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quarta-feira, junho 25, 2008

Sociedade carente de valores públicos

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Li (com atraso), na edição 24 da Revista do Brasil, a entrevista que o Paulinho Donizetti, com colaboração de Xandra Stefanel, fez com a psicanalista Maria Rita Kehl (foto). Gostei especialmente do trecho em que ela afirma, com todas as letras: "A gente está numa sociedade muito carente de valores públicos, em que pouco se faz em nome do bem comum". Por isso, segundo ela, as pessoas acabam priorizando os valores individuais e de seu núcleo familiar conservador - o que explicaria, por exemplo, a indignação pública no caso da morte da menina Isabella Nardoni - que fere as regras de "bom comportamento paterno". Ao mesmo tempo, o debate coletivo sobre violência e segurança (principalmente com a ótica dos menos favorecidos) não interessa a ninguém.

E, a partir da constatação de que as pessoas assimilam cada vez mais conformadas o consumismo e a máxima capitalista "tempo é dinheiro", é possível relacionar várias "doenças sociais" aparentemente desconexas, como depressão e hipocondria, patrulhamento, morbidez, sensacionalismo, sectarismo, impunidade etc. Para mim, tudo isso influi diretamente na atitude política (ou apolítica) que uma pessoa possa assumir (ou se omitir) em uma coletividade. Abaixo, alguns trechos da entrevista de Maria Rita:

Conservadorismo e preconceito
Ser mãe biológica não é garantia de bons sentimentos, mas colocamos a mãe sempre num altar e usamos a madrasta para representar o lado escuro da mãe, desde os contos de fadas. E tem, ainda, um pouco da idéia de que família boa é aquela que tem o pai e a mãe biológicos e os filhos.

Morbidez e indiferença social
Por que quando há um atropelamento a maioria das pessoas pára para olhar? É porque a morte nos fascina. A morte, a violência fascinam, como todos os temas ligados àquilo que é mais reprimido na gente. Mas não há espaço de destaque para o assassinato de criança negra e pobre.

Impunidade e horror ao enfentamento
Basta ver o modo como terminou a ditadura: terminou, terminou, não se fala mais nisso. Não houve pressão para punir os ditadores. Agora acontecem algumas indenizações, mas não houve julgamento. Todo mundo foi perdoado e nem sequer pediu perdão. Nem se dá nome aos responsáveis. O brasileiro tem horror ao enfrentamento do conflito.

Desvalorização do tempo e da vida
É como se a gente tivesse uma urgência temporal que faz com que a vida perca completamente o valor. O tempo da experiência, da reflexão, todo o tempo da chamada vida subjetiva está sendo atropelado pelo tempo do capitalismo. Esse é o primeiro fator da depressão, essa desvalorização do tempo como tempo de vida. (...) Se você negocia a matéria-prima da sua vida, valendo dinheiro, a vida se desvaloriza. Se a vida se desvaloriza, para que viver?

Hipocondria, intolerância e consumismo
As pessoas começam a tomar antidepressivos porque estão numa sociedade que não tolera a tristeza, o abatimento, ou que você não esteja sempre apto a achar que a vida é maravilhosa. (...) O trabalho é cada vez mais competitivo, quanto mais depressa o cara estiver bombando de novo, melhor. E não tem a ver só com trabalho, mas com os imperativos do consumo. É isso que impede que as pessoas tenham o tempo que precisam para se recuperar das quedas, perdas, crises.

Conformismo e vício televisivo
Essa modulação de ritmo, que permite que você tenha em contraposição ao ritmo acelerado do trabalho um tempo do lazer ou do ócio, vai se perdendo. E o que a gente tem como ócio hoje em dia? Deitar no sofá em frente à TV. As pessoas falam: 'Ali eu me desligo'. Mas uma parte está ligada, senão você não ficaria vendo televisão; ficaria ouvindo música ou em silêncio, pensando. A televisão reproduz essa velocidade.

sexta-feira, junho 13, 2008

A sociedade dos distintivos

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Estava ontem no ônibus, umas cinco e meia da tarde, voltando com meu filho da escolinha pela avenida Franscisco Morato, zona Oeste de São Paulo. Eu tinha acabado de passar a catraca e ia descer no ponto seguinte, quando deparei com um rapaz de uniforme esportivo, tipo agasalho "adidas", bem diante da porta. Num primeiro relance, achei que era um torcedor do Fluminense, pois o uniforme era branco, com três listras no ombro, duas verdes e uma rosada no meio. Mas não, era um torcedor da Mancha Verde, paramentado do tênis ao boné.

Meu filho também se interessou pelo palmeirense e ficou olhando, até que abriu o seu sorriso de quatro dentes. O rapaz retribuiu com um sorriso simpático, deu uma risadinha e falou comigo "Tô vendo que não é corintiano". Havia uma cumplicidade boa na sua fala, ele realmente achou que uma criança que sorrisse para ele daquele jeito tinha que ser palmeirense, ou no mínimo não ser corintiano. Ao que respondi, amigavelmente, "Claro que é".

