compartilhe no Twitter
Compartilhe no Facebook

Penúltimo "tipo de cerveja" de uma série iniciada há quase oito anos (como diria o De Massad, "quem consegue encontrar todas essas brejas?"), em parceria para reprodução de conteúdo do site português Cervejas do Mundo, as Spice/ Herb/ Vegetable são, na verdade, um grupo que reúne qualquer Lager ou Ale produzidas a partir de ervas, especiarias ou vegetais, com o tempero adicionado bem perceptível no aroma e no sabor. Mas cuidado, manguaça! Segundo Bruno Aquino, do Cervejas do Mundo, "a grande diversidade de ingredientes que podem ser utilizados faz com que a cor, aroma, sabor, textura e volume alcoólico variem substancialmente de marca para marca, e há indústrias cervejeiras que, na ânsia de inovar, são capazes de atirar qualquer coisa para dentro da mistura, desde gengibre a abóbora, passando por canela, nozes e pimenta". De qualquer forma, esse grupo é considerado um tipo de cerveja leve e refrescante - embora o Bruno Aquino faça um importante alerta: "Não aconselhado para os que acham que cerveja tem de ser loura e estupidamente fresca". Para quem quiser enfrentar, algumas marcas recomendadas são: Baladin Nora, Traquair Jacobite Ale (foto) ou Craftsman Triple White Sage. Boa sorte pr'ocês. E saúde!

segunda-feira, dezembro 28, 2015

A caipirinha, a amizade, o Exército e o Clube da Esquina

Compartilhe no Twitter
Compartilhe no Facebook

Milton e Lô: encontro musical a partir da caipirinha
No programa "O Som do Vinil", apresentado por Charles Gavin no Canal Brasil, Milton Nascimento fala sobre o histórico LP "Clube da Esquina", de 1972, no qual revelou o jovem músico/cantor/compositor Lô Borges, que na época tinha apenas 18 anos. Por ser quase dez anos mais velho que Lô, Milton mantinha amizade mais estreita apenas com dois de seus irmãos maiores, Marilton e Márcio Borges (este último seu primeiro parceiro musical). Até que um dia, já famoso e morando no Rio de Janeiro, Milton fez uma visita a Belo Horizonte e foi até a casa dos Borges, no bairro Santa Tereza, para rever os amigos:

"Entrei e não tinha ninguém. A casa toda aberta e nenhuma pessoa lá dentro. Resolvi sair e tomar um qualquer coisa no buteco. Quando eu tava saindo, o Lô tava chegando. Porque, antes desse dia, a minha imagem que eu tinha do Lô era de um garoto de dez anos. Falei: 'Ô, Lô, que coisa boa, vamos até no buteco, ali, que eu vou pedir uma caipirinha pra mim e ocê toma um guaraná'. Pedi uma caipirinha e ele pediu outra pra ele. Eu dei uma olhada daquelas e ele enfrentou. Aí eu fui ver: 'Meu Deus do céu, esse menino não é mais criança, não'. Ele pegou, falou comigo: 'Olha, eu adoro as coisas que você faz, sou seu fã e tudo, mas eu tenho uma grande tristeza'. Eu falei: 'Por que?'. [E ele]: 'É porque vocês não gostam de mim'. Eu falei: 'Cê tá loco? Claro que gosto d'ocê, eu sempre gostei'. [E ele]: 'Não, cês saem de noite, vão pra lá, pra cá, pra tudo quanto é lugar, e nunca me chamaram pra nada do que cês fazem'. Aí eu peguei e falei assim: 'Ô, Lô, cê vai me desculpar, mas eu só vim a descobrir que ocê não era mais criança quando cê pediu a caipirinha'. Ele tinha 17 anos. Conversamos, ele falou: 'Eu tenho umas coisas lá em casa, assim, que eu faço, e num sei que tal. E eu falei: 'Então vamo aproveitar, vamo pra lá, que não tem ninguém'. E fomos, subimos lá e ele tocou umas coisas assim, tal. De repente, começou a fazer uma harmonia, que veio logo uma melodia na minha cabeça. Quando acabou, tava lá uma música, que a gente, pela letra do Marcinho [Borges] e por tudo, é o 'Clube da Esquina'. Que era sobre a rapaziadinha que se reunia ali na esquina da casa do Lô com a outra rua, Paraisópolis e Divinópolis." (veja aqui, a partir de 02:45)

A pacata esquina da rua Paraisópolis com a rua Divinópolis
Mais pra frente, Lô Borges relembra o que aconteceu a partir da amizade selada com caipirinhas:

"O Milton foi um cara, assim, fundamental pra mim, desde o começo. Ele prestou muita atenção nas coisas que eu vinha fazendo, que eu tava começando a compor. E a partir daí, toda vez que ele voltava pra Belo Horizonte, ele [perguntava]: 'Cadê o Lô?' [Alguém respondia]: 'O Lô continua na esquina, tocando violão, num sei o que lá...' Aí, ele chegou, um dia, ele chegou perto de mim e falou: 'Cara, eu queria te convocar pra uma coisa, agora, que não é mais gravar música sua, só. Eu queria te convocar pra fazer um disco. Cê vai ter que mudar de Belo Horizonte, cê vai ter que morar no Rio, comigo, pra gente fazer um disco." (veja aqui, a partir de 06:26)

Porém, em pleno governo do ditador Emílio Garrastazu Médici, o sonho do garoto de 18 anos quase foi abortado pelo Exército. Prossegue Lô Borges:

