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quarta-feira, agosto 06, 2008

Cenas que só vemos no buteco

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Quarta-feira, tempo carregado de chuva e eu traçando uma costela gaúcha no Minhoca's, buteco assim apelidado depois que um anelídeo dessa nomenclatura foi visto boiando na tigela de feijão. De repente, chega ao recinto um casal sobrecarregado de sacolas. Caixas e mais caixas com jogo de panela, ventilador, escorredor de prato, secador de cabelo, rádio-relógio, brinquedos, o escambau. Devem ter aproveitado algum crediário de loja popular para dar um grau no ecossistema doméstico.

- E aí, queridão, o que vai ser? - intima o garçon, mostrando intimidade com o esbaforido chefe de família.

- Manda uma feijoada completa - ordena ele, sério, tentando provar para a esposa que não é habitué no referido buteco.


Mas o garçon destrói a dissimulação com a frase fatídica:

- Posso trazer a gelada de sempre?

A esposa direciona aquele olhar calibre 38, cano longo, para o marido, como que advinhando por telepatia: "-Ah, seu manguaça! É aqui que você deixa metade do pagamento todo mês, não é, cachorro? E depois passa o tempo todo, na loja, reclamando que eu gasto muito!".

Na saia justa, o cônjuge responde ao solícito - mas inconveniente - garçon:

- Não, não, deixa a cerveja pra lá. Tô tomando remédio. Traz um guaraná.

Passa o tempo, feijoada vem, refrigerante vai, o casal faz as pazes comentando a utilidade dos produtos para cada setor do sagrado lar (não tem nada que deixe uma patroa mais feliz do que fazer compras). Meia hora depois, aparece um parente que, como combinado previamente, trouxe a surrada Brasília pra fazer o carreto dos novos bens domésticos. E a mulher aproveita e segue junto, de carona, sorrindo para o bem comportado marido (leia-se: endividado e sóbrio), que pagará a feijoada e voltará ao batente.

Mas não passa nem 10 minutos depois que a esposa sumiu com o parente e aquele mundaréu de sacolas e o cidadão grita para o garçon:

- Agora sim, pode trazer a gelada. Meu remédio já foi embora!

7 comentários:

Glauco disse...

Santo remédio...

Nicolau disse...

Excelente, hahaha!

Anselmo disse...

sei não, mas o dono da brasília era o cunhado.

Maurício Ayer disse...

é verdade, mas cunhado às vezes funciona como agente duplo.
tinha uma empregada que trabalhou aqui em casa, menina nova, casada, adepta da congregação cristã do brasil. sempre convidava eu e minha mulher para um forró, que ela freqüentava quase toda sexta-feira.
um dia, um amigo chileno estava hospedado aqui em casa, resolvemos ir. acabado o expediente, a menina se arrumou e chegaram duas cunhadas. descobrimos então que o marido nunca ia... e a menina aproveitou pra atacar meu amigo durante a balada.
mas no caminho - o forró era na praça 14 bis, na 9 de julho, e tomamos um ônibus que parava longe - fui conversando com a cunhada mais velha que revelou a armação.
o irmão mandava a mulher pra casa da cunhada, e saía pra balada com os amigos (aliás, iam muitas vezes a um samba no bexiga [com o perdão da citação], na av. rui barbosa, a poucas quadras do forró). a mulher teoricamente não sabia, deveria ficar em casa, mas caía no forró com as cunhadas e amigos eventuais.
assim, a cunhada tinha o papel de manter a saúde do casamento, como guardiã da mentira e articuladora das baladas do casal, que só ia junto à igreja.

Thalita disse...

hahahaha.... muito boa, Maurício. Essa cunhada devia ser diplomata!

Glauco disse...

O que a Deus uniu, o homem não separa.

Nicolau disse...

Que beleza de história, Mauríco, engrandece quem a lê!