O moço fechou a cara, apertou um pouco os beiços e fixou os olhos no chão. "Embaçado", disse. "Ele é respeitador", acrescentei, pra quebrar o clima. Mas não teve jeito, o até então simpático palmeirense não tirou os olhos do piso do ônibus até que a porta abrisse e ele descesse, no mesmo ponto que nós, sem um gesto.

Duas reflexões me sobrevieram. A primeira foi a constatação de que um torcedor fanático lê o mundo apenas pela lente de sua identidade de torcedor. Quer dizer, ele mesmo se reduz ao distintivo que leva no peito, como um soldado, um membro de seita. Aquele palmeirense não podia entender que eu pudesse ser simpático com ele, sendo ao mesmo tempo seu adversário de torcida - "seu inimigo", devia pensar. Sua farda é o que ele é, ele acredita que quem o vê não o enxerga como uma pessoa complexa, com uma história própria, com qualidades e defeitos, o vê simplesmente como um palmeirense. E a um sorriso de um desconhecido reagiu simplesmente como torcedor.

A segunda coisa, um ponto a frente, é que nesse contexto até mesmo meu filho Chico tinha algo de ameaçador. Registre-se, é um bebê de um ano de idade, mas sendo ele corintiano o palmeirense não podia se render ao apelo de seu sorriso fofo, e continuar com os gracejos que todo mundo faz. Já era um pequeno inimigo. É terrível isso. A adesão a uma torcida, algo que legitimamente faz parte da mitologia individual-social de pessoas e grupos, pode se tornar mandamento moral, regra de conduta para se saber quem são as boas e as más companhias. É a violência das verdades morais se manifestando de forma crua e próxima, do mesmo tipo que se usa para fundamentar as "cruzadas" pelo "bem", ou outro tipo de cegueira violenta. Toda a necessidade de compartimentação - i.e., de discriminação - em nossa sociedade se mostrava naquele gesto de mirar o chão e evitar o encontro com o olhar daquele bebê maligno.

Que não me interpretem mal. Uso o exemplo do palmeirense porque eu e Chicão somos corintianos, e conosco essa cena obviamente não poderia ter acontecido com um membro da Gaviões. Mas meu assunto não são os palmeirenses, e sim essa simplificação do homem, essa redução de natureza fascista, que pode muito bem servir de modelo para entendermos outros tantos tipos de discriminação com os quais convivemos.

sábado, maio 17, 2008

Kléber: de pretenso Kaká a futuro Sandro Goiano

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Há exatamente uma semana, eu conversava com três palmeirenses sobre o comportamento do atacante Kléber, emprestado por seis meses pelo Dínamo de Kiev, da Ucrânia, para o Palmeiras. Campeão paulista, com três gols marcados (inclusive o que garantiu a vitória contra a Ponte Preta em Campinas, na primeira partida decisiva), o atleta protagoniza jogadas explicitamente desleais e, calado e sério, parece manter totalmente a calma após as agressões, de forma fria e calculista. Não estou falando apenas da cotovelada em André Dias, do São Paulo (acima), na primeira fase do Paulistão. São muitos lances parecidos, como na decisão contra a Ponte Preta no Parque Antártica, quando, na queda após uma dividida, virou o pé e acertou propositadamente a sola e as travas da chuteira na cara do adversário. Maldade pura.

Pois então, falando sobre isso, todos os palmeirenses concordaram comigo. Dito e feito: hoje, Vanderlei Luxemburgo afastou Kléber do elenco e ele não enfrenta o Internacional de Porto Alegre amanhã, pelo Brasileirão. O motivo? Num simples treino, ontem à tarde, o atacante quase aleijou o zagueiro reserva Maurício, que saiu carregado de campo. É surpreendente esse tipo de comportamento, principalmente para quem, como eu, se lembra do início da carreira do atacante. Revelado pelo São Paulo, Kléber Giacomance de Souza Freitas era um cara franzino (à direita), que se destacava pela rapidez e oportunismo nas categorias de base e na seleção brasileira sub-20. Em 2003, aos 20 anos, assumiu a posição de Kaká, vendido para o Milan, e marcou 10 gols em seis meses de temporada profissional pelo tricolor paulista.

Pelo bom desempenho na Copa Sul-Americana, chamou a atenção e mereceu elogios de José Mourinho, que treinava o Porto - time que levaria para Portugal, no ano seguinte, o artilheiro Luís Fabiano. Com a lebre levantada, o ucraniano Dínamo se adiantou e comprou Kléber por US$ 2,2 milhões. Não sei o que fizeram com ele lá, se foi turbinado em salas de musculação (à esquerda), mas, de franzino, virou um tanque. Porém, o problema nem é esse. Não sei como é o futebol na Ucrânia, mas deve ser de forte marcação e muito contato físico, para não dizer violento, e com arbitragem complacente. Só pode ser, pois, de habilidoso e técnico, Kléber voltou para o Brasil com um estilo bem agressivo e "mau caráter", para ser mais preciso. Como disse, apesar dos gols e do bom futebol, tem até palmeirense que não gosta do cara. Merecidamente.

terça-feira, abril 22, 2008

Banalização total do crime

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O Carnaval da imprensalona – e da população, macaca de auditório – no caso Isabella Nardoni vem me revoltando e embrulhando o estômago até a náusea. De tão enojado, nem me dispus a escrever algo sobre o assunto. Mas o texto "Show da imprensa na morte de Isabella", do jornalista Hamilton Octavio de Souza, professor da PUC-SP, publicado no Brasil de Fato, veio sintetizar minhas considerações. Vamos a alguns trechos:

"Não é de hoje que a chamada grande imprensa empresarial - os principais veículos de comunicação de alcance nacional - exploram de forma sensacionalista crimes bárbaros e situações que são transformadas em escândalos com uma dimensão desproporcional em relação a outros fatos e acontecimentos mais relevantes para a sociedade."

