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sexta-feira, julho 16, 2010

Votar no PT é pecado

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Houve um tempo em que políticos da direita acusavam padres de fazer propaganda em prol de candidatos petistas. O partido, nascido com muitos participantes das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), tinha simpatia do literal baixo clero e também de alguns bispos que conjugavam de ideais semelhantes aos da agremiação.

De lá pra cá, o PT mudou, mas a Igreja, sob a batuta do célebre João Paulo II, promoveu um processo de "direitização" na América Latina que sufocou, por exemplo, a Teologia da Libertação. Talvez reflexo dessa nova realidade, hoje o padre Luiz Carlos Lodi da Cruz, de Anápolis, se sente à vontade para publicar na internet uma página que tem o seguinte título: Posso votar no PT?

Por meio de um didático texto de perguntas e respostas feitas por ele mesmo, a "orientação" expressa e dita com todas as letras é: "Se o cristão vota no PT consciente de tudo quanto foi dito acima, comete pecado grave, porque coopera conscientemente com um pecado grave." O pecado grave em questão é o apoio à descriminalização do aborto.

Mas há políticos de outros partidos e também não filiados a quaisquer agremiações que são favoráveis ao aborto, correto? Sim, e na pergunta 7 o religioso trata do tema: "Mas eu conheço abortistas que pertencem a outros partidos, como o PSDB, o PMDB, o DEM...". E a resposta: "Os políticos que pertencem a esses partidos podem ser abortistas por opção própria, mas não por obrigação partidária. Ao contrário, todo político filiado ao PT está comprometido com o aborto". E emenda que "é dever do político pró-vida desfiliar-se do PT, após ter verificado o engano cometido."

O padre não está sozinho em sua cruzada moral. O site Aborto Não PT Não  lista uma série de notícias relacionadas ao agrupamento de Lula e o aborto. E ressalta, para deixar claro o quão maligno é o partido, que "a defesa do aborto não é o único mal do PT".

Entre o material de divulgação do site está um banner Aborto Não Dilma Não. É bom lembrar que no programa Roda Viva a petista não foi além da defesa da atual legislação sobre o tema, que permite o aborto em caso de risco de vida da mãe ou estupro, para desconforto de feministas que gostariam de um compromisso mais firme de Dilma em favor da descriminalização. “Temos uma legislação no Brasil sobre essa questão e sou a favor de mantê-la. O que acho é que mulheres enquadradas naquela situação têm direito de fazer na rede pública, e se tem de tornar isso acessível. Senão fica a seguinte situação: mulheres ricas têm acesso a clínicas, mulheres pobres usam a agulha de tricô”, disse ela na ocasião.

Ao que parece, o PT precisa ser um pouco mais incisivo no tema para fazer jus a toda satanização promovida pelos religiosos...

3 comentários:

Anselmo disse...

Em uma entrevista à Marie Claire em abril de 2009, Dilma foi bem mais explícita:


"MC Uma das bandeiras da Marie Claire é defender a legalização do aborto. Fizemos uma pesquisa com leitoras e 60% delas se posicionaram favoravelmente, mesmo o aborto não sendo uma escolha fácil. O que a senhora pensa sobre isso?
DR Abortar não é fácil pra mulher alguma. Duvido que alguém se sinta confortável em fazer um aborto. Agora, isso não pode ser justificativa para que não haja a legalização. O aborto é uma questão de saúde pública. Há uma quantidade enorme de mulheres brasileiras que morre porque tenta abortar em condições precárias. Se a gente tratar o assunto de forma séria e respeitosa, evitará toda sorte de preconceitos. Essa é uma questão grave que causa muitos mal-entendidos." (grifo meu)

Como candidata, ela fala sobre o que faria como presidente. Pelas declarações, o recado é claro: não seria por iniciativa de um eventual governo Dilma que os movimentos de mulheres vão conseguir conquistar essa reivindicação. Claro que o Congresso poderia pautar e aprovar por conta própria, mas isso é bem pouco provável.

A Marina é pessoalmente contra, já defendeu plebiscito mas prometeu que trataria essas questões como tema de Estado, de saúde pública se for o caso...

Já o Lula é contra.

Glauco disse...

Ô, Anselmo, no link do Lula que você colocou ele diz "Ninguém faz aborto porque quer. É preciso orientar as pessoas para que não ocorra a gravidez imprevista. Quanto mais bem informadas, menor será o risco.

Além disso, é preciso melhorar cada vez mais o sistema de saúde pública para que as mulheres pobres sejam tratadas adequadamente e não coloquem a sua vida em risco."

Ou seja, a posição dele (em 2006) é semelhante à expressa pela Dilma agora. Não dá pra dizer que ele é "contra" e pronto como é a Marina Silva ou como é a Heloísa Helena, por exemplo.

Em 2009, ele falou:

"Como chefe de Estado tenho de tratar o aborto como questão de saúde pública. Como cristão, eu sou contra". Ou seja, os anti-abortistas podem demonizá-lo por sua hesitação diante da "danação"...

Hugo Albuquerque disse...

Curioso, nisso tudo, é a questão de fundo: Como a Igreja vê a questão da vida por um aspecto formal: Trata-se apenas e tão somente da duração da existência, não da realização do ser durante sua existência. Um erro lógico evidente que vai além e atribui equivocadamente o início dessa vida-mera-duração no momento errado. Um erro que piora ao não aceitar as leis civis e o próprio Estado Laico - sim, a Igreja tem todo direito de estabelecer regras e princípios anti-aborto, mas suas sanções não podem desconsiderar que quem detém o monopólio da força é o Estado. Isso, aparentemente, incomoda a Igreja que fala contra e move parlamentares para aprovarem/vetarem leis de seu interesse e que renegam a pluralidade da sociedade (e reside, no fundo, o ranço contra o laicismo e a impossibilidade dela dar a última palavra ou a autonomia para acender as tochas). O PT acaba sendo alvo desse ódio como Cristina Kirchner o é na Argentina - por conta do matrimônio gay - ou como também é o PRD no México por conta de suas resoluções pró-aborto. Triste isso.