Destaques

sábado, maio 16, 2009

Em busca do marafo perdido - Capítulo 8

Compartilhe no Twitter
Compartilhe no Facebook

MARCÃO PALHARES

Naquele sábado o programa era certo: filar cerveja de graça, como bicões, na festa de uma aluna do curso de Turismo. A perspectiva da bebedeira deixou os cinco manguaças eufóricos, tanto que, às duas e meia da tarde, já tava todo mundo encachaçado de caipirinha de vodka. Mas tudo tem seu método. Lá pelas quatro horas, cada um tomou um rumo diferente, com a promessa de se encontrarem lá na casa da "vítima", onde haveria a festa. Um dos bêbados preferiu comportar-se. Foi até a casa da namorada, tomou um café amargo, um banho bem demorado e botou uma beca decente. Outros dois ainda tentaram comer alguma coisa numa padaria, mas a iniciativa descambou em mais bebedeira. Teve um que entrou num supermercado e se perdeu. E o último, que tentava atravessar uma pinguela, desabou dentro de um córrego fedorento. Porém, não se sabe como, todos os cinco se encontraram no ponto marcado.

Os primeiros que chegaram foram os da padaria. Eram sete da noite e a festa estava programada para começar às nove. A dona da casa e o namorado dividiam um miojo na cozinha quando, no corredor do jardim, apontaram aquelas duas cabeças cambaleantes. Sem saber o que fazer (e com medo de tentar expulsá-los), a moça abriu uma garrafa de Contini, ligou o som no quintal e deixou os cachaceiros dançando e rindo sozinhos. A dócil anfitriã nem imaginava o que ia virar aquilo... Não deu meia hora e apareceu o que tinha caído no riacho. Desgrenhado, sujo e fedido, ele se uniu aos outros dois no quintal, que já avançavam sobre um litro de Velho Barreiro. Nisso, apareceram alguns convidados "normais" e começaram a incentivar a palhaçada dos bêbados. A dona da festa viu que o problema poderia se tornar uma atração e esqueceu deles. Mas tinha mais: o tal que havia se perdido no supermercado conseguiu chegar, com dois garrafões de Sangue de Boi suave.

Às nove da noite, cerca de 90 pessoas já transbordavam pelos diversos cômodos. A bebedeira coletiva perdeu o controle. O último dos manguaças apareceu com a namorada e se juntou aos companheiros. Ou melhor, tentou se juntar, pois já não havia possibilidade de comunicação. Sozinho, num corredor vazio, um dos pinguços dançava sem música. Um outro estava deitado e roncando atrás da estante da sala. E os dois restantes quebravam objetos, gritavam e babavam casa afora. Vendo que ainda estava muito sóbrio (em relação aos demais), o bêbado despistou a namorada e começou a ingerir o que viu pela frente: pinga com leite e erva de Santa Maria, vinho vagabundo, Cinzano, uísque falso, cerveja quente, enfim, o escambau. À meia-noite, foi rebocado para casa no carro da - infeliz - namorada, vomitando pela janela do veículo, para delírio da platéia. No outro dia, aquele que dormia na sala foi enxotado a vassouradas.

Já o que dançava pelo corredor conseguiu pegar uma carona, desembarcou numa ladeira, levou um tombo e quebrou o pé esquerdo. Foi socorrido por populares até o hospital municipal. Outro bebum, que jazia no jardim da casa, acordou com sol alto e caminhou até achar uma praça. Impossibilitado de parar em pé, cavou um buraco, enterrou sua carteira e dormiu no canteiro público. Sobraram dois: um quase foi atropelado e, com raiva, jogou um tijolo no motorista. Foi preso. E o último, ah, o último... Assim que raiou o dia, saiu andando por uma avenida até que ela se transformou em rodovia. No meio da estrada - ou do nada, mais precisamente - se tocou de que não estava caminhando para a cidade. Parou um carro para pedir informações e descobriu que estava quase chegando no município vizinho. De carona em carona, voltou para trás. Mas, extenuado, resolveu deitar numa rua para descansar. Nisso, um mendigo chegou e lhe ofereceu um gole do que ele pensou ser a redentora água. Era pinga. Mas o morador de rua descolou um passe de ônibus para que ele seguisse jornada.

Os cinco manguaças só voltaram a se reunir, no apartamento que dividiam, três dias depois. E nenhum sabia contar com exatidão o que havia acontecido. Dizem as más línguas que eles se lembravam, sim. Mas preferiam esquecer definitivamente o assunto...


(Continua quando o autor estiver sóbrio o suficiente para escrever)

3 comentários:

Anônimo disse...

Esse marafo perdido ainda vai dar livro...

Maurício Ayer disse...

Sensacional, Marcão!

Essa história tem cada pérola...

Glauco disse...

Até onde a manguaça pode levar uma (s) pessoa (s). Impressionante.