Destaques

Mostrando postagens com marcador biografia. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador biografia. Mostrar todas as postagens

terça-feira, novembro 17, 2015

Parceiro de boemia encaminhou Leônidas ao São Paulo

Compartilhe no Twitter
Compartilhe no Facebook

A biografia de Paulo Machado
Segundo o livro "O marechal da Vitória", de tom Cardoso e Roberto Rockmann (já citado neste post aqui), em março de 1942, o empresário Paulo Machado de Carvalho, um dos proprietários da Rádio Record, estava disposto a reforçar o São Paulo Futebol Clube, do qual era diretor de Esportes, com "um jogador tecnicamente brilhante, experiente, que melhorasse a autoestima dos outros atletas e da torcida". A duas semanas do início do Campeonato Paulista, não havia qualquer atleta com essas características no mercado. Foi então que o "Acaso de Almeida" deu as caras. Conta o livro:

"Paulo Machado chegou desanimado à Rádio Record. (...) Ao notar que o patrão, normalmente de bom humor, estava ansioso, angustiado, o cantor de emboladas Manezinho Araújo decidiu puxar conversa:

- Boa tarde, doutor Paulo, como vai o São Paulo? Pronto para o título?

- Estamos trabalhando para isso, Manezinho.

- Tenho um amigo que adoraria jogar no São Paulo.

- Quem?

- Leônidas da Silva.

Manezinho, o amigo de Leônidas
O cantor pernambucano, e também redator da Record, estava de gozação, pensou Paulo Machado. Leônidas da Silva, "O Diamante Negro", era um dos maiores craques do mundo, artilheiro da Copa de 1938, na França, e estrela maior do futebol do Rio de Janeiro, onde atuavam os melhores jogadores do país. Paulo Machado pensou em encerrar a conversa, mas antes, por curiosidade, quis ver até onde o empregado levaria aquela história:

- É mesmo, Manezinho? O Leônidas sairia do Rio para jogar em São Paulo?

- Sim, doutor Paulo. Ele está sem clube, mas quer jogar, não importa o lugar.

- E o Flamengo?

- Ele não quer jogar nunca mais no Flamengo.

- Quem disse isso?

- No Rio não se fala em outra coisa."

Leônidas da Silva no Flamengo
Como se diz na gíria, "o peixe estava fisgado". Curioso, Paulo Machado de Carvalho descobriu que, em 1941, Leônidas se recusara a viajar com o Flamengo numa excursão à Argentina, alegando que estava machucado. O clube, que receberia cachê menor sem o astro, queria obrigá-lo a jogar, acusando-o de fazer corpo mole porque queria ficar no Brasil para atuar em campanhas publicitárias. Leônidas rompeu com o clube carioca, que, como vingança, recuperou uma acusação antiga para que ele fosse preso: fraude num certificado de reservista para escapar do Exército. Assim, em 25 de julho de 1941, pouco depois de brigar com o Flamengo, o atacante, com o menisco do joelho direito recém-operado (prova de que não mentira ao recusar a excursão), foi detido numa Vila Militar, onde passou oito meses. Liberto em março de 1942, deu uma entrevista a "O Globo Esportivo" afirmando que preferia abandonar o futebol a retornar ao clube da Gávea, que ainda detinha seu passe. Prossegue o livro:

"Desencantado com o futebol, em litígio com o Flamengo, Leônidas havia se isolado e pedia aos empregados que não abrissem a porta para ninguém. (...) A comitiva do São Paulo estava pronta para fazê-lo abandonar o pijama e voltar a jogar. Além de Paulo Machado e [Roberto] Gomes Pedrosa [ex-goleiro e, na época, dirigente do SPFC], desembarcaram no Rio de Janeiro Manezinho Araújo e Raul Duarte, eterno homem de confiança de Paulo Machado. O primeiro [Manezinho] teria a missão de avisar Leônidas do interesse do São Paulo e fazer a proposta milionária. Já Raul Duarte, se tudo desse certo, colaria no craque até a sua chegada à Estação do Norte (depois Estação Roosevelt), no bairro do Brás. Quando chegou ao Rio, Manezinho telefonou:

- Como vai a vida, Leônidas?

- Estou bem aqui, sossegado em meu canto.

