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quinta-feira, fevereiro 05, 2009

Momentos históricos (re)vividos

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Quando se vive um momento histórico, é quase inevitável sentir o peso de cada gesto, a força de cada imagem, e aquilo cria um vinco indelével no curso do tempo, um marco ao qual se vai retornar sempre. É o que contam os que viveram os episódios de 68, por exemplo. Lembro também que no dia 12 de setembro de 2001 já se falava no 11 de Setembro.

Assim também foram os inesquecíveis anos 80, com toda a sua profusão cultural, em particular na música pop. Quando Oswaldo Montenegro cantava "Condor", com seus versos fortes e sonhadores, numa voz cheia de arestas, com deslizes desafinados de emoção e acompanhado de um coro negro ad hoc, quem não percebia que se lembraria daqueles momentos por muito, muito tempo?

Ontem, Glauco e eu resolvemos puxar na memória coletiva (Google) alguns dos maiores clássicos desses anos 80 que formaram a nossa geração. Aliás, se os anos 80 servem para alguma coisa é para manter viva na memória a chacota universal. Novas décadas virão, mas duvido que alguma renda tanto. Em busca do melhor do pior da poesia pop nacional, fizemos uma única restrição, considerado-os hors concours de saída: os Engenheiros do Hawaii. Seria fácil demais.

Mas outros gaúchos vieram liderando as lembranças, tabelando Kleiton e Kledir com a clássica dobradinha "Quando eu ando assim meio down / vou pra Porto e, bah!, tri-legal!" e fazendo a assistência mortal para Nenhum de Nós com "O astronauta de mármore". Mas o hoje esquecido Dalto mostra que dá pra chegar muito mais longe no sentimento... Ainda que não tanto quanto o inigualável Fábio Júnior que, com um dos mais belos versos da música brasileira, define — como ninguém mais antes enm depois — nada menos que a felicidade: "uma gota d'água descobrindo que é o mar azul" (não percam esse clipe-slide-show assinado por Gislaine Borba).

Precursor de várias gerações de boyzinhos brasileiros que foram viver amores fugazes nas vibrantes e loucas metrópoles europeias, o já então surpreendente Supla chega com sua "Garota de Berlim". Mas às vezes as viagens mais distantes são feitas na própria alma, em perigosas egotrips. E Guilherme Arantes nos saúda com "Um dia, um adeus".

Dá pra passar uma vida revivendo os 80. Mas um mestre maior nos levou aos 90, mostrando-se a síntese antropofágica de todo esse movimento artístico misturado com a tradição cearense das canções de duplo sentido: ninguém menos que Falcão. A crônica social, psicanálise, teoria do conhecimento, releitura do folclore, poesia lírica, nada escapou à verve do gênio.

Com a ajuda do camarada Paulo Macari (que já me indicou um furo do (então) são-paulino Adriano com o (talvez já) come-traveco Ronaldo), recuperei esta foto, tirada num circo em Maceió, nos idos de 1994 ou 95... O Macari é naturalmente o autor da(s) foto(s).



A cara vermelha não nega, mas não consigo nem calcular quanto eu já tinha bebido naquele momento. Na viagem, basicamente eu bebia e circulava de praia em praia, na bela Maceió. Mesmo assim, lembro como se fosse hoje. O circo pegou fogo. Falcão entrou com seus trajes cuidadosamente escolhidos, o girassol na lapela e uma banda que parecia mesmo uma charanga. O mestre cearense empunhava as mãos em chifres, como um metaleiro, e bradando ao povo com sua voz potente e calma: "ô seus cornudo, é tudo corno", arrancando gargalhadas de outros bêbados.