"[Milton disse]: 'Cê aceita [fazer o disco]?' Eu disse: 'Aceitar eu aceito, agora o difícil vai ser convencer minha mãe, convencer o Exército brasileiro. O capitão da minha companhia, nessa primeira entrevista, ele me tratou bem e falou: 'Tudo bem'. Eu expliquei pra ele os motivos, falei, olha: 'Eu tô sendo convidado pelo Milton Nascimento, que fez 'Travessia', num sei o que lá, eu tenho 18 anos, e o cara tá me abrindo uma porta pra eu transformar a musicalidade que eu tenho numa carreira profissional, de ir pro Rio de Janeiro, gravar discos. Então, eu não tenho nada contra o Exército'. Eu tive que falar essas histórias. Aí o capitão chega, num belo dia, ele fala assim: 'Quem é o músico, mesmo, da minha companhia?' Aí eu, tímido, lá, já com o cabelinho cortado, já, raspado, fui: 'Sou eu'. Ele falou assim: 'Vem cá'. Aí ele me levou pra dentro de uma sala, me pegou pelo braço, com toda a força, me jogou num sofá e falou assim: 'Olha, você não vai servir o Exército não é porque você não quer servir o Exército. É porque o Exército que não quer pessoas da sua espécie aqui dentro. Seus comunistas de merda!' E depois convencer meu pai e minha mãe foi mais fácil." (veja aqui, a partir de 07:10)

No bar: Milton, Toninho Horta, Beto, Fernando Brant, Lô e Marcinho
E foi depois de todos esses percalços, da caipirinha, da amizade (musical) que surgiu, da pressão do Exército e da permissão da família que um dos discos mais fantásticos da história da música brasileira foi produzido. Com a participação de outros músicos, letristas, compositores e cantores geniais, como Toninho Horta, Beto Guedes, Robertinho Silva, Ronaldo Bastos, Fernando Brant, Marcio Borges, Novelli etc etc. Companheiros de composições, gravações e de mesas de bar, lógico. Por isso, pra encerrar esse post, nada melhor que celebrar a música e a amizade (re)ouvindo esse disco - e, de preferência, saboreando uma caipirinha:





Som na caixa, manguaça! - Volume 91

Compartilhe no Twitter
Compartilhe no Facebook

CRISÂNTEMO
(Emicida/Dona Jacira/Felipe Vassão)

EMICIDA & DONA JACIRA

ele bebeu, bebeu
tipo vencedor
e depois riu, riu
como Bira do Jô
cumprimentou
todo mundo à la vereador
e subiu o morro estilo viatura
ele nos deu, nos deu
toda a fé de um pastor
depois sumiu, sumiu
deixando só a dor
ignorou o aviso
devagar com o andor
e flertou por sobre a vida dura

trafegou aéreo, dançou sério, pala
serpente rasteja, credo, pobre mestre-sala
cigarro no bolso, barro, Für Elise embala
no solo onde impera, qualquer bonde é vala
toma outro drink, se é o que lhe resta
toma outro drink, a vida é uma festa
viaja Amyr Klink, faz eterna sua sesta, vai
nem deu tempo pra dizer bye bye

a vida é só um detalhe (4X)
é tudo, é nada, é um jogo que mata
é uma cilada
a vida é só um detalhe (2X)

padeceu, desceu
como na seca, flor
e nóis seguiu, seguiu
juntando o que restou
uns retrato, disco
foi morar de favor
bem quando vi que o mundo é sem
calma

aconteceu, teceu
como Deus desenhou
no que surtiu, surgiu
um peito sofredor
era rato, bicho, mofo, fedor
mais saudade, que é sentir fome com a alma

e na ceia migalhas, no júri mil gralhas
não jure, quem jura mente, pra sempre, fé falha
vida, morte, números, de neguinho
aqui é cada um com a sua coroa de espinhos
qual a sua droga? TV, erva?
qual a sua droga? Solidão, cerva?
onde você se esconde? Onde se eleva, hein?
o que é seu em terra de ninguém?

e a vida é só um detalhe (4X)
é tudo, é nada, é um jogo que mata
é uma cilada
a vida é só um detalhe (2X)

"Era dia de Cosme, madrugada, chovia lá fora. De repente, alguém chama: 'Jacira, sou eu, Luiz'. Pressenti: 'Miguel morreu'. O que mais poderia ser? Além do mais, meu coração já estava apertado, prevendo desgraça. Na festa do terreiro, a certa hora, o Erê subiu. E quem desceu foi seu Sultão da Mata. Me chamou e disse: 'Pegue os meninos, vá pra casa'. Disse: 'Prepare o coração e seja forte, vá'. Levantei, abri a porta e a desgraça se confirmou. Uma briga, o tombo. O Seu Zé do Doce socorreu. Seu Zé é a representação do Estado no Jardim Fontális, talvez ainda, até hoje. Notícia pra dar, vaquinha pra enterrar. Domingo. Justo eu, que me criei sem pai. Perder o pai já é uma tragédia, perdê-lo na infância é sentir saudade. Não do que viveu, mas do que poderia ter vivido. O enterro, a volta, o olhar do menino marejando, pensando longe. Sem entender. E o meu coração apertado, sem conseguir explicar. O tempo foi encaixando tudo. Os pertences dele sempre no mesmo lugar, o velho chinelo abandonado respondem: 'Ele não vai voltar'. Os dias são escuros mesmo com sol quente. O silêncio de Miguelzinho cala, cada vez mais fundo no peito da gente. Quando o pai morre, a gente perde a mãe também. Eu já sabia o que era isso. Como pode alguém morrer no mesmo dia que nasceu?"


(Do CD "O Glorioso Retorno de Quem Nunca Esteve Aqui", Laboratório Fantasma, 2013)




quarta-feira, dezembro 23, 2015

A ciência que interessa: champanhe previne alzheimer

Compartilhe no Twitter
Compartilhe no Facebook

 

Como diria a filósofa baiana Simone (não é a de Beauvoir), "então é Natal!" Por isso, aproveito para repercutir um estudo da Universidade de Reading, em Berkshire, Reino Unido, que aponta que  "três copos de champanhe são o suficiente para influenciar positivamente a nossa memória espacial e ajudar na prevenção de várias doenças neurológicas, como é o caso da demência e do Alzheimer". Tá aí, manguaça, a desculpa pra triplicar a quantidade de garrafas de Cidra Cereser! Portanto, Feliz Páscoa! Quer dizer, Feliz Dia da Bandeira! Não, peraí... É Feliz... o quê, mesmo?!? Tô precisando de champanhe...