- Um pessoal do São Paulo quer vê-lo.

- Diga a eles que não falo mais sobre futebol.

- Eles vão pedir alto para comprar seu passe, Leônidas.

- Não estou à venda, Mané.

- Nem por 200 contos de réis?

- O quê?

- Isso mesmo, 200 contos de réis: 120 para você e 80 para o Flamengo.

- Traga eles aqui. Vamos conversar."

1 conto de réis (Caixa de Conversão, 1907)
O espanto e a imediata mudança de atitude de Leônidas justificam-se: segundo Laurentino Gomes, no livro "1808", um conto de réis (ou 1 milhão de réis) equivaleria, hoje, a cerca de R$ 123 mil (leia sobre isso clicando aqui). Ora, 200 contos seriam, portanto, R$ 24,6 milhões - praticamente o mesmo valor pago pelo São Paulo, 71 anos depois, para tirar o meia Paulo Henrique Ganso do Santos. Caso essa estimativa esteja próxima do que realmente valia em março de 1942, significa que a proposta do São Paulo foi dar algo como R$ 9,8 milhões para o Flamengo e nada menos do que R$ 14,7 milhões para Leônidas da Silva.  Não admira que tanto o clube carioca como o atleta tenham aceito o negócio na hora.

Segundo o livro, "hábil nos bastidores, bom de papo, conciliador, o diretor de esportes [do SPFC, Paulo Machado de Carvalho] foi aos poucos convencendo os conselheiros do clube e empresários ligados ao esporte de que a contratação de Leônidas mudaria para sempre os negócios do futebol em São Paulo". Ou seja: a fortuna gasta teria retorno para todos, pois o negócio do futebol passaria a outro patamar na capital paulista, multiplicando os lucros com rendas e transmissões radiofônicas das partidas, propagandas nos estádios e nas emissoras, incremento do comércio (e da indústria) etc etc. O espetáculo de massa da chegada de Leônidas a São Paulo confirmou que a aposta era certeira:

"O bacteriologista Alexander Fleming levou um susto ao desembarcar no bairro do Brás, em São Paulo, no dia 10 de abril de 1942, onde dez mil pessoas se espremiam em frente à Estação do Norte. Famoso no mundo inteiro por ter descoberto a penicilina, o primeiro antibiótico moderno, o médico escocês não esperava ser recebido com tanta atenção e carinho pelo povo paulista. Mas Alexander Fleming caminhou despercebido entre a multidão. [Ao contrário do que pensava,] Todos estavam ali para ver de perto o homem negro que sentara ao seu lado na primeira classe: Leônidas da Silva".

Multidão carrega Leônidas nos braços em sua chegada a São Paulo (10 de abril de 1942)

Apesar de não ter ganho o Campeonato Paulista daquele ano de 1942, o São Paulo, com Leônidas da Silva, conquistaria cinco títulos estaduais em oito anos, alcançando o mesmo status de Corinthians e Palmeiras e transformando-se num dos grandes esquadrões brasileiros dos anos 1940. Com o apelido de "Rolo Compressor", na segunda metade daquela década, o Tricolor só encontrava concorrência nos timaços do Internacional-RS e do Vasco da Gama. Infelizmente, para Leônidas, a Segunda Guerra Mundial fez com que as Copas de 1942 e 1946 não fossem disputadas e, em 1950, ele já estava abandonando o futebol, aos 36 anos. Mas Paulo Machado de Carvalho colheu todos os méritos por ter apostado no veterano jogador e, em 1958, coordenaria a seleção brasileira que traria nosso primeiro título mundial, na Suécia, consagrando-se eternamente como o "Marechal da Vitória".

