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sábado, dezembro 28, 2013

A Moralidade, o Direito e a Portuguesa

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O operador do direito não pode objetivar a aplicação fria da Lei, desvinculando-se dos fatores externos que rodeiam a questão que se decide

Por Dimas Ramalho e Flavio Barbarulo Borgheresi



“E aí repousa, ao mesmo tempo, a força e a fragilidade da moralidade em face do direito. É possível implantar um direito à margem ou até contra a exigência moral de justiça. Aí está a fragilidade. Mas é impossível evitar-lhe a manifesta percepção da injustiça e a consequente perda de sentido. Aí está a força.” (Tércio Sampaio Ferraz Jr.)

Ainda nas primeiras aulas de direito, nos é ensinado que direito, moral e justiça, embora intrinsecamente ligados, eram conceitos distintos. A aplicação fria do direito traz sempre uma justiça formal, que não se prende ao senso comum, e não necessariamente responde aos anseios da sociedade que representa. Mas qual o sentido do direito para uma sociedade quando sua aplicação é questionada sob o enfoque da moralidade, despertando incandescente sentimento de injustiça?

O recente julgamento da equipe de futebol da Portuguesa pelo STJD, num país que respira futebol 24 horas por dia, trouxe à tona essa discussão, expondo claramente até para os cidadãos mais simples, a diferença entre os conceitos de direito, justiça e moral. Óbvio, o que se discute aqui é sentimento, e o sentimento de justiça moral não depende de qualquer conhecimento técnico.

O operador do direito não pode objetivar a aplicação fria da Lei, desvinculando-se dos fatores externos que rodeiam a questão que se decide. Se assim fosse, poderíamos criar programas de computador que elaborassem sentenças judiciais a partir do mero processamento dos dados sobre o caso concreto. A figura humana é imprescindível na aplicação do direito exatamente porque ele é indissociável do sentimento social, do sentimento moral, do sentimento de justiça. Portanto, a aplicação da norma não pode estar desvinculada desta percepção ética instintiva.

E vamos ao caso concreto. Não há dúvidas que a Portuguesa desconhecia o resultado do julgamento que puniu um de seus jogadores com suspensão por duas partidas. O advogado, indicado pela própria CBF, confirmou o equívoco ao passar a informação para a equipe, e o site da CBF não disponibilizou a informação em tempo hábil. Além disso, não é crível que um time de futebol profissional, estando ciente da punição, colocasse em campo um jogador suspenso pelo STJD, aos 30 e poucos minutos da etapa final de uma partida que já não tinha importância nenhuma para a equipe. Não, não é piada de português!

No futebol o jogo é jogado, essa é a regra. Nem mesmo erros de arbitragem, por mais escandalosos que sejam, interferem no resultado das partidas.

Ora, se a escalação irregular – mas não dolosa – do jogador em nada interferiu no resultado da partida, porque a aplicação fria da norma pode interferir no resultado do campeonato inteiro?

O julgamento do recurso nesta sexta feira pelo pleno do STJD, mantendo a decisão que decretou o rebaixamento da Portuguesa, reacendeu discussão sobre o significado da Justiça.

Com o devido respeito a opinião dos demais juristas envolvidos, esse negócio de “regras claras não precisam de interpretação” não serve de argumento para o bom direito. Diante de um caso concreto a solução nunca está apenas nos artigos da Lei, mas no que se espera dela, já que a aplicação do direito não pode ser um fim em si mesmo, porque o direito sem justiça moral é um direito sem sentido, “um direito cínico”.

Dimas Ramalho, foi promotor de justiça, Deputado Federal e atualmente é Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado.
Flavio Barbarulo Borgheresi, é procurador do município de São Paulo.

(Artigo recebido via e-mail)