Bicuda na canela

Compartilhe no Twitter
Compartilhe no Facebook

Mas com toda a elegância. Quando Chico Buarque foi importunado por filhinhos-de-papai num restaurante do Leblon, no Rio de Janeiro (entre eles, Alvarinho, filho do empresário Álvaro Garnero), que se sentiram no direito de criticar seu apoio ao PT, o artista rebateu: "Acho que o PSDB é bandido, e agora? Procure se informar mais, porque com base na revista ‘Veja’ você não vai chegar muito longe". E depois, passado o bate-boca, Chico faz, sutil e magistralmente, a seguinte postagem numa rede social:


Afinal, o partido é dos trabalhadores. E, falando nisso (trabalho), voltemos ao Chico, num vídeo em que conta o seu despertar político (e que, por isso mesmo, explica totalmente suas escolhas políticas): "Pra mim, o lixeiro era o sujeito que mais trabalhava, era a pior profissão do mundo. E uma das melhores profissões do mundo, que eu achava muito folgada, era a profissão do meu pai, que ficava lá no escritório batendo a máquina, clec-clec-clec-clec. Isso é moleza. Duro é ser lixeiro. Como é que meu pai, que ficava sentado, [fazendo] clec-clec-clec-clec, pôde se casar, e ter sete filhos, e o lixeiro, que trabalha muito mais, carregando aquelas latas e se sujando todo, não tem dinheiro para constituir família? Aí, foi a primeira revolta, assim. [Pensei:] Esse mundo é injusto". Confira:


LEIA TAMBÉM:


terça-feira, dezembro 22, 2015

'Tudo ficará positivamente mórbido...'

Compartilhe no Twitter
Compartilhe no Facebook

Júpiter Maçã nos tempos de 'A Sétima Efervescência Intergaláctica'
Quase nos acréscimos, "fomos surpreendidos novamente" pelo ano de 2015: depois de levar José Rico, em março, agora nos levou Flávio Basso, o Júpiter Maçã, já citado neste blogue (aqui e aqui). Segundo familiares, ele teria caído no banheiro e sofrido lesões na cabeça, mas isso não está confirmado. Sim, um acidente tão estúpido e estranho quanto o que sofreu em julho de 2012, quando quebrou o pulso e uma costela ao despencar dois andares. Pelo o que parece, infelizmente, álcool e drogas já estavam cobrando o preço dessa lenda viva do rock gaúcho, que tinha apenas 47 anos. Como ele cantava em "Miss Lexotan 6 mg", um de seus maiores hits (regravado, entre outros, pelo Ira): "E quando o sol finalmente raiar/ E ela então ferrar/ E quando o sol finalmente raiar/ E ela desmaiar/ Tudo ficará positivamente mórbido..."

Uma de suas últimas aparições, no festival 'Psicodália 2015', em Rio Negrinho (SC)

Júpiter Maçã, quando ainda era Flávio Basso, apareceu com a banda Cascavelettes, por volta de 1987. Naquele mesmo ano, participaram da coletânea "Rio Grande do Rock", ainda em vinil, lançada pela gravadora holandesa SBK. Mas foi no segundo disco solo da banda, o "Rock'a'ula" (EMI Odeon, 1989), que os gaúchos ganharam projeção nacional ao ter incluída a música "Nega bombom" na trilha da novela "Top Model", da Rede Globo. Foi então que, "para a nossa alegria", protagonizaram um dos maiores constrangimentos da história de nossa televisão, ao apresentarem a música "Eu quis comer você" no programa "Clube da Criança", da Angélica (!): "Quando eu volto pra casa/ E a minha garota está dormindo/ Eu tomo uma latinha de cerveja/ Que fome eu estava sentindo! Uhn.. eu quis comer você!" (Chupa, Huck!) Os Cascavelettes acabaram em 1992 e, quatro anos depois, Flávio, já "reencarnado" em carreira solo como Júpiter Maçã, lançou uma obra-prima do pop nacional, o álbum "A Sétima Efervescência Intergaláctiva", todo calcado nas bandas de garagem e na psicodelia da década de 1960. Sempre vale - e valerá - a pena ouvi-lo inteiro:


O disco abre com "Um lugar do caralho", espécie de "hino-manifesto" regravado por gente como Wander Wildner: "Eu preciso encontrar/ Um lugar legal 'pra mim' dançar/ E me escabelar/ Tem que ter um som legal/ Tem que ter gente legal/ E ter/ Cerveja barata/ Um lugar onde as pessoa sejam mesmo 'afudê'/ Um lugar onde as pessoas sejam loucas/ E super chapadas/ Um lugar do caralho!" É o som de uma época (pelo menos para mim). Quem me apresentou esse disco foi o colega Fabião (Fabio Butinholi), em 1997, quando eu ainda fazia faculdade e vivia exatamente a "vida zonza" descrita nessa letra nas "repúblicas" (podres) lá em Campinas. Em 2000, quando morava no bairro Cidade dos Funcionários, em Fortaleza, enchia a cara e berrava o refrão de "Eu e minha ex" com o camarada Paulo Coting, para desespero dos vizinhos. Tempo bão. Uma mobilete velha, um garrafão de vinho vagabundo, cigarro "estoura-peito", planejamento zero e Júpiter Maçã rolando na fita cassete. "Querida Superhist", "As tortas e as cucas", "As outras que me querem", "Pictures and paintings"... Hoje é dia de (re)ouvi-las, "bebendo o morto". Muito grato, Flávio Basso. Esteja bem.



segunda-feira, dezembro 21, 2015

Saideira(s)

