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quinta-feira, março 25, 2010

As desculpas pelo bloqueio da poupança ou como Covas salvou Serra de ser ministro de Collor

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Cristina Gallo/Agência Senado
O senador por Alagoas e ex-presidente da República Fernando Collor de Mello parece hoje aquele veterano que joga mais leve e solto quando não tem a responsabilidade de atuar em uma equipe grande. Depois do período de "quarentena forçada", já que teve seus direitos políticos suspensos por oito anos, o parlamentar, em várias entrevistas, conta detalhes do passado (claro, sua versão dos fatos) e ataca antigos aliados e outros supostos colegas que negam tal condição. Em entrevista concedida aos jornalistas Cezar Motta e Adriano Faria, da Agência Senado, ele descreve episódios interessantes para quem se interessa pela história política do Brasil. Alguns episódios conhecidos, outros, reveladoras. Abaixo, alguns trechos:

Bloqueio da poupança

Eu nunca afirmei isso [que não iria mexer na caderneta de poupança]. Ao contrário, em um dos debates eu disse que o meu adversário é que iria confiscar as poupanças, justamente para evitar que a pergunta me fosse feita. O fato é que, quando todos da minha equipe viram que as contas correntes e a poupança receberam enormes aportes, concluímos que não bastava bloquear os títulos, não seria suficiente. E posso garantir que todos os candidatos tinham a mesma intenção. O PT, o PMDB. Tanto é verdade que, dois dias depois, economistas e políticos do PT paulista, alguns ex-colegas da ministra Zélia na Universidade de São Paulo (USP), a procuraram e disseram: "Era este exatamente o programa que queríamos aplicar. Só que, no nosso caso, o governo cairia no dia seguinte".

(Acima, Collor mostra seu senso de raposa política. Confessa ter posto Lula na parede para não ter que assumir que poderia mexer na poupança. Ou seja, acuse antes de ser acusado)

Fracasso do plano

Não, a população não sabotou. Ao contrário, uma pesquisa logo depois do plano mostrou que tínhamos 67% de aprovação. Erramos em uma série de pequenas coisas, que se tornaram grandes. Por exemplo, na administração da liberação do dinheiro no que chamávamos de "torneiras". Todo dia nos deparávamos com uma surpresa. Nossas reservas cambiais eram atacadas no mercado, e nós precisávamos delas. Muitas frentes estavam abertas, mas a grande resistência veio da Avenida Paulista, como disse, dos grandes industriais e empresários brasileiros, que não gostaram de perder suas reservas de mercado. Em nenhum momento tivemos problemas com sindicatos de trabalhadores ou partidos de oposição, embora o PT já fosse uma oposição forte e ativa. 

Quem sabotou foram os que queriam manter privilégios, aumentar preços e tarifas, a burocracia, os que se envolviam com a Cacex (Câmara de Comércio Exterior do Banco do Brasil, que estabelecia tarifas de importação e exportação). Enfim, era a mesma gente que me apoiou no segundo turno, que defendia a medidas que adotei. Mas logo percebi que defendiam as medidas em relação ao vizinho, mas não aceitavam que fossem adotadas em relação a eles próprios. Tanto que, quando o então presidente da CUT, Jair Meneguelli, foi ao Palácio falar sobre greves e movimentos contra o plano, eu lhe disse: "Não se preocupe, porque vocês, os trabalhadores, não desestabilizam o governo, mesmo com greves. Quem está realmente causando problemas são os seus patrões, os industriais".

(No trecho, Collor tenta se fazer de vítima da elite, discurso comprado por parte de seus ex-eleitores. A outra parte jura de pés juntos que votou nulo ou no Lula no segundo turno de 89... E sobre o apoio ao Plano, é fato. Muita gente não se indignou e, embora possa até ter ficado chateada por ter seu dinheiro bloqueado, só se mexeu de fato quando o Plano começava a fazer água.)

Delfim Netto

Recentemente, por exemplo, o Delfim Netto disse que não foi consultado na época do plano por ninguém da equipe. Realmente, ninguém da equipe o procurou, mas ele esteve comigo. Ele desmente e diz que, convenientemente, escolho só testemunhas já mortas. Mas há as esposas que estavam presentes. Este encontro foi na casa do ex-deputado Amaral Neto, e a d. Ângela, mulher dele, estava lá, um final de tarde, com o então deputado Ricardo Fiúza e o senador Roberto Campos. Eu os consultei sobre a situação da economia, e todos foram unânimes: com essa liquidez, nenhum plano anti-inflação dará certo. Disseram que seria decisiva a escolha do presidente do Banco Central. Era preciso um nome capaz, que o mercado respeitasse. Eu mencionei alguns nomes, e quando citei Ibrahim Eris, Delfim vibrou: "extraordinário nome, extraordinário nome, perfeito!". Já Roberto Campos não gostou: "Esse não pode, Delfim, é um fiscalista, seria um erro".

