Destaques

Mostrando postagens com marcador 1940. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador 1940. Mostrar todas as postagens

terça-feira, março 11, 2014

O mesmo estádio, o mesmo clássico, o mesmo placar. Mas o uniforme do São Paulo, quanta diferença...

Compartilhe no Twitter
Compartilhe no Facebook

Há 73 anos, Aníbal, King e Iracino - e o estranho uniforme
No dia 25 de agosto de 1940, o São Paulo enfrentou o Corinthians no estádio do Pacaembu, pelo Campeonato Paulista. Assim como anteontem, venceu por 3 a 2. Curioso, porém, foi o uniforme utilizado pelo Tricolor naquela partida disputada há 73 anos: uma versão alternativa da camisa listrada, sem as usuais listras vermelhas, apenas as pretas e brancas. Consta que a iniciativa teria sido uma homenagem ao Clube Atlético Estudante Paulista, agremiação fundada em junho de 1937 que conquistou o surpreendente 4º lugar no Paulistão daquele ano mas que, afundada em dívidas (e lesada por um empresário que fugiu com a renda obtida em uma excursão ao Peru), encerrou suas atividades e fundiu-se com o São Paulo Futebol Clube em 12 de setembro de 1938. Seu uniforme era listrado em preto e branco.

Aliás, foi justamente a fusão com o Estudantes o primeiro degrau para que o São Paulo voltasse a ser "gente grande" no futebol paulista. Durante o primeiro período de sua existência, entre 1930 e 1935, o clube era forte. Produto da fusão entre o tradicional Clube Atlético Paulistano (11 vezes campeão paulista) e a Associação Atlética das Palmeiras (tricampeã estadual), que encerraram suas atividades no futebol em 1929, o primeiro São Paulo Futebol Clube - que já tinha o mesmo nome e uniformes usados até hoje - ganhou o Paulistão de 1931 e foi vice em 1930, 1932, 1933 e 1934. Como mandava seus jogos no campo da Chácara da Floresta, na beira do rio Tietê, de propriedade da Associação Atlética das Palmeiras, o time passaria para a história com o nome informal de São Paulo da Floresta.

O campo da Chácara da Floresta, na beira do rio Tietê, ainda existe
Porém, dificuldades financeiras provocaram a fusão do São Paulo com o Clube de Regatas Tietê, em maio de 1935, e a consequente desistência do futebol. Inconformados com isso, alguns sócios do primeiro Tricolor se juntaram em dezembro do mesmo ano para refundar o clube. Só que a nova fase não seria de glórias, pelo contrário. Diz trecho da "História do São Paulo Futebol Clube": "Nessa época o clube não possuía sócios, fonte de renda e sequer patrimônio. Treinava e jogava onde deixavam. Não havia nem lugar para fazer a concentração, que tinha que ser improvisada com metade do elenco na casa do presidente Frederico Menzen e outra metade nos beliches que havia na torre da igreja da Consolação, paróquia do Monsenhor Bastos, ilustre sãopaulino.

Para mandar seus jogos, o clube alugava o Estádio Antonio Alonso, na Mooca, de propriedade da Companhia Antarctica Paulista, fabricante de bebidas. "Os treinos eram por vezes realizados no pátio da própria igreja [da Consolação] junto ao local onde os congregados marianos jogavam basquete. Quando havia disponibilidade o time treinava no campo da Várzea do Glicério, mas com a condição de desocupar o local assim que os times, donos do campo, chegassem", diz o texto da "História do SPFC". Estrutura tão mambembe fez com que, nesses primeiros anos, o clube fosse ironizado pelas outras torcidas como "time de pobretões". Não bastasse isso, a própria imprensa esportiva incorporava a gozação, tratando o clube pelos apelidos de "Júnior", "Clube n.º 2" e "São-Paulinho".

O antigo estádio Antonio Alonso, da cervejaria Antarctica, na Mooca
Não era pra menos: o novo time, fraco, fazia a festa dos adversários. Terminou o Paulistão de 1936 em 8º lugar, num torneio disputado com 12 clubes, e o do ano seguinte em 7º, entre dez participantes. Não era páreo nem para a Portuguesa Santista (3ª colocada tanto em 1936 como em 1937) ou Juventus (5º e 6º colocado naquelas edições, respectivamente). Quando enfrentava os "grandes", então, era só tristeza: até setembro de 1938, foram seis derrotas do São Paulo (dois empates e uma vitória) contra o Corinthians, quatro derrotas (e um empate) contra o Palmeiras e quatro derrotas (três goleadas) contra o Santos. A luz no fim do túnel, como registrei logo no início do post, só viria na fusão com o Estudantes.

Porque do extinto clube vieram vários bons jogadores para incrementar o time e também o jovem técnico Vicente Feola, que faria história no São Paulo e na seleção brasileira. A prova de que os tempos de chacota haviam passado foi o vice-campeonato conquistado logo no Paulistão de 1938, que foi disputado até abril do ano seguinte. E o resultado poderia ter sido ainda melhor, pois, na decisão contra o Corinthians, o São Paulo vencia por 1 x 0 - e abocanhava o título - até que um gol aparentemente irregular deu a taça ao adversário. "Parece que o ponto corinthiano, obtido por Carlito, aos 20 minutos da phase complementar, foi proveniente de um toque [de mão], o que provocou tantos e tantos protestos e até a interrupção do prélio por cinco minutos", relatava o jornal Folha da Manhã em 26/04/1939.