Compartilhe no Twitter
Compartilhe no Facebook

Aloísio e o ex-goleiro degustando o 'danone' prometido
Aloísio Chulapa cumpriu o prometido e tomou um "danone" com o colega Rogério Ceni, na despedida do goleiro dos gramados. Mesmo com tantas - e intermináveis - saideiras, o centroavante de 40 anos, que chegou a pendurar as chuteiras e ensaiar um retorno neste ano (leia aqui), anunciou que pretende defender as cores do Maranhão Atlético Clube em 2016. Melhor arrumar, pra já, um personal trainer (para o fígado...). Quanto a Rogério Ceni, a possibilidade de se tornar treinador parece estar mesmo em seus planos e ele disse que vai acompanhar treinos de Juan Carlos Osorio na seleção mexicana. Já o São Paulo contratou mais um gringo, o argentino Edgardo Bauza, que pretende trazer vários jogadores estrangeiros, a exemplo do que fez (sem sucesso), em 2014, seu compatriota Ricardo Gareca no Palmeiras. Melhor seria apostar nos garotos da equipe sub 20, que conquistaram três títulos neste ano. Bom, depois de tantos vexames na última temporada (relembre aqui, aqui e principalmente aqui), o que inspira justificado receio para 2016, melhor tomar um - engradado de - "danone" pra esfriar a cabeça. E passa a régua!


sexta-feira, dezembro 11, 2015

'Por causa do chope'

Compartilhe no Twitter
Compartilhe no Facebook

'Você entra num bar'... e vê Paulinho da Viola, Chico Buarque e Toquinho
Se a maconha é de esquerda e a cocaína é de direita, a cerveja é cultura. Ou melhor: favorece a cultura, a criatividade e as produções artísticas. Relendo "Eis aqui os Bossa Nova", de Zuza Homem de Mello (Editora Martins Fontes, 2008), reparei no seguinte depoimento de Chico Buarque (os grifos são meus):
"Eu acho que o Rio até hoje ainda é o lugar onde há a maior confraternização de pessoas de diferentes atividades, com grande diferença de idade, talvez por causa da praia, por causa do chope, não sei explicar direito, mas o Rio permite esse trabalho de solidariedade entre as pessoas e os artistas principalmente. Você entra num bar, tem um cineasta conversando com um músico, um poeta e um cara do teatro, há um clima que favorece a criação de grupos abertos para uma porção de novidades."
Miriam Matos liberou cerveja pros irmão - e também entorna no trampo
Faz sentido: o próprio Futepoca nasceu dos encontros e das conversas no bar. Só que, pra fugir dessa apologia chicobuarqueana ao Rio de Janeiro, mas ainda falando sobre bebida e ideias criativas, encerro o post recuperando a notícia (já velha - leia aqui) sobre uma agência de comunicação de São Paulo que permite que seus funcionários bebam cerveja durante o expediente (!). "Desde que esses hábitos foram acrescentados à rotina da agência, coisas maravilhosas têm acontecido. Os colaboradores estão mais soltos, muito mais criativos e empenhados em traçar estratégias para colocar nossos clientes. Nunca houve nenhum problema quanto a isso", garantiu, ao jornal Extra (RJ), a dona da empresa, Miriam Matos. Difícil ou fácil? Esse é o emprego - e a classe patronal - que o Brasil precisa! E manda mais uma dúzia no 170!


quinta-feira, dezembro 10, 2015

Que desperdício (de vinho)!

Compartilhe no Twitter
Compartilhe no Facebook

Pensei que a notícia de que um dirigente do São Paulo F.C. deu um soco na cara do outro fosse imbatível para faturar o prêmio "Vale-Tudo do Poder" de 2015, mas eis que abro a inFernet e leio a sensacional, inacreditável e maravilhosa manchete:


Pois é - ou melhor, pois ZÉ (Serra). Segundo Mônica Bergamo, da Folha de S.Paulo, durante jantar na casa do Eunício Oliveira, seu colega de Senado José Serra "simplesmente chegou numa roda em que não tinha sido chamado, sem mais nem menos" e falou para a ministra da agricultura: "Kátia, dizem por aí que você é muito namoradeira". Kátia - que, aliás, é apelido para cachaça ("kátiaça") - descascou na hora: "Você é um homem deselegante, descortês, arrogante, prepotente. É por isso que você nunca chegará à Presidência da República. Nunca lhe dei esse direito nem essa ousadia. Por favor, saia dessa roda, saia daqui imediatamente". E tascou-lhe o vinho no meio da fuça (leia detalhes aqui).

Taça da discórdia: Kátia Abreu bota o desengraçadinho José Serra em seu devido lugar

O mais divertido é que, apesar de ser do mesmo partido do nefasto senador (ambos fincam trincheiras no nefasto PSDB), Kátia Abreu ainda fez questão de salgar a terra, gritando pra quem quisesse ouvir: "De mais a mais, nunca traí ninguém na minha vida". Pô, aí já é vandalismo! Geraldo Alckmin deve estar rindo sozinho até agora. E isso me lembrou uma célebre máxima do - falecido e também tucano - Mário Covas: "Em banco que José Serra se senta, todo mundo se levanta". Se levanta ou joga na cara dele o que tiver à mão! Afinal, José Serra é conhecido há décadas por ter um senso de "humor" nada invejável. Diante de tanta baixaria, só me resta lamentar o vinho derramado. Será que não tinha uma Skol pra jogar na cara dele? No mais, Deus me livre de festa que junta tucanos...




"Kátia, afasta de mim esse cálice..."


 

quarta-feira, dezembro 09, 2015

O que vamos Temer?

Compartilhe no Twitter
Compartilhe no Facebook

Num "desabafo" politicamente oportuno (e oportunista), o vice-presidente Mi-mi-mi chel Temer mandou uma cartinha (de Natal?) para a presidente Dilma Rousseff. Basicamente, chorôrando e mimimizando o seguinte:


Outra carta, muito mais relevante, foi divulgada por artistas e intelectuais que se insurgem contra o golpe anunciado."Sastifação" (como diria o DeMassad) foi encontrar, entre os que assinam o manifesto, o nome do colega "João Paulo Soares, jornalista" - já citado neste blog (aqui e aqui, por exemplo). É nóis! À luta.