Paulo Machado (em pé, à esquerda) e Leônidas (centro, agachado): bi paulista em 1946

Fica a dúvida, que a biografia de Paulo Machado não soluciona: será que, com tanto dinheiro envolvido, Leônidas ou o São Paulo recompensaram Manezinho de Araújo? O mais provável é que o cantor, compositor, jornalista e pintor nordestino tenha sido levado pelo colega jogador para comemorarem em longas noitadas de boemia. Curioso é que Manuel Pereira de Araújo, o Manezinho, nasceu em Cabo de Santo Agostinho em 27 de setembro de 1913, exatamente 21 dias depois de Leônidas vir ao mundo, no Rio. Empregado das rádios Mayrink Veiga e Philips a partir de 1933,  na capital fluminense (e, então, do Brasil), Manezinho gravou discos e atuou no cinema sempre interpretando emboladas de sua autoria. Atuou também como jornalista no rádio e na mídia impressa e foi um dos primeiros artistas a trabalhar na recém-criada televisão brasileira. Em 1954, decidiu abandonar a vida artística. Depois disso, dedicou-se a um restaurante de comida típica nordestina e, mais tarde, à pintura. Aqui, uma de suas raras reaparições, no filme "Amor para três", de 1960:





quinta-feira, novembro 12, 2015

Alex, na Copa de 2002, esteve 'bêbado ou dormindo'

Compartilhe no Twitter
Compartilhe no Facebook

Alex não ganhou a amarelinha de Felipão
Assim como Ciro Gomes, ao romper com o PSDB, passou um tempo nos Estados Unidos em que apenas "enchia a cara de saquê, ouvindo Marisa Monte", o ex-meiocampista Alex, hoje comentarista de futebol na TV, revela em sua recém-lançada biografia, escrita por Marcos Eduardo Neves, que descambou para a bebedeira ao não ser convocado para a Copa de 2002:

- Nunca fui de beber, mas comecei a tomar cerveja e vinho. Passei uns 40 ou 50 dias de loucura. A imprensa falando de Copa do Mundo e eu nem sabendo o que estava rolando. De acordo com o fuso horário da Coreia do Sul e do Japão, os jogos aconteciam de madrugada. Naqueles horários, eu estive bêbado ou dormindo. Eu era um f....

Segundo Alex, que também milita no movimento de atletas e ex-atletas "Bom Senso", uma briga em 2000 com um chefe de delegação da seleção olímpica pode ter influenciado para não ter sido chamado (o fracasso naquela Olimpíada, em Sidney, encerrou a passagem de Vanderlei Luxemburgo pela CBF). Mas a bronca é mesmo com Luiz Felipe Scolari, que Alex ajudou a ser multi-vitorioso no Palmeiras no fim dos anos 1990, o que credenciou o treinador a chegar a seleção. Por isso, o ex-jogador diz que perdoa "o técnico Felipão", mas não "a pessoa Felipão". Alex deixou isso claro em entrevista a "O Estado de Minas":

- Ele levou jogadores que até aquele momento tinham histórias bem menores do que a minha na Seleção. No corte do [volante] Emerson, além de eliminar o sonho do capitão da Seleção, ele levou o Ricardinho, que não tinha cinco jogos pela Seleção. O golpe foi de assimilação complicada.

Naquele mesmo ano de 2002, a maior polêmica foi a não convocação de Romário, que já havia disputado duas Copas e ganho uma delas. Depois da bebedeira, Alex teve breve passagem pela Itália e retornou ao Brasil, em 2003, para comandar o Cruzeiro na conquista da "tríplice coroa": Campeonato Mineiro, Copa do Brasil e Brasileirão (quando foi o craque da competição). Depois, virou ídolo no Fenerbahçe, da Turquia, onde conquistou títulos, voltou a ser convocado pela seleção brasileira, em 2005, e ganhou até estátua na porta do estádio. Porém, Carlos Alberto Parreira também não o levou para a Copa de 2006, na Alemanha. Mas, na mesma entrevista a "O Estado de Minas", o ex-meiocampista alivia:

- Em 2006, Parreira foi honesto demais comigo e minhas expectativas eram pequenas.

Da mesma forma, mesmo com Alex "voando baixo" no Fenerbahçe, Dunga não o levaria à África do Sul, em 2010. E, no ano passado, quando Felipão levou o eterno 7 x 1 na Copa disputada no Brasil, Alex se despediu do futebol profissional ainda em grande forma. Eu mesmo, em 2013, quando ele decidiu voltar ao Brasil, lamentei que o São Paulo não o tivesse procurado. Prova disso foi que meu time sofreu nas suas mãos (ou melhor, nos seus pés) ao ser derrotado no Brasileirão daquele ano, assim como já havia sofrido, no Torneio Rio-São Paulo de 2002, às vésperas da (fatídica) Copa, um antológico golaço de Alex.