O técnico Feola (à esquerda) e o São Paulo vice do Paulistão em 1938
Mesmo com a perda do título, o São Paulo já mostrava que podia brigar novamente entre os "grandes" do futebol paulista. Se a fusão com o Estudantes foi o primeiro passo para isso, o segundo seria dado em 1942, com a compra do artilheiro Leônidas da Silva. Sob seu comando, o time sãopaulino ganharia cinco títulos paulistas na década de 1940, ganhando o apelido de "Esquadrão". E a "maioridade" do Tricolor, por assim dizer, se completaria em 1944, com a compra do Estádio do Canindé. Com a declaração de guerra do Brasil contra a Alemanha, o Deutsch Sportive, clube da colônia germânica que era proprietário do estádio, temia que ele fosse confiscado e, por isso, o vendeu ao São Paulo (que mais tarde o repassaria à Portuguesa, a quem ainda pertence). Ia longe o tempo das concentrações na Igreja da Consolação...

Mas, voltando ao clássico disputado em agosto de 1940, com vitória do São Paulo por 3 x 2 sobre o Corinthians, há uma outra hipótese para a utilização do estranho uniforme com listras pretas e brancas, que seria abandonado definitivamente a partir de então. Em abril daquele ano, a inauguração do estádio municipal do Pacaembu contou com a presença do ditador Getúlio Vargas, odiado pelos paulistas desde a derrota da rebelião de 1932. Para provocá-lo, a população ficou em pé e passou a gritar "São Paulo! São Paulo! São Paulo!", numa referência ao Estado, assim que a delegação de jogadores do Tricolor entrou para desfilar no novo estádio. Por esse motivo, o clube ficaria conhecido como "O mais querido".

Como o uniforme com listras pretas e brancas lembra a bandeira do Estado de São Paulo (ainda mais porque a gola e as mangas, vermelhas, remetem ao detalhe do retângulo no canto alto do pavilhão, à esquerda), teria sido uma forma de o time retribuir o gesto da torcida na inauguração do Pacaembu. Mas nem o clube guardou registro sobre isso e, se foi homenagem ao Estudante, ao povo paulista ou nenhum dos dois, jamais saberemos. Fica o registro do inusitado uniforme e o relato das fusões - e confusões - na origem do São Paulo Futebol Clube.

Publicação da época mostra outro jogador com o efêmero uniforme

terça-feira, abril 27, 2010

Uma provocação ao ditador Getúlio, há 70 anos

Compartilhe no Twitter
Compartilhe no Facebook

Quando estive no Pacaembu pela primeira vez, em janeiro, nem me lembrei de que o estádio estava prestes a completar 70 anos, o que ocorre hoje. E a comemoração acontece em grande estilo, com o belo time do Santos decidindo o Paulistão em duas partidas no estádio, contra o (ótimo) Santo André. Nem me atrevo a entrar nas histórias épicas do Pacaembu nessas sete décadas, pois isso dá mais que um livro. Anteontem, no bom programa "Grandes Momentos do Esporte", da TV Cultura, Rivellino e o ex-santista Edu relembraram passagens memoráveis de suas carreiras no estádio, com imagens raras.

Mas o que eu gostaria de recuperar nesse post é um fato político ocorrido no dia da inauguração do estádio. Considerado persona non grata no estado de São Paulo, depois de ter sufocado e vencido os paulistas na revolta "constitucionalista" de 1932, o presidente da República na época, Getúlio Vargas (levado ao poder por um golpe militar em 1930 e confirmado como ditador por novo golpe, em 1937), evitava ao máximo confrontar seus desafetos. Para se ter uma ideia da hostilização, a cidade de São Paulo é, talvez, a única capital de estado brasileira que não possui uma grande avenida ou um local importante batizado com o nome de Vargas. Mas o presidente não podia se ausentar da inauguração do Pacaembu e, a contragosto, compareceu (foto à direita).

Como ocorre em toda ditadura, seria impensável que a população vaiasse ou fizesse qualquer gesto ofensivo ao ditador - o que poderia resultar em prisões, pancadaria e até mortes. Getúlio Vargas saudou a multidão sob um silêncio forçado. Porém, a criatividade do povo deu "um tapa com luva de pelica", como se dizia antigamente, no ditador: quando a delegação do São Paulo Futebol Clube deu a volta na pista de atletismo (foto abaixo), a multidão esqueceu o futebol e, numa nítida manifestação de orgulho pelo nome de seu estado e de sua capital, aplaudiu de pé e aos gritos. Consta que Vargas entendeu a provocação, pois as pessoas berravam "São Paulo! São Paulo!" e olhavam em direção à bancada presidencial, mas permaneceu sério e não esboçou reação. Nenhuma delegação de outro clube, naquele dia, foi saudada dessa forma. Um belo exemplo de como, às vezes, a política consegue superar todos os ódios futebolísticos em torno de uma causa comum. Ah, e esta passagem deu origem ao apelido de "o mais querido" para o time do São Paulo.