Tipos de cerveja 88 - As Saison

Compartilhe no Twitter
Compartilhe no Facebook

Típica cerveja caseira, as Saison eram produtos elaborados no inverno para consumo no verão, dadas as dificuldades de refrigeração. Sendo um estilo complexo, não muito ao gosto comercial, está meio esquecido pelo mercado, com o fechamento de pequenas empresas que se dedicavam à sua produção. Possuem aroma e sabor frutado (habitualmente de citrinos), sendo que a adição de várias especiarias e ervas lhe dá um carácter meio seco e ligeiramente ácido. Muito frescas e com bastante gás, acompanham bem refeições condimentadas, queijos e carnes em geral. Para experimentar, o site português Cervejas do Mundo recomenda a Southampton Saison, a Fantôme Saison ou a Saison Dupont Vieille Provision (foto).


Muito simbólico também

Compartilhe no Twitter
Compartilhe no Facebook

Ricardo Teixeira, Juvêncio e José Serra: Copa no Morumbi esfarelou-se
Outro dia observei aqui como foi simbólica a sova de 6 a 1 dada pelo Corinthians (ou melhor, os reservas do Corinthians) no São Paulo, fazendo um paralelo sobre a impressionante recuperação e reestruturação alvinegra, de 2008 pra cá, em contraposição à ainda mais impressionante e retumbante derrocada sãopaulina no mesmo período. Um saiu da Série B, ganhou o Brasil, o continente e o mundo, inaugurou um moderno estádio, que foi sede de abertura de Copa do Mundo, multiplicou suas fontes de renda (e sua torcida) e contempla uma sólida hegemonia estadual e nacional dentro de campo, nos próximos anos. O outro saiu do tricampeonato da Libertadores, do Mundial de Clubes e do Brasileiro, da perspectiva de sediar a abertura da Copa e de reformar seu estádio, da estabilidade de três anos de um técnico e das promessas das categorias de base para o jejum de títulos, a perda da Copa e do patrocinador master, o abandono do projeto para o Morumbi, a insolvência financeira, atraso de salários, lavação de roupa suja e porrada entre dirigentes em público e, mais do que tudo, para uma interminável série de surras e vexames dentro de campo.

Foi o 'soberano' Juvêncio quem elegeu presidente Carlos Miguel Aidar
Como já listei aqui, a maior responsabilidade por esse esfarelamento institucional sem precedentes, por esse verdadeiro caso de estudo que foi o que ocorreu com o São Paulo num curto prazo de sete anos, cabe ao ex-presidente Juvenal Juvêncio. Que morreu hoje, de câncer, na capital paulista. Como é, no mínimo, covardia ofender um falecido, que não pode mais se defender, não vou repetir e repisar a série inacreditável de decisões desastrosas que ele tomou quando dirigia o clube - e que, como disse, tiveram consequência direta na lamentável situação atual. Mas é muito simbólico, também, que, no momento em que o time termina mais uma temporada bem abaixo dos maiores rivais, sendo eliminado duas vezes pelo Santos (nas semifinais do Paulistão e da Copa do Brasil) e goleado impiedosamente pelo Palmeiras (3 x 0 no Paulista e 4 x 0 no Brasileiro) e pelo Corinthians (o já citado 6 x 1), que aquele São Paulo "soberano" bravateado (de forma muito infeliz) por Juvêncio esteja hoje inegavelmente morto. Como o dirigente. É o fim de uma fase, de uma mentalidade baseada na arrogância, na empáfia, no egocentrismo, na soberba, na "soberania".

Descanse em paz, Juvenal. Que, depois de você (e do Carlos Miguel Aidar, que você elegeu - lembrem-se disso!), precisará ser reconstruído totalmente. Das cinzas. Amém.


quinta-feira, dezembro 03, 2015

Um pra cada e um sem nada

Compartilhe no Twitter
Compartilhe no Facebook

Time do Palmeiras levanta a primeira taça em sua nova e moderna arena

Como eu desconfiava (leia aqui), o lado alviverde da força venceu a Copa do Brasil. Ao contrário de 2014, quando o futebol paulista não ganhou nada (leia aqui), encerramos este ano com um título para o Santos (Campeonato Paulista), um para o Corinthians (Brasileiro) e um para o Palmeiras (Copa do Brasil), enquanto o São Paulo (de novo) termina uma temporada sem nada. A recuperação palmeirense, que, do quase rebaixamento para a Série B do Brasileiro há exatamente um ano, reergueu-se com um novo estádio, várias contratações, duas decisões disputadas este ano e um título conquistado, demonstra que a partir de agora haverá um novo "Trio de Ferro" no Estado, depois de seis anos de predomínio corintiano e santista.

Corinthians venceu o Brasileiro, oitavo título conquistado de 2008 pra cá

De 2008, quando o São Paulo ganhou seu último título importante, o Campeonato Brasileiro, pra cá, o Corinthians levantou oito taças (Mundial, Libertadores, Recopa Sul-Americana, dois Brasileiros da Série A e um da Série B e dois Paulistas), o Santos sete (Libertadores, Recopa Sul-Americana, Copa do Brasil e quatro Paulistas) e o Palmeiras, três (duas Copas do Brasil e um Paulista). No período, além do Brasileiro, o Tricolor venceu uma minguada Copa Sul-Americana. Detalhe: o São Paulo é único que nunca venceu uma Copa do Brasil, assim como foi o último a conquistar um título do extinto Torneio Rio-São Paulo, já nos anos 2000, quando na década de 1950 os três arquirrivais - e até a Portuguesa! - já tinham esse troféu. E se autointitula "soberano"...