Mas foi isso: Anderson Polga (lembram?!?) foi campeão mundial como titular na seleção do Felipão. O craque Alex, não. Os deuses do futebol são mesmo muito estranhos...



terça-feira, julho 29, 2014

20 anos sem Mussum: as origens do 'mé', do apelido e do 'dialétis'

Compartilhe no Twitter
Compartilhe no Facebook

Mussum e uma garrafa: dia de homenagear o 'santo'
Todo butequeiro que se preze deve derramar um gole, hoje, em homenagem ao "santo" Antônio Carlos Bernardes Gomes, o saudoso mestre Mussum, morto há exatos 20 anos. Ícone do humor brasileiro, eternizado pelo grupo Os Trapalhões, foi também um grande sambista, compositor, músico e passista, tendo gravado vários discos com o grupo Originais do Samba e também em carreira solo. Anteontem, por coincidência (ou não), pois não me lembrava da data de morte do mito, comprei na rodoviária do Rio de Janeiro a biografia "Mussum forévis: samba, mé e Trapalhões", escrita por Juliano Barreto e publicada recentemente pela Editora LeYa. Embora eu considere que a rica e diversa vida de tal personagem mereça uma obra ainda mais "caudalosa", por assim dizer, com mais entrevistados, depoimentos, informações e infografia, o livro satisfaz algumas curiosidades que, com certeza, todo "mussunzista" deve ter. A elas:

A ORIGEM DO 'MÉ' - Já há muito tempo, a gíria "mé" é conhecida entre quem aprecia "molhar a palavra" ou "dar um tapa no beiço". Mas foi Mussum, indiscutivelmente, quem popularizou esse eufemismo para bebida alcoólica em escala nacional, no programa Os Trapalhões. Na biografia, Juliano Barreto conta que, em sua juventude na Mangueira, o carioca Carlinhos (como Mussum era conhecido), que trabalhava como mecânico e dividia um quarto de cortiço com a mãe a irmã, obviamente não tinha dinheiro para comprar conhaque ou uísque, suas futuras preferências. Por isso, "o drink preferido era a cachaça, mais barata e poderosa. Mas, para não beber a bebida pura, sempre rolava um xaveco para misturar a aguardente com algum ingrediente, para, pelo menos, suavizar seu gosto". Assim, naqueles anos 1950, o limão era a primeira opção da moçada mangueirense, seguido pela groselha e pelo mel. "Na primeira receita", prossegue o livro, "juntava-se a pinga com limão espremido e açúcar, o copo era chacoalhado e a mistura ganhava o nome de batida; a cachaça com groselha, por conta de seu tom vermelho opaco, ganhava o apelido de sangue; e a pinga com mel virou simplesmente o ". Bebedor "militante e profissional", Mussum tornaria-se um dos maiores "embaixadores" do "mé" e do prazer de "molhar a goela" (mesmo em um programa infantil!). Um dos momentos imortais, em Os Trapalhões, foi a paródia de uma propaganda de polivitamínico feita por Pelé, em que Mussum diz que o segredo da vitalidade "é que eu só tomo mé, MUITO mé!". Relembre:


A ORIGEM DO APELIDO - Mussum ainda era apenas um sambista, tocador de reco-reco e passista dos Originais do Samba, em novembro de 1965, quando o grupo foi convidado para ser figurante de um quadro fixo no programa de humor "Bairro Feliz", da recém-inaugurada TV Globo. No quadro, o ator Milton Gonçalves comandava um bloco de Carnaval e sempre se via em apuros para recusar algum samba-enredo horroroso que o mítico Grande Otelo insistia em lhe oferecer, toda semana. O programa era ao vivo, nas noites de terça-feira. Os Originais do Samba cumpriam o papel de figurantes, totalmente mudos, até que um dia Grande Otelo, que passava por fase instável na vida pessoal e vira e mexe aparecia bêbado, entrou em cena com um livro, dentro do qual escondera as folhas com o texto que não havia decorado. Só que, no ar, o veterano comediante tropeçou e derrubou o livro, espalhando folhas para todo lado. O (até então desconhecido) Carlinhos do Reco-Reco, ao fundo, não segurou sua irresistível gargalhada, o que, ao vivo, contagiou a plateia no estúdio e os telespectadores em casa. Furioso com a impertinência daquele figurante (e para disfarçar a gafe de não saber o texto e de ter sua malandragem de escondê-lo dentro do livro revelada ao vivo), Grande Otelo disparou, com sua voz esganiçada: "Tá rindo do quê, seu... seu... seu muçum!" O inusitado "xingamento" (muçum é um peixe parecido com uma enguia), somado a cara de espanto do sambista, completou a gargalhada do público - e tudo foi espontâneo. Para desespero do futuro Mussum, o apelido pegou forte no elenco e ele nunca mais seria chamado de outra maneira na vida. Veja vídeo do peixe muçum:


