Compartilhe no Twitter
Compartilhe no Facebook
Na sessão da CPI da Petrobras realizada ontem à
tarde em Brasília, o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha
(PMDB-RJ), foi aplaudido após e mesmo durante sua explanação inicial de
53 minutos. Tratou o pedido de abertura de inquérito feito em relação a
ele, realizado pelo procurador-geral da República Rodrigo Janot, como
algo feito por “motivação política”. Foi apoiado por lideranças – a
maioria delas que apoiou sua eleição à presidência da Casa – e
reverenciado de forma comovente pelos seu colegas.
A deferência era tanta que foi constrangedora. Em certos momentos, lembrava cenas do filme O Poderoso Chefão,
onde convidados do casamento da filha de Don Corleone, personagem
vivido por Marlon Brando, recebia pedidos e tinha sua mão beijada pelos
convivas. No caso de hoje, não houve qualquer pedido aparente, apenas
loas tecidas à vontade a Cunha.
Mas se há “motivação política” na inclusão do peemedebista na lista,
quem é o “motivador”? Obviamente, o governo. Na trama em que o
presidente da Câmara alega estar envolvido, Rodrigo Janot estaria
interessado em agradar quem tem a possibilidade de conduzir sua
reeleição, o Executivo, e por isso teria incluído o nome do
peemedebista. Dupla e grave acusação: a de ingerência governamental no
trabalho do Ministério Público e de uma conduta inidônea do
procurador-geral. E os petistas, diante das acusações do presidente da
Câmara, foram vacilantes, preferindo falar sobre temas correlatos mas
não batendo de frente com o depoente.
|
Eduardo Cunha: o inferno são os outros... Sempre. (Lucio Bernardo Jr. – Câmara dos Deputados) |
As falas de Cunha foram diretas e, para ilustrar o que ele diz ser
incoerência do procurador ao pedir investigações sobre ele, citou dois
exemplos de senadores petistas, Delcídio Amaral, que teve o pedido de
abertura de inquérito arquivado, e Gleisi Hoffman. Sempre com uma
adversativa de que citava os exemplos mas não “acusava” ninguém, deixou
os ataques mais agressivos a cargo de parceiros como o deputado Paulinho
da Força (PSD-SP), que levantou a hipótese de conluio entre o ministro
da Justiça, José Eduardo Cardozo, e o procurador Janot.
O fato é que, diante da evidente tática do peemedebista de jogar o
peso das investigações da Lava Jato nos ombros do governo, tomando a
própria defesa como se fosse, também, uma defesa do Legislativo,
atiçando os instintos corporativos dos parlamentares, Cunha mostrou mais
uma vez que sabe bem o que quer e já definiu como fazê-lo. Enquanto
isso, a articulação governista hesitou e, ao não fazer a defesa enfática
do governo diante das acusações do presidente da Câmara, escancarou um
modo de fazer política que é grande responsável pela atual situação em
que se encontra o Planalto e a base dilmista no Legislativo.
Para além da tática política de Cunha, algo comovente na CPI foi
descobrir o quanto nossos deputados prezam e valorizam a presunção de
inocência. E sabem, porque assim disseram vários deles, que o
envolvimento do nome de uma pessoa em investigações pode se traduzir em
culpa para parte da opinião pública.
Uma intervenção reveladora – mas não a única – nesse sentido foi
feita pelo deputado Celso Pansera (PMDB-RS), ao rebater a fala de Ivan
Valente (Psol-SP), que pediu a Cunha que abrisse seus sigilos
telefônico, bancário e fiscal para que pudesse continuar seu trabalho à
frente da Câmara. De acordo com o parlamentar gaúcho, “pedir abertura de
sigilo é induzir à condenação”. Diz muito a respeito da conduta de seus
colegas em diversos episódios.
É uma pena esse interesse pela presunção de inocência ter surgido só
agora, em especial para parlamentares que têm como hábito acusar e
apontar o dedo para um adversário – político ou não – na primeira
oportunidade. E também descobrimos, na didática sessão da CPI, que
decisões judiciais podem ser contestadas publicamente, já que a abertura
de inquérito para investigar Eduardo Cunha foi um pedido de Janot
acatado por um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Teori
Zavascki.
Poderíamos aproveitar essa onda de preocupação de parlamentares com a
presunção de inocência para exigir que este seja um direito assegurado a
todos os cidadãos, pois ele desaparece no cotidiano de muitos
brasileiros, em especial aqueles que vivem nas periferias das grandes
cidades, vítimas do autoritarismo do poder público e que raramente são
tema de qualquer discussão no Congresso Nacional. Porque o ônus da prova
e o peso da culpa, nesses casos, ficam para os acusados, que não são
poucos.
Publicado originalmente na Revista Fórum