Santos ergue o troféu do Paulistão: sempre revelando garotos bons de bola

O prognóstico realista, para os próximos anos, é ainda mais sombrio para os sãopaulinos. Imerso em crise administrativa e financeira, que reflete dentro de campo, o clube vê Corinthians e Palmeiras inflarem seus cofres com patrocínios forte e suas novas, modernas, acessíveis e multifuncionais arenas, que geram grandes contratações e, lógico, títulos, e o Santos mantendo sua rotina de revelar moleques bons de bola, que são vendidos a peso de ouro, e sempre beliscando um troféu aqui ou acolá. Neste fim de temporada, o Tricolor, milagrosamente, ainda tem chance de conseguir uma vaguinha da Libertadores. Mas, como já questionei aqui, pra quê disputar a Libertadores? Caindo no grupo de Palmeiras ou Corinthians, vai passar vexame (de novo)...

Fim de feira: Tricolor vê rivais campeões e é massacrado dentro de campo

E se o Goiás vencer o São Paulo no domingo, o Feliz Natal dos rivais será completo...



quarta-feira, dezembro 02, 2015

Os pingos nos is OU carmelita descalça no puteiro

Compartilhe no Twitter
Compartilhe no Facebook

FHC, herói da Veja: Delcídio estaria em seus diários?
Ninguém aqui quer defender o PT, o governo Dilma, o Lula ou nunseiquelá, nunseiquelá, nunseiquelá. Não integramos suas assessorias de imprensa e, para esse tipo de defesa, sempre existem advogados bem dispostos - e (muito) bem remunerados. Mas, como observou meu colega jornalista Lobão (Rogério Castro), sobre as cobranças do "santo" Aécio Neves (PSDB) à presidente Dilma em relação à prisão do senador Delcídio Amaral (PT), "sei que não adianta explicar para quem não quer entender, mas não custa nada encher o saco dos cidadãos de bem, defensores da moralidade pública, que infestam as redes sociais: com a prisão de André Esteves, um ex-presidente do Banco Central de FHC assumiu o comando do BTG Pactual. Pô, parem de bancar a carmelita descalça dentro do puteiro!".

Exatamente. A esses "cidadãos de bem, defensores da moralidade pública, que infestam as redes sociais" e saem nas ruas com camisa da seleção brasileira, louvando militares, Bolsonaros e Malafaias, complemento o lembrete do Lobão com um belo texto que circula pela internet e é assinado por Maria Fernanda Arruda:


Está claro para vocês o desenrolar dos acontecimentos recentes ou querem que eu desenhe o fato óbvio de que o caso de corrupção que está sendo investigado na Lava-Jato não começou em 2003 e não se encerra na Petrobras!? [OBS: por favor, compartilhem até chegar ao Sr. Moro, porque parece que ele está por fora disso tudo aí.]"

Por hoje é só.


Expressões populares do império resistem ao tempo

Compartilhe no Twitter
Compartilhe no Facebook

Começando a ler "O reino que não era deste mundo", do historiador Marcos Costa (Editora Valentina, 2015), sobre o período imperial brasileiro no século XIX, me deparo com três expressões populares que resistiram ao tempo e ainda hoje usamos:

Maria vai com as outras - "[A] Rainha D.Maria I (...) vivia praticamente em estado de loucura no Brasil, completamente senil e para tudo dependente de suas amas, daí o surgimento da expressão 'maria vai com as outras'." A partir de então, o povo passou a usar esse termo para designar "uma pessoa que não tem opinião, que segue o comando dos outros, que se deixa convencer com facilidade" (leia aqui).

É um 'caxias' - "Filho do Brigadeiro Francisco de Lima e Silva, regente do Império (...), [o Duque de] Caxias (...) aprendeu, sobretudo, a cultivar a sua fidelidade à Monarquia. Com a família elevada à cúpula do Exército brasileiro, além do pai regente, os tios José Joaquim de Lima e Silva e Manoel da Fonseca de Lima e Silva, respectivamente elevados à condição de Comandante de Armas da Corte e do Ministério da Guerra, em 1832, Luís Alves de Lima e Silva assume o posto de comandante das Guardas Municipais Permanentes (...), a tropa de elite do imperador. (...) Papel que desempenhou com extrema competência." Não por acaso, portanto, passamos a chamar de "caxias", desde aquela época, "pessoa que cumpre com extremo escrúpulo as obrigações do seu cargo, ou que exige de seus subordinados o cumprimento rigoroso das leis, regulamentos e determinações de serviço" (leia aqui).

Pra inglês ver - "O fim do trabalho escravo no Brasil e a sua substituição pelo assalariado, ambicionavam os ingleses, criariam no país um amplo mercado consumidor para os seus produtos industrializados. (...) O tráfico negreiro, no Brasil, depois da pressão dos ingleses, fora proibido desde 1831. Essa lei declarava livres todos os escravos vindos de fora do Império. (...) [Só que] Os interesses ligados à lavoura eram tão poderosos, que a lei, como tantas outras ainda em nossos dias, simplesmente... não saiu do papel, não pegou. A lei imposta foi responsável pela criação no vocabulário brasileiro de um jargão, reproduzido até hoje: 'pra inglês ver'." Estavam batizadas popularmente, a partir de então, as "leis ou regras consideradas demagógicas e que não são cumpridas na prática" (leia aqui).

Não é a toa, portanto, que o autor do livro conclui que periodicamente, no Brasil, o cenário político e de poder precisa "mudar para deixar tudo exatamente como estava"...



Som na caixa, manguaça! - Volume 90

Compartilhe no Twitter
Compartilhe no Facebook

TODO ENROLADO
(Edenal Rodrigues)

Noriel Vilela


Quem eu devo, espera, porque eu pago!
E no momento eu estou todo enrolado
A quem devo, espera, porque eu pago!
E no momento eu estou todo enrolado...

Já não acredito em mais nada
Na vida só estou dando azar
Pra frente eu só vou quando eu tropeço
Ou se alguém me empurrar

Quando eu quero bicar alguém
Dizem logo: 'Suncê já está manjado!'
A pior coisa que tem no mundo
É pedir dinheiro emprestado

Quem eu devo, espera, porque eu pago!
E no momento eu estou todo enrolado
A quem devo, espera, porque eu pago!
E no momento eu estou todo enrolado...