A ORIGEM DO 'DIALÉTIS' - Mesmo entre as crianças e adolescentes de hoje, que nem tinham nascido quando Mussum morreu, falar igual o personagem, colocando "is" no final das palavras - cadeiris, garrafis, carióquis - ainda é uma febre, e também em memes na internet e em camisetas. O que pouca gente sabe é que não foi o trapalhão quem inventou esse "dialétis". Depois da gargalhada espontânea no programa "Bairro Feliz", da Globo, que provocou a ira de Grande Otelo e o batismo de seu apelido eterno, Mussum saiu do anonimato e fixou-se como um cara engraçado, ganhando espaço para contar piadas e fazer palhaçadas nos shows dos Originais do Samba. Por isso, em 1967, foi convidado a integrar o novo quadro do programa "Chico Anysio Show", na TV Tupi, como aluno da "Escolinha do Professor Raimundo". Como precisava do dinheiro, pois, para sustentar mulher e filho pequeno, somava a carreira de sambista com a de cabo da Aeronáutica, Mussum aceitou. Mas ficou muito nervoso, já que, na experiência anterior na Globo, tinha sido só figurante e não precisava falar nada. Foi aí que o próprio Chico Anysio, que o convidou pessoalmente para o programa, bolou, junto com o redator Roberto Silveira, alguns bordões para ajudar o personagem Mussum a ter o que dizer na Escolinha: “Olha, crioulo, você tem três expressões para ganhar a vida: 'tranquilis', 'como di factis' e 'não tem problemis'. Esse vai ser o seu ganha pão”. De factis, foi isso mesmis que aconteceu. Muito depois, Mussum gravaria com Chico Anysio uma parceria do humorista cearense com Nonato Buzar. Ouça:


Passista: Mussum, de perfil, é o 2º a partir da esquerda
SAMBISTA E PASSISTA - Apesar de muitos ainda recordarem a vida musical de Mussum com os Originais do Samba e posterior carreira solo, poucos sabem sobre sua extraordinária habilidade como passista, que deslumbrou os mexicanos durante excursões por aquele país nos anos 1960. Para se ter uma ideia, Mussum foi um dos passistas de destaque do desfile da Mangueira no Carnaval de 1967, que contribuíram decisivamente para que a escola fosse campeã, depois de seis anos sem título. Ele apareceu até na capa da extinta revista O Cruzeiro. Foi a habilidade como passista de samba, aliás, que favoreceu sua estreia no mundo artístico: como o reco-reco, o instrumento que tocava, não era realmente imprescindível para um grupo de samba, foram os passos rápidos e acrobáticos que garantiram sua vaga nos Modernos do Samba, primeira versão dos Originais. Com o tempo, o bom humor, o jeito engraçado e a capacidade de fazer todo mundo rir seriam outras características que o tornariam insubstituível - e protagonista - no conjunto. E que o levariam ao "Chico Anysio Show", chamando a atenção de um outro cearense: Renato Aragão. O resto, como ele mesmo diria, "é históris". Avoé, mestre Mussum! Que esteja eternamente em paz, tomando um "mé" num buteco celestial. Vamos celebrá-lo com um pouco de Originais do Samba:


E (lógico) com Os Trapalhões, mostrando seus "dotes" de baterista e de cantor:


LEIA TAMBÉM:


