Destaques

quarta-feira, outubro 17, 2007

Se "vivo", NP estaria completando 44 anos

Compartilhe no Twitter
Compartilhe no Facebook

Na época em que o Brasil acompanhava o calvário de Tancredo Neves, em 1985, o jornal Notícias Populares torcia para que o presidente escapasse da morte. Para azar da redação, Tancredo morreu após o fechamento da edição. Pior que não poder noticiar a morte do presidente eleito foi o jornal chegar às bancas com uma manchete que mais parecia uma piada de mau gosto. Com Tancredo já no IML, o NP anunciava na primeira página: "Médico americano quer Tancredo mais gelado". Era a tentativa de controlar a hipotermia do paciente – quando este ainda estava vivo, obviamente.
A historinha acima, retirada do site Observatório da Imprensa, é apenas um exemplo de como o extinto jornal Notícias Populares tratava a política - e os políticos. Se estivesse "vivo", o NP teria completado 44 anos na segunda-feira, 15 de outubro. Mas foi fechado pelo Grupo Folha em 20 de janeiro de 2001, junto com a Folha da Tarde (os dois se fundiram no insosso Agora). Recentemente, a Carrenho Editorial lançou a história do NP em livro, "Nada mais que a verdade", escrito por Celso de Campos Jr., Denis Moreira, Giancarlo Lepiani e Maik Rene Lima.
Entre milhares de bizarrices dos 28 anos de NP, a obra resgata manchetes históricas como "Bicha põe rosquinha no seguro", "Aumento de merda na poupança", "Broxa torra o pênis na tomada" e "A morte não usa calcinha", além da antológica série "bebê diabo", invenção que vendeu milhares de jornais em 1975. O jornal também caprichava na cobertura esportiva: em 1977, os torcedores do Corinthians disputavam a autoria da promessa mais absurda para o time vencer o Paulistão e quebrar o jejum de títulos. A pior foi publicada pelo NP em manchete: "Vou comer 23 sapos se o Corinthians ganhar".
Porém, o grande mérito do livro foi resgatar a origem (bizarra) do (bizarro) periódico. Seu mentor foi o jornalista romeno Jean Mellé, que passou 10 anos preso na Sibéria por ordem de Joseph Stalin, fazendo trabalhos forçados nas minas de carvão. Tudo porque, em 1947, soltou em seu jornal Momentul, de Bucareste, a seguinte manchete: "Russos estão roubando o pão do povo". Após ser liberado, Mellé desembarcou no Brasil em 1959 sem falar praticamente nenhuma palavra de português. Mesmo assim, por intermédio de um amigo romeno que estava no Brasil, conseguiu um emprego no Última Hora, de Samuel Wainer.
Menos de quatro anos depois, em associação com Herbert Levy (presidente da UDN e dono da Gazeta Mercantil), lançaria o Notícias Populares, com uma finalidade marcadamente política: o NP seria um vespertino anticomunista. Isso durou até 1965, quando Levy vendeu o jornal para Octávio Frias de Oliveira e Carlos Caldeira Filho, da empresa Folha da Manhã, que edita a Folha de S.Paulo. Mas Mellé permaneceu como editor. Para se ter uma idéia da maluquice do romeno (que delineou o "jeito NP de ser"), ele simplesmente fez "desaparecer" o cantor Roberto Carlos, em 1968.
O rolo foi o seguinte: um diretor da TV Record informou a um repórter que não estava conseguindo contatar o Rei nos Estados Unidos. Por banal que fosse, a história chegou aos ouvidos de Mellé, que soltou a manchete: "Desapareceu Roberto Carlos". No dia seguinte, centenas de tietes cercaram a redação, em busca de notícias sobre o ídolo. Revoltado, um diretor da Record exigiu um desmentido. Impávido, Mellé manchetou, no dia seguinte: "Acharam Roberto Carlos". Nos dois dias, o jornal vendeu 20 mil exemplares a mais.