Tô devendo a escola das crianças
O armazém que fiou bóia pra mim
A padaria da esquina
E devo também no botequim

A casa já vai para seis meses
Devo a vizinhança um bom 'cacau'
Meu apelido aonde eu moro
Passou a ser cara de pau
Mas que o meu apelido aonde eu moro
Passou a ser...

Pode deixar que eu pago, eu já disse!
Deixa comigo, eu vou pagar, mas devagar, hein!
A maré aí não tá boa ainda
Segura a conversa, depois eu conto
Viiiige!
Deixa isso pra lá...
Falô! 

(Compacto simples - Copacabana/1971)





segunda-feira, novembro 30, 2015

Costelas, Adão e Eva, castigo, trabalho e o ócio sagrado

Compartilhe no Twitter
Compartilhe no Facebook

Tom Zé: 'Estão comprando o Brasil de volta'
Há uns 15 anos, ao entrevistar por telefone o Tom Zé, para o jornal Diário do Nordeste, de Fortaleza, ele me perguntou sobre o que acontecia de mais relevante no Ceará, naquela época. Como eu era repórter do caderno de economia (e estava apenas fazendo um bico para o de cultura), comentei:

- Acho que uma coisa que o pessoal não tem ideia nas outras regiões do país é que grupos portugueses estão comprando várias extensões na costa cearense, construindo hotéis na beira do mar e cercando as praias, impedindo o acesso da população. É uma verdadeira privatização do espaço público.

Tom Zé soltou uma gargalhada no telefone e gritou para a esposa dele:

- Neusa! Vem aqui ouvir o que o repórter tá me contando: os portugueses venderam caro nossa independência e agora tão comprando o Brasil de novo, aos poucos!

Exatamente. O fino humor do músico, intérprete, compositor e performer baiano resumiu, em uma frase, o que dez comentaristas ou colunistas econômicos não conseguiriam (ou não ousariam) concluir. Mas me lembrei disso porque, hoje, ao ler uma notícia na inFernet, fiquei pensando o que o Tom Zé - que  há dez anos lançou o CD "Estudando o Pagode - Na opereta Segrega Mulher e Amor", sobre machismo, papel da mulher e suas relações com o homem (ouça aqui) - comentaria sobre isso:


Sim: uma modelo sueca arrancou seis costelas por questão estética (leia aqui). Imagino o que o Tom Zé observaria sobre isso, se as costelas dariam origem a um novo ser, como Eva, que Deus criou a partir de uma costela que retirou de Adão, segundo a Bíblia. Vai daí, uma ideia (de jerico) puxa outra e me lembrei de um texto que li recentemente, da filósofa Marilena Chauí, como introdução ao trabalho clássico "O direito à preguiça", de Paul Lafargue. Ela observa que "ao ócio feliz do Paraíso segue-se o sofrimento do trabalho como pena imposta pela justiça divina e por isso os filhos de Adão e Eva, isto é, a humanidade inteira, pecarão novamente se não se submeterem à obrigação de trabalhar".

Chauí: condenação da preguiça faz com que desempregado se sinta humilhado, um pária

A filósofa observa ainda que "o laço que ata preguiça e pecado é um nó invisível que prende imagens sociais de escárnio, condenação e medo" e que isso gerou "as figuras do índio preguiçoso e do negro indolente", do "nordestino preguiçoso, a criança de rua vadia (vadiagem, aliás, o termo empregado para referir-se às prostitutas), o mendigo - 'jovem, forte, saudável, que devia estar trabalhando em vez de vadiar'; é ela, enfim, que força o trabalhador desempregado a sentir-se humilhado, culpado e um pária social". O que me faz pensar no taxista Juraci, o Pai Velho, como um subversivo...

'Vai trabalhar, vagabundo!/ Vai trabalhar, Criatura! DEUS permite a todo mundo/ Uma loucura...'

Prova maior de que o trabalho é um castigo divino é a ira de Deus ao expulsar o casal do Jardim do Éden, descrita no Gênesis. Ele diz a Adão: "Com sofrimentos te nutrirás todos os dias de tua vida (...). Com o suor de teu rosto comerás teu pão, até que retornes ao solo, pois dele foste tirado". E é ainda mais cruel com Eva: "Multiplicarei as dores de tua gravidez, na dor darás à luz filhos. Teu desejo te levará ao homem e ele te dominará" (será que isso inclui arrancar seis costelas para atrair a atenção?). Sobre essa pesada pena para a mulher, Marilena Chauí comenta: "Não é significativo que em muitas línguas modernas recuperem a maldição divina contra Eva usando a expressão 'trabalho de parto'?". Aliás, falando em maternidade, vejamos esse cartum do argentino Quino:

 
Só que, após a reforma protestante e a revolução industrial, o ócio passou a ser condenado pelo ideal religioso, com a preguiça tornando-se um dos "sete pecados capitais", e econômico, com a valorização máxima do dito "tempo é dinheiro". Nisso aí, minha mente (preguiçosa) desanda a trabalhar (pela causa) e faz o link, agora, com um post que fiz, aqui no Futepoca, observando que a palavra trabalho vem do latim tripalium, um instrumento romano de tortura por empalamento, e que a palavra negócio vem de "negação do ócio". Marilena Chauí complementa: o latim labor, que origina a palavra trabalho em inglês e lavoura em português, significa "esforço penoso, dobrar-se sob o peso de uma carga, dor, sofrimento, pena e fadiga". Por outro lado, ócio, em grego, se diz scholé, de onde vem nossa palavra escola. Coisa que o Geraldo Alckmin (PSDB) costuma reorganizar, digo, fechar.

