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quarta-feira, abril 09, 2014

A origem do '171'

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O 2º volume escrito por Lira Neto
Lendo "Getúlio 1930-1945 - Do governo provisório à ditadura do Estado Novo", segundo dos três volumes biográficos de Vargas escrito pelo cearense Lira Neto (foto à direita), me deparei com uma curiosa "segunda explicação" para a nossa tradicional gíria "171", usada geralmente para designar alguma "enganação". A primeira explicação, e mais conhecida, é o fato de 171 ser o artigo do Código Penal que trata sobre estelionato (ou seja, crime de falsidade - ou "enganação"). O Código, válido ainda hoje, foi criado em 1940 e entrou em vigência em 1942. Porém, pode ser que o tal 171 da nossa gíria venha de outra legislação, anterior a essa: a Constituição Federal promulgada por Getúlio Vargas em novembro de 1937 e apelidada de "Polaca", por ter sido baseada na constituição autoritária vigente, à época, na Polônia. Diz o livro de Lira Neto (o grifo é nosso):

A 'Polaca', Constituição de 1937
"Se o artigo 78 da Polaca fosse levado em consideração, aquele 10 de novembro de 1943 seria o último dia de Getúlio no [Palácio do] Catete. A legislação em vigor previa que o mandato do presidente da República - que recomeçara a ser contado em 1937, com a instauração do Estado Novo - era de seis anos. Teria chegado a hora, portanto, de passar a faixa presidencial ao sucessor. Mas o artigo 171 da mesma Constituição estabelecia que, na vigência do estado de guerra, o presidente tinha a prerrogativa de suspender qualquer trecho da Carta Magna. Como o Brasil se encontrava oficialmente em luta contra o Eixo [na Segunda Guerra Mundial], Getúlio tornou sem validade o artigo que determinava a extensão de seu mandato e, sem ferir as regras estabelecidas, voltou a dilatar o próprio período de governo, que já se estendia por treze anos, iniciados em 1930."

Portanto, se em 1937 alguém atentou para a previsão de troca presidencial dali a seis anos (e não observou o tal artigo 171), deve ter se sentido ludibriado em novembro de 1943 - e essa "enganação" pode ter sido fixada no imaginário popular. O que poderia nos levar a crer que, antes de uma origem policial, a gíria "171" teria, na verdade, gênese política. Afinal, o cancelamento do fim mandato presidencial em 1943 não poderia ser considerado, em termos institucionais, uma espécie de "estelionato"? Pois é: mais uma engenhosa manobra política desse que passaria para a História como um "171" clássico e inveterado: Getúlio Vargas.

quarta-feira, março 09, 2011

Lacerda virou 'Corvo' no velório de um manguaça

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Carlos Lacerda (1914-1977) foi jornalista e político de destaque entre as décadas de 1930 e 1960, quando chegou a governar o extinto Estado da Guanabara e, não fosse o golpe militar de 1964 (que ele próprio apoiou e insuflou), teria grandes chances nas eleições presidenciais do ano seguinte. No jornalismo, acabou criando no Brasil um tipo de atuação que ainda hoje presenciamos e lamentamos, de total falta de escrúpulos e da falta de cerimônias em difamar, caluniar, distorcer, mentir e insuflar a população contra regimes democraticamente constituídos. Sua campanha virulenta contra Getúlio Vargas no jornal Tribuna da Imprensa fez com que sofresse um atentado à mando do capanga presidencial, Gregório Fortunato, o que aceleraria a crise política e desembocaria no suicídio de Vargas, na tentativa de golpe para impedir a posse de Juscelino Kubitschek após as eleições de 1955, na renúncia de Jânio Quadros em 1961, no golpe do parlamentarismo contra João Goulart e, finalmente, na ditadura militar que assolou o país por mais de 20 anos.

Por tudo isso, Lacerda ganhou o apelido de "Corvo", alusão à sua figura sinistra que sobrevoava ameaçadoramente o panorama político do país naqueles tempos (como na charge à esquerda). Mas a história por trás desse apelido tem uma curiodade jornalística - e "cachacística", por assim dizer. No conturbado ano de 1954, que culminaria na tragédia do suicídio de Getúlio Vargas, em 24 de agosto, uma outra morte causou comoção nacional. O livro "Histórias de um repórter" (Editora Record, 1988), do excepcional - e já falecido - jornalista cearense Edmar Morel, recorda o desenrolar daqueles acontecimentos no Rio de Janeiro, então capital federal: "O repórter Nestor Moreira, de A Noite, em seu natural estado de embriaguez, teve uma discussão com um motorista de táxi. Ambos foram parar no 2º Distrito Policial, em Copacabana. Horas depois, Nestor se internou no Hospital Miguel Couto, entre a vida e a morte. O que acontecera?".