12 comentários:

Nicolau disse...

Mais que anticomunista,o NP nasce antigetulista, ferrenho opositor do jornal de Wainer. Depois que a UDN passou, ele ficou mais divertido, hehe.

Olavo Soares disse...

O NP era engraçado pra caramba, mas vejo o jornalismo dando um glamour pra ele que não procede. Sensacionalismo é sensacionalismo. Ou se ri de tudo - do NP ao Ratinho - ou se detona tudo.

Prefiro a primeira via, é claro. Mas tem gente que idolatra o NP pra descer a lenha nas "apelações da TV brasileira".

Edu Maretti disse...

Não se pode esquecer que o NP abordou o surgimento da Aids chamando-a simplesmente de "peste gay". O que é um absurdo.

"O rótulo "peste gay" prestou grande ajuda à disseminação do HIV, porque os heterossexuais automaticamente se julgaram imunes à infecção. No início da epidemia, a Aids era considerada por quase todos uma doença exclusiva de "drogados" ou de "homossexuais promíscuos". (Drauzio Varella)

Glauco disse...

Peraí, Edu. Não foi só o NP que taxou a AIDS de "peste gay", mas o próprio Fantástico da Rede Globo e tantos outros veículos quando a doença surgiu, porque era assim que ela era chamada nos EUA. Hoje pode parecer absurdo, à época, não era tanto, já que ela atingia principalmente homossexuais e esse foi o primeiro dado a se saber da doença. Mistura de ignorância, preconceito e mau jornalismo (nada surpreendente). Longe de ser exclusividade do extinto NP.

Edu Maretti disse...

Peraí, Glauco, eu não disse que "foi só o NP que taxou a AIDS de "peste gay"".
Mas as manchetes do NP eram tão ostensivas e sistemáticas, que até mesmo a mim, que na época não lia o jornal e sequer fazia jornalismo, a coisa chamou a atenção. É um registro necessário. Se o Fantástico e outros veículos utilizaram o termo, pior ainda, mas o NP foi um dos que mais explorou isso, de modo, pra mim, sórdido. E tem que se ressaltar que outros veículos não usaram...

Nicolau disse...

Olavo, acho que o glamour é só saudosismo, nostalgia. Bobagem, concordo. Mas já vi gente falar coisa parecida sobre o Aqui e Agora, por exemplo.

Gerson Sicca disse...

Há jornais que tentam imitar o formato, como o diário gaúcho, da RBS, conhecida por fazer um jornalismo de conteúdo zero.
Qto à UDN, essa nunca teve graça nenhuma. Mas o belo post trouxe algumas machetes impagáveis, como essas do roberto carlos e a de que a coisa vai feder para o lado da professora. O cara poderia ser reacionário, mas tinha senso de humor.
Ah, e não esqueçam que dez anos na sibéria preso a mando do stálin garante um descontinho...

Guzz disse...

nunca esqueco a manchete do NP qdo o Ronaldo (fenomeno) anunciou que ia ser pai. estava eu indo pr escola as 7h da manha e tava estampado na cama:

Milene engravida na primeira bimbada.


(ela tinha falado q era virgem.. coisa assim)

um sarro!

Edu Maretti disse...

Aliás, esqueci de dizer (o que o Gerson Sicca registrou) que o post é de fato muito bom, independentemente de discordâncias sobre o tipo de jornalismno do NP.

Glauco disse...

Que outros veículos não usaram, Edu?

Anônimo disse...

pois eu gosto do np, do ratinho e do aqui agora.

pe no saco sao essas campanhas anti/baixaria.

o gente chata

Anônimo disse...

uma coisa que temos aprendido é que os cidadãos em geral superam sua imprensa. não acho que o NP tenha se arrogado a verdade. propunha sim um jogo, de modo q respeitava a inteligência de seus leitores, num trabalho q eu chamaria de literário.