Logo depois, o Delfim foi ao Planalto, lépido e fagueiro, com aquele cabelo sempre bem penteado, bem barbeado, sorridente, e disse: "genial presidente, genial!! Nem eu com o AI-5 teria condições de fazer isso. Parabéns!" Hoje ele nega o encontro. Mas houve, e dou mais um detalhe da conversa. Ele me perguntou: "Mas esse dinheiro não vai ser devolvido, não é?" E eu respondi: "Sim, vai ser devolvido e com juros". Ele riu e duvidou: "Ah, mas isso eu quero estar vivo pra assistir".Pois o dinheiro foi devolvido e Deus permitiu a ele estar vivo para testemunhar. Ele desmente o encontro, mas explicou que apenas propôs o pagamento em títulos. Ou seja, sem querer, confirmou.


(Delfim que se explique, "nem no AI-5"...)

Acordo com o PSDB


Fechamos o acordo com o presidente do PSDB, o então deputado Franco Montoro, o partido nos apoiaria no Congresso, o Fernando Henrique seria chanceler e o José Serra seria o ministro da Fazenda. Viajei com tudo acertado, e quando voltei soube que o senador Mário Covas havia vetado tudo, anulado o acordo.

(Se o PSDB chegou à presidência, deve ao falecido Covas. Se dependesse dos luminares tucanos...)

terça-feira, março 16, 2010

20 anos do plano que calou os eleitores de Collor

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Aquela foi a festa de aniversário de criança mais desanimada que já presenciei. Eu estava vestido todo de preto, mas com sorriso de orelha a orelha. No dia 16 de março de 1990, a equipe econômica do presidente Fernando Collor de Mello, empossado no dia anterior, anunciava um plano econômico que congelava depósitos do overnight, das contas correntes e das cadernetas de poupança que excedessem a 50 mil cruzados novos, o equivalente, na época, a 1.300 dólares (quase 2.300 reais na cotação atual). Dezenas de milhares de pessoas ficaram sem qualquer dinheiro ou fonte de renda, perderam o que tinham, adoeceram ou simplesmente se mataram. Até a Veja assustou (foto). Ainda hoje não fizeram um levantamento documental mais detalhado da extensão daquele desastre chamado Plano Collor.

Mas basta dizer que, no segundo semestre de 1990, o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro desabaria para -7,8% e, nos dois anos seguintes, a economia perderia 2 milhões de empregos. Muito por causa disso os 35 milhões de eleitores que levaram Collor ao poder não fariam a mínima questão, em 1992, de sair às ruas para defendê-lo quando a sequência da escândalos o levou à renúncia. Uma imagem célebre do engodo que todos os eleitores do Collor se tocaram ter caído foi a inacreditável entrevista da ministra da Fazenda, Zélia Cardoso de Mello, e do presidente do Banco Central, Ibrahim Eris, aos jornalistas Joelmir Betting e Lilian Witte Fibe. Ali ficou nítido que a equipe econômica do governo não fazia a menor ideia do que se tratava o plano que haviam acabado de impor ao país. Desesperador.

Pois então, foi naquele clima de estupefação geral da nação que eu fui com meus pais a uma festinha de criança na Associação do Banco do Brasil (AABB), na cidade onde nasci, em Taquaritinga (SP). Com 16 anos recém completos, eu havia acabado de tirar o título de eleitor e me preparava para votar em Plínio de Arruda Sampaio para governador. Nas eleições de 1989, Collor havia conquistado quase a totalidade de votos locais. Houve só uma passeata, dos colloridos, com metade da cidade. Eu e um amigo subimos no muro da minha casa para agitar uma bandeira do PT e levamos uns cascudos. Meu pai, que tinha um adesivo do Collor no carro, me deu uma sonora bronca. E todo mundo tirou sarro da gente quando o alagoano derrotou Lula.

Mas aí veio aquele 16 de março fatídico. Na festinha, só as crianças brincavam e eu sorria, degustando cerveja. Os convidados, em sua maioria médicos, conservadores e eleitores do Collor, nada falavam. Os semblantes eram de velório. Meu pai não perdeu nada, pois não tinha dinheiro guardado. Mas travou seu discurso político conservador por mais de dez anos. E eu, alertado previamente para não tocar no assunto, só podia sorrir. Mas sorri bastante.

Ps.: Quem também deve ter sorrido naquele dia foi o aniversariante José Dirceu, integrante da coordenação da campanha de Lula em 1989.