Encerro o post registrando uma paródia de "Os seus botões", música do Roberto Carlos, que ouvi no programa Os Trapalhões quando tinha uns cinco ou seis anos (e que nunca mais me saiu da cabeça!): "O botão da calça/ Que o Mussum usava/ Era tão pequeno/ Não abotoava/ O dia que caiu/ Foi uma festança/ Todo mundo viu/ Sua preta poupança"

quarta-feira, abril 09, 2014

A origem do '171'

Compartilhe no Twitter
Compartilhe no Facebook

O 2º volume escrito por Lira Neto
Lendo "Getúlio 1930-1945 - Do governo provisório à ditadura do Estado Novo", segundo dos três volumes biográficos de Vargas escrito pelo cearense Lira Neto (foto à direita), me deparei com uma curiosa "segunda explicação" para a nossa tradicional gíria "171", usada geralmente para designar alguma "enganação". A primeira explicação, e mais conhecida, é o fato de 171 ser o artigo do Código Penal que trata sobre estelionato (ou seja, crime de falsidade - ou "enganação"). O Código, válido ainda hoje, foi criado em 1940 e entrou em vigência em 1942. Porém, pode ser que o tal 171 da nossa gíria venha de outra legislação, anterior a essa: a Constituição Federal promulgada por Getúlio Vargas em novembro de 1937 e apelidada de "Polaca", por ter sido baseada na constituição autoritária vigente, à época, na Polônia. Diz o livro de Lira Neto (o grifo é nosso):

A 'Polaca', Constituição de 1937
"Se o artigo 78 da Polaca fosse levado em consideração, aquele 10 de novembro de 1943 seria o último dia de Getúlio no [Palácio do] Catete. A legislação em vigor previa que o mandato do presidente da República - que recomeçara a ser contado em 1937, com a instauração do Estado Novo - era de seis anos. Teria chegado a hora, portanto, de passar a faixa presidencial ao sucessor. Mas o artigo 171 da mesma Constituição estabelecia que, na vigência do estado de guerra, o presidente tinha a prerrogativa de suspender qualquer trecho da Carta Magna. Como o Brasil se encontrava oficialmente em luta contra o Eixo [na Segunda Guerra Mundial], Getúlio tornou sem validade o artigo que determinava a extensão de seu mandato e, sem ferir as regras estabelecidas, voltou a dilatar o próprio período de governo, que já se estendia por treze anos, iniciados em 1930."

Portanto, se em 1937 alguém atentou para a previsão de troca presidencial dali a seis anos (e não observou o tal artigo 171), deve ter se sentido ludibriado em novembro de 1943 - e essa "enganação" pode ter sido fixada no imaginário popular. O que poderia nos levar a crer que, antes de uma origem policial, a gíria "171" teria, na verdade, gênese política. Afinal, o cancelamento do fim mandato presidencial em 1943 não poderia ser considerado, em termos institucionais, uma espécie de "estelionato"? Pois é: mais uma engenhosa manobra política desse que passaria para a História como um "171" clássico e inveterado: Getúlio Vargas.

sexta-feira, julho 05, 2013

Quando a mídia começou a mandar no futebol

Compartilhe no Twitter
Compartilhe no Facebook

Rede Globo e CBF: relações promíscuas
Em 2012, as cotas de TV representaram 40% do faturamento conjunto de R$ 3,08 bilhões dos 20 maiores clubes brasileiros em 2012, segundo estudo do consultor Amir Somoggi divulgado recentemente. Isso explica a ingerência explícita de grupos de comunicação como a Rede Globo na (des)organização do calendário futebolístico nacional, no dia e horário dos jogos, na cartolagem da CBF e dos clubes e em outras questões decisivas. Mas esse tipo de promiscuidade vem de muito longe. O livro "O Marchal da Vitória - Uma História de Rádio, TV e Futebol", biografia do finado empresário e cartola Paulo Machado de Cavalho, de autoria dos jornalistas Tom Cardoso e Roberto Rockmann (Editora A Girafa, 2005), aponta momento exato em que política, poder, dinheiro, futebol e comunicação se cruzaram no Brasil.