Prossegue o livro: "Estava apurando o assunto na delegacia quando um preso me confidenciou: 'Foi o Coice de Mula'. Consegui penetrar no hospital e tive a sorte de encontrar Nestor Moreira num momento de lucidez. O moribundo confirmou. Estourava o escândalo, que ganhou todos os jornais. 'Coice de Mula' era o sugestivo apelido do policial Paulo Peixoto, que agredira o jornalista a pontapés, causando grave hemorragia. Nestor Moreira morreu a 22 de maio em consequência dos ferimentos, causando comoção nacional. O enterro foi uma verdadeira consagração. Mais de duzentas mil pessoas acompanharam o cortejo". E, segundo o livro escrito por Morel, foi justamente nessa ocasião que Carlos Lacerda ganhou seu apelido indesejado, criado por outro jornalista presente ao velório, seu ferrenho inimigo Samuel Wainer (foto acima), dono do jornal getulista Última Hora.

No livro de memórias "Minha razão de viver" (Editora Record, 1988), Wainer relembrou o episódio: "Lacerda estava vestido de preto dos pés à cabeça, aspecto solene, rosto compungido, ar sofredor. Era o retrato da revolta humana à violência cometida contra um humilde jornalista, vítima da arbitrariedade política. Quando vi a cena, senti-me enjoado. '-Vou embora', disse a Octávio Malta. 'Não aguento ver a cara desse corvo na minha frente'. Sempre que ocorria alguma morte interessante, lá estava Carlos Lacerda. Era um corvo". "Nesse momento", relatou Edmar Morel, "surgia o apelido de 'Corvo', que passaria a ser largamente usado pelos inimigos de Lacerda". E foi assim, no enterro de um jornalista cachaceiro (pleonasmo), que um das figuras mais nefastas do jornalismo e da política no Brasil ganhou sua alcunha definitiva. Infelizmente, porém, seu estilo carniceiro e mau caráter de fazer "jornalismo" ainda é praticado em alguns dos "grandes" jornais e revistas do país...

quinta-feira, novembro 04, 2010

A saudação dos canalhas

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Relendo a saga "O tempo e o vento", de Érico Veríssimo (uma edição do Círculo do Livro, de 1982), atentei para uma fala do personagem Rodrigo Terra Cambará, bisneto de "um certo capitão Rodrigo" e que torna-se um político corrupto da "côrte gaúcha" no primeiro governo de Getúlio Vargas, entre 1930 e 1945. Quando o presidente é deposto, ele volta às pressas para a imaginária cidade de Santa Fé, onde convalesce de um ataque cardíaco. Uma de suas amantes, Sônia, está hospedada num hotel e o político canalha pede ao amigo e alcoviteiro Neco que leve um bilhete dele para ela (o grifo é nosso):

Dobrou o papel, meteu-o num envelope e, sorrindo, entregou-o ao barbeiro:
- Capitão Neco, aqui está a mensagem. Veja se consegue passar as linhas inimigas... Se for preso, engula a carta. Viva o Brasil!


E eis que, para minha surpresa, o discurso do candidato José Serra, do PSDB (foto), após a confirmação de sua derrota nas eleições de 31 de outubro, terminou da seguinte forma (com novo grifo nosso):

- Por isso a minha mensagem de despedida nesse momento não é um adeus, mas um até logo. A luta continua. Viva o Brasil!

Coincidência?

terça-feira, abril 27, 2010

Uma provocação ao ditador Getúlio, há 70 anos

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Quando estive no Pacaembu pela primeira vez, em janeiro, nem me lembrei de que o estádio estava prestes a completar 70 anos, o que ocorre hoje. E a comemoração acontece em grande estilo, com o belo time do Santos decidindo o Paulistão em duas partidas no estádio, contra o (ótimo) Santo André. Nem me atrevo a entrar nas histórias épicas do Pacaembu nessas sete décadas, pois isso dá mais que um livro. Anteontem, no bom programa "Grandes Momentos do Esporte", da TV Cultura, Rivellino e o ex-santista Edu relembraram passagens memoráveis de suas carreiras no estádio, com imagens raras.