É, mais engraçado que tudo isso, só mesmo o frangaço do Rogério Ceni, que interrompeu nossas investigações com mais um gesto histórico... e depois o cara de pau (sem trocadalho) pede pra sair... é ridículo. Sentiu uma "velha lesão", dá pra imaginar onde... Hahahahah

segunda-feira, setembro 22, 2008

Som na caixa, manguaça! - Volume 25

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Os melhores músicos sobem ao palco, os melhores músicos tocam num bar
(Oswaldo Montenegro)

Que canção se cantar num bar?
Pra quê?
Calendário sem data o bar
Me olhando assim tonto
Esperando a primeira emoção nascer
Gritar pra ir pro tombadilho
Em busca de ar puro
Me ama que eu juro que 'inda sei amar
Como amam nas catedrais
Os reis que não sabem cantar
E vós sabeis o que é ter a voz
E não ter mais a sensatez
De estar no momento propício
O ofício na voz é trazer benefício ao hospício de Deus
Que cantava entre as canções de adeus
Misturava talvez os sons
Dos seus com os nossos perdões
Me perdoa e não diz a Zeus
Que nós já não temos o Olimpo
E o nosso tesouro é garimpo sem ouro
E o coro de um bar
É a reza com fé sem Deus

(Do CD "Mulungo", Som Livre, 1992)

sexta-feira, agosto 29, 2008

Raul Seixas enfiou o AI-5 na Jovem Guarda

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Outro dia eu tava assistindo o programa "Letras brasileiras", comandado pelos músicos Roberto Menescal e Oswaldo Montenegro no Canal Brasil, e o tema era Jovem Guarda. Convidaram o Jerry Adriani (foto à direita) e, ao som de três violões, relembraram sucessos do iê-iê-iê brasileiro dos anos 1960. Lá pelas tantas, o papo entre eles enveredou pela mítica alienação das letras da Jovem Guarda, que nada falavam de política. Foi aí que Adriani contou um causo fantástico envolvendo ele e o Raul Seixas. Mas vamos começar do começo: na metade daquela década, a polêmica cantora Nara Leão, que já havia desagradado o pessoal da Bossa Nova ao abraçar o samba de morro, resolveu chatear mais ainda ao engatar um namoro com o galã suburbano Jerry Adriani.

Para completar a salada, ela fez uma viagem à Bahia e descobriu a anônima Maria Bethânia (e não hesitou em indicá-la como sua substituta no show "Opinião", dando o pontapé inicial na carreira da menina). Mas, ainda em Salvador, outro desconhecido interessante chamou a atenção de Nara: Raul Santos Seixas, 20 anos. Na volta ao Rio, ela falou tão bem do rapaz para o namorado Jerry que este, numa excursão à Bahia, contratou Raulzito e sua banda Os Panteras (foto acima) para ser seu conjunto de palco. Mais tarde, Raul começou a compor e oferecer músicas para Jerry, como "Tarde demais" e "Tudo que é bom dura pouco". Mas o grande sucesso dos dois seria "Doce, doce amor", parceria de Raul Seixas com Mauro Motta. É uma das musiquinhas melosas mais emblemáticas da Jovem Guarda, com o refrão "Doce, doce amor/ Onde tens andado?/ Diga, por favor/ Doce, doce amor".

Seria um exemplo perfeito do nível de alienação do iê-iê-iê do qual Menescal e Montenegro falavam, mas Adriani decidiu contestar. Segundo ele, Raul, já interessado em política, ficou prostrado com o AI-5 (Ato Instititucional nº 5), decretado em 13 de dezembro de 1968 (à direita), que extinguiu garantias dos brasileiros. Naquela semana, ele estava tentando botar letra numa melodia que havia feito - e que viria a ser "Doce, doce amor". E, sem entender muito bem o pretexto que os militares haviam usado para endurecer o jogo político, Raul lamentou a perda da nossa liberdade logo nos primeiros versos da canção: "Está fazendo uma semana/ Que sem mais nem menos eu perdi você/ Mas não sei determinar ao certo/ Qual foi a razão, meu bem vem me dizer". Pois é, o "doce amor" perdido era, na verdade, a democracia.

Ps.: O livro "Eu não sou cachorro, não", de Paulo César Araújo, fala exatamente dos protestos políticos escondidos nas músicas "bregas" da década de 1970 - supostamente, para os críticos, o nicho principal do som alienado (e alienante) nacional. Um exemplo é a canção "O divórcio", de Luiz Ayrão, lançada em 1977: "Treze anos eu te aturo e não agüento mais / Não há Cristo que suporte e eu não suporto mais". Não por acaso, naquele ano o golpe militar de 1964 completava exatamente treze anos...