Record engajou-se na 'Revolução'
Depois de comprar a minúscula Rádio Record em 1931, Machado de Carvalho conseguiu projetá-la no ano seguinte ao engajar-se fortemente na "Revolução Constitucionalista" do ano seguinte, insurreição da elite paulista contra o ditador Getúlio Vargas que contou com a adesão total da referida emissora de rádio para mobilizar a população. Após três meses de batalhas, o governo federal venceu os paulistas e fechou a Record - que seria reaberta graças aos contatos amistosos de Carvalho, filho de tradicional família "quatrocentona" paulistana, com o general Cordeiro de Farias, indicado por Vargas como novo chefe de polícia em São Paulo. Mais do que isso: o ditador se interessou pelo poder da emissora a usaria para seus fins populistas. Porém, no rescaldo daquele pós-"Revolução Constitucionalista", a Record teve que acabar com o noticiário político.

Plantão da Record nos anos 1930
Foi então que o empresário de comunicação resolveu apostar todas as suas fichas na programação esportiva. Como ainda não se narrava jogos em São Paulo, a Record criou o primeiro plantão esportivo do Brasil, com cinco telefones de manivela ligados aos estádios e pistas de corridas de cavalo. "A cada gol ou páreo, um repórter discava para a sede da Record e dava a notícia". Essa cobertura "ao vivo" não existia e fez enorme sucesso. As emissoras concorrentes ouviam as notícias "frescas" da Record e, minutos depois, divulgavam para seus ouvintes na maior cara dura. E, assim como contou com a sorte ao comprar a emissora logo antes da "Revolução" de 1932, movimento que selou a ligação da Record com a população, Paulo Machado de Cavalho acertou instintivamente outra vez ao apostar no esporte justo em 1933, quando o futebol se profissionalizou no país.

Rio-SP de 1933: Palestra campeão
Para celebrar a mudança, dirigentes paulistas e cariocas deram uma trégua nas rixas bairristas e organizaram naquele mesmo ano, em parceria, o primeiro Torneio Rio-São Paulo. A Record contratou mais funcionários para a equipe do "Esporte nas antenas" e aumentou de cinco para sete o número de linhas telefônicas instaladas em campos das duas cidades. Com isso, liquidou a concorrência. Mas a Rádio Cruzeiro do Sul, de propriedade do milionário Alberto Byington, resolveu acabar com essa hegemonia. E, com isso, inaugurou o poder dos meios de comunicação sobre o futebol brasileiro. Terminado o Torneio Rio-São Paulo, a Associação Paulista de Esportes Atléticos (Apea) enviou uma carta à Record anunciando que a partir de 1934 só a Cruzeiro do Sul teria permissão para transmitir jogos de futebol.

Inauguração do Pacaembu, em 1940
O preço? Byington comandava o comércio de vendas de material de iluminação e propôs aos clubes, em troca da exclusividade nas transmissões, iluminar (a preços camaradas...) todos os estádios de futebol da cidade. Fora isso, ofereceu salários milionários para tirar a equipe que cobria esportes na Record. Somente em 1940, com a inauguração do estádio municipal do Pacaembu - que hoje tem o nome de Paulo Machado de Carvalho - foi que todas as emissoras da cidade passaram a ter cabine à disposição para transmitir os jogos, sem pagar nada por isso. Mas o dono da Record estava escaldado: embarcou diretamente na cartolagem futebolística, como diretor e presidente do São Paulo e, depois, como chefe das delegações brasileiras que venceram as Copas de 1958 e 1962, quando ganhou o apelido de "Marechal da Vitória".

Bellini com Paulo Machado de Carvalho, o 'Marechal da Vitória'
Assim, já proprietário da Rádio Panamericana e da TV Record, conseguiu respaldo político para que suas emissoras voltassem a transmitir futebol e estruturassem coberturas esportivas que marcaram época. Curioso é que, em 1965, proibido pela Federação Paulista de Futebol (FPF) de transmitir os jogos do Paulistão, pois os clubes reclamavam da baixa bilheteria nos estádios, Paulo Machado de Carvalho teve que tirar da cartola qualquer coisa que pudesse preencher o horário televisivo das tardes de domingo. Foi assim que surgiu o programa "Jovem Guarda", sucesso estrondoso entre a juventude que projetou para o estrelado Wanderléa, Erasmo Carlos e, principalmente, Roberto Carlos. Mas isso já é outra história...