Tripalium (três paus): instrumento de tortura é origem da palavra trabalho

Então, num esforço para amarrar - ou não - tudo isso (costela, Adão e Eva, castigo, trabalho e valorização do ócio), puxo um samba do Adoniran Barbosa, "Conselho de mulher", em parceria com Oswaldo Moles e João Belarmino dos Santos, que eu citava no tal post:

Trecho falado:
"Quando Deus fez o homem, quis fazer um vagulino que nunca tinha fome
E que tinha no destino nunca pegar no batente e viver forgadamente
O homem era filiz enquanto Deus anssim quis
Mas depois pegou Adão, tirou uma costela e fez a mulé
Deis di intão, o homem trabalha p'rela

Vai daí, o homem reza todo dia uma oração:
'-Se quiser tirar de mim arguma coisa de bão, que me tire o trabaio; a muié não!'"

Pogréssio, pogréssio
Eu sempre iscuitei falar
Que o pogréssio vem do trabaio
Então amanhã cedo nóis vai trabaiá

Quanto tempo nóis perdeu na boemia
Sambando noite e dia, cortando uma rama sem parar
Agora iscuitando o conselho da muié
Amanhã vou trabaiá, se Deus quisé
(Mas Deus não qué!)



Taí: se a mulher agora também está arrancando costela, o homem podia entregá-la pra Deus como "quitação de débito", acabar com a obrigação do trabalho e voltar ao ócio sagrado - uma vez que, como lembra Adoniran, no Paraíso "Deus não quer" que peguemos no batente! Outra coisa: trabalho é opressão. Naquele mesmo post que fiz sobre a falaciosa "dignificação do homem", alguém lembrou muito apropriadamente, nos comentários, que - não por acaso - os nazistas punham placas nos portões de entrada dos campos de concentração com a frase "Arbeit macht frei" ("O trabalho liberta").

Frase nos campos de concentração 'ensinava': 'O trabalho liberta'
 
 Ou, como acrescentou o já citado Tom Zé, em "Esquerda, Grana e Direita" (ouça aqui):

"Quando o trabalhador cresce na sociedade
 E tem a oportunidade de ser protagonista da história
Ele pratica o método do opressor
Porque foi o único método que aprendeu
Então, ele só sabe agir como o opressor
Arrastão de Paulo Freire"

E, falando no "Elogio ao ócio" (outro texto clássico, dessa vez de Bertrand Russell - acesse clicando aqui), me cai na mão exatamente neste momento um exemplar da revista "Cidade", publicação do Shopping Center Cidade Jardim, com um texto de Adriana Nazarian intitulado "O que fazer? NADA", que afirma: "Ter horas livres - em uma época em que nada parece ser tão livre assim - pode ser mal visto. Para dar conta da demanda, que também exige vida pessoal bem equilibrada, eliminamos da rotina algo fundamental: o ócio".

Ilustração da matéria da revista 'Cidade' (feita por Catarina Bessell)

A revista ouve três especialistas que reforçam que "praticar o nada é essencial":

"É fácil achar que o mundo vai se afastar de nós caso a gente dê uma pausa na produção, mas se permitir esses momentos faz com que a parte inconsciente do cérebro organize todas as ideias às quais estivemos expostos. Aprender a desconectar é perceber que nós não podemos - nem devemos - participar de absolutamente tudo. Nossa cultura prega a ilusão de que podemos ter tudo, mas isso acaba colocando o foco apenas no que não temos." - David Baker, fundador e editor da revista "Wired', escritor e professor

"Praticar o fazer nada é crucial para equilibrar a fisiologia e a cognição. (...) O descanso e, sobretudo, o sono são essenciais para limpar o cérebro de toxinas, repor metabólitos despendidos na vigília e processar memórias. (...) Ao contrário do que muitos pensam, o sono não é um simples descanso, mas tem papel ativo na saúde mental e física. O ócio é parte fundamental da experiência humana e precisa ser preservado." - Sidarta Ribeiro, neurocientista da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)

"Silêncio significa fazer perguntas, e nós  criamos barulho e bagunça justamente para evitar as grandes questões e propósitos da vida. Não abrir espaço para esses momentos é como viver sem dormir, sem deixar o motor esfriar antes de mais uma corrida. Hoje, a maioria das pessoas atribui a felicidade ao alcance de metas. Com isso, vivem infelizes (...)." - Yonatan Shani, diretora do Kabbalah Centre do Brasil

Ignácio de Loyola Brandão: 'A melhor coisa de não fazer nada é, em seguida, repousar'

Ah, tem outro texto que me vem à mente agora, uma crônica do Ignácio de Loyola Brandão publicada no jornal "O Estado de S.Paulo" no ano passado (leia aqui), que proclama:

"Não que eu não faça nada somente no sábado ou domingo de manhã, nos feriados ou nas férias convencionais. Não faço nada quando decido: agora, não vou fazer nada. Isto significa liberdade. Quantos de vocês tomam estas decisões? Não fazer nada, contudo, não significa que em seguida você vai se esfalfar para tirar o atraso. Nem pensar. A melhor coisa de não fazer nada é, em seguida, repousar do nada fazer. Perceber que está feliz por não ter feito nada. Não sentir culpa por não fazer nada."

Sobre isso, aproveito para citar uma frase de outro escritor, Charles Bukowski:

"Gosto de olhar os meus gatos, eles me acalmam (...). Você sabia que os gatos dormem 20 das 24 horas do dia? Não se admira que tenham melhor aparência do que eu."


E arremato com mais literatura, indo direto ao ponto com uma frase de Marguerite Duras:

“É preciso ser muito forte pra não fazer nada.”

 
Buenas, depois de tanto "trabalho" pra pular da modelo que tirou as costelas pro Tom Zé e a privatização de praias brasileiras pelos portugueses, de Adão e Eva e Marilena Chauí para um instrumento de tortura romano e um samba de Adoniran Barbosa, passando pelos campos de concentração nazistas e voltando ao Tom Zé para desembocar nos especialistas e escritores que corroboram a valorização do ócio, vou conceder à minha ociosa inteligência o direito à preguiça. E verei se amanhã "vou trabaiá, se Deus quisé"... "Mas Deus não qué!"