Mas o que eu gostaria de recuperar nesse post é um fato político ocorrido no dia da inauguração do estádio. Considerado persona non grata no estado de São Paulo, depois de ter sufocado e vencido os paulistas na revolta "constitucionalista" de 1932, o presidente da República na época, Getúlio Vargas (levado ao poder por um golpe militar em 1930 e confirmado como ditador por novo golpe, em 1937), evitava ao máximo confrontar seus desafetos. Para se ter uma ideia da hostilização, a cidade de São Paulo é, talvez, a única capital de estado brasileira que não possui uma grande avenida ou um local importante batizado com o nome de Vargas. Mas o presidente não podia se ausentar da inauguração do Pacaembu e, a contragosto, compareceu (foto à direita).

Como ocorre em toda ditadura, seria impensável que a população vaiasse ou fizesse qualquer gesto ofensivo ao ditador - o que poderia resultar em prisões, pancadaria e até mortes. Getúlio Vargas saudou a multidão sob um silêncio forçado. Porém, a criatividade do povo deu "um tapa com luva de pelica", como se dizia antigamente, no ditador: quando a delegação do São Paulo Futebol Clube deu a volta na pista de atletismo (foto abaixo), a multidão esqueceu o futebol e, numa nítida manifestação de orgulho pelo nome de seu estado e de sua capital, aplaudiu de pé e aos gritos. Consta que Vargas entendeu a provocação, pois as pessoas berravam "São Paulo! São Paulo!" e olhavam em direção à bancada presidencial, mas permaneceu sério e não esboçou reação. Nenhuma delegação de outro clube, naquele dia, foi saudada dessa forma. Um belo exemplo de como, às vezes, a política consegue superar todos os ódios futebolísticos em torno de uma causa comum. Ah, e esta passagem deu origem ao apelido de "o mais querido" para o time do São Paulo.

domingo, setembro 28, 2008

Rima fácil

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Vi há pouco um programa sobre o jornalista, escritor, compositor, produtor musical e pesquisador carioca Sérgio Cabral (foto), pai do atual governador do Rio de Janeiro. A certa altura, o jornalista Fernando Barbosa Lima (falecido no início deste mês) lembrou de quando convidou Sérgio para participar do mitológico programa Abertura (TV Tupi), no início da década de 1970. Daí, o próprio Cabral apareceu contando um de seus momentos de maior provocação naquela época:

- Levei o Pandeirinho da Mangueira ao programa e ele cantou uma música que falava do Getúlio Vargas. Nisso, eu disse para os telespectadores que Vargas era o presidente que talvez tivesse mais músicas falando dele. E disse que isso acontecia porque ele era muito popular. Aí perguntei se alguém conhecia alguma música sobre Médici. Até reconheci, na hora, que era difícil achar rima para Médici. Mas para Garrastazú era muito fácil...

sexta-feira, março 28, 2008

Aranhas e caranguejos

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O camarada Mouzar Benedito, que já colaborou no Futepoca com uma prodigiosa receita ou método de produção de cachaça de abacaxi usado por presos políticos brasileiros, publicou outro dia um livro muito interessante. É um romance situado na virada dos anos 1920 para os 30, na Vila Nova de Resende, localidade de Minas Gerais onde o autor viria a nascer uns tantos anos depois.

O título meio esquisito, O tropeiro que não era aranha nem caranguejo (editora Limiar), é desvendado logo no início: aranhas e caranguejos eram duas facções de um mesmo partido, o Republicano Mineiro, e constituíam os dois pólos de oposição no vilarejo. O tropeiro Marcelino, que conduz a narrativa, tenta entender aquele jogo político em que cada hora um assumia o discurso do outro, se dizendo "conservador" ou "revoltoso" conforme a situação. Isso tudo em meio às disputas do final da "política do café com leite", o golpe que impediu a posse do presidente paulista Júlio Prestes e colocou Getúlio Vargas no poder, e finalmente a chamada Revolução Constitucionalista, que para a surpresa do tropeiro uniu aranhas e caranguejos na luta contra os paulistas.

É um livro pra ler em uma tarde, de linguagem simples e direta, como quem acompanha um causo. Se eu conhecesse alguém que vai prestar vestibular, presenteava com esse livrinho, que é daqueles que organizam e ajudam a fixar o conhecimento de história do Brasil, sem esforço e com prazer.