"No caso da morte da menina Isabella, aparentemente uma fatalidade (como tantos outros casos isolados que ocorrem diariamente pelo Brasil afora), a cobertura da mídia - na busca de audiência e de aumento de vendagem nas bancas - tratou como se fosse uma novela, com capítulos diários recheados de detalhes irrelevantes e paralelos, mas dosados - com a ajuda da Polícia, do Ministério Público e do Judiciário - de suspense suficiente para manter o telespectador (leitor e ouvinte) aprisionado no enredo da história."

"Apenas para destacar esse tratamento diferenciado, no mesmo dia da morte da menina, 150 soldados da tropa de elite da Polícia Militar do Rio de Janeiro invadiram uma favela e assassinaram 10 pessoas. Não foi a primeira vez, nos últimos meses, que a PM do Rio cometeu tamanha barbárie contra uma comunidade pobre. No entanto, a grande imprensa nacional deu apenas um pequeno registro desse crime violento praticado pelos agentes do Estado."

"Do ponto de vista da relevância social, o crime do Rio atenta contra toda a sociedade, pois representa uma violação bárbara de direitos. No entanto, o tratamento dado para esse genocídio carioca é o da banalização total do crime, é o do rebaixamento do valor das vidas humanas porque os mortos estão localizados na escala mais baixa das condições de vida no País."

"Do ponto de vista do espetáculo e da comercialização dos fatos, o caso da menina Isabella 'permite' muito mais exploração inconseqüente do que as 10 mortes do Rio de Janeiro. No caso da Isabella, a mídia dissecou todos os detalhes possíveis, entrevistou dezenas de pessoas, desde parentes até colegas e professores. No caso do crime do Rio, o assunto morreu no mesmo dia e o povo brasileiro nada ficou sabendo sobre as vítimas, quem eram, quais as suas histórias, o que faziam, quem são os seus parentes e porque foram assassinadas."


Concordo em gênero, número e grau.

A íntegra está aqui.

quarta-feira, fevereiro 27, 2008

Entre pontapés e pancadas

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Kaká diz: "Não agüento mais receber tanta pancada". Quer que os árbitros façam alguma coisa. Seu clube, o Milan, reiterou as denúncias de perseguição. "Um jogador nunca faz duas faltas consecutivas em Kaká. Há um revezamento entre os jogadores, como se fosse uma estratégia planejada. Claro, os árbitros não vêem nada", dizem os rubro-negros milaneses.

Um dia antes, guardadas as proporções em todos os níveis, Vanderlei Luxemburgo dispara a mesma acusação sobre seu segundo atacante, o meia Valdívia. Nas contas do comandante palestrino, expulso na última partida contra o Rio Preto, primeiro foi o número oito, depois o camisa sete, e assim por diante até se cansarem de surrar El Mago.

O brasileiro naturalizado croata Eduardo da Silva, do Arsenal, tomou uma pernada do zagueiro Taylor, do Birmingham. Cordial, o agredido perdoou o assassino, o que justifica os termos gentis para com o britânico.

Minha perna dói só de olhar.



Assista:


A linha é completamente diferente do que propõe o Olavo. Mas tem coisas que precisariam ser repensadas.

Muito se falou aqui sobre Sandro Goiano, ex-Grêmio, hoje no Sport, e sobre Materazzi. Por mais que tenham suas funções táticas dentro de campo, são atletas de se notabilizaram por, digamos, excessos.

O que fazer para proteger os atletas vítimas da pancadaria e para diminuir o espaço do anti-jogo?

quinta-feira, janeiro 24, 2008

Valdívia e o "adevogado" Luxemburgo

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Das 29 faltas cometidas pelo MAC na partida de quarta-feira, 23, 10 foram em cima do meia chileno Valdívia. O pontapé do lateral Vinícius no nariz do palmeirense deixou-o como mostra a foto.

A partir daí, Vanderlei Luxemburgo disse:

– Os árbitros precisam coibir lances como o de hoje [quarta-feira]. As faltas fazem parte de uma partida, mas o anti-jogo não. O que o Marília fez aqui foram faltas seguidas para travar a partida e coibir o futebol-arte do Valdivia.

Descontada a adjetivação do "futebol-arte", a preocupação não é nova. Quando Robinho foi ameaçado pelo ex-goleiro gremista Danrlei em 2002, havia uma ameaça expressa, mas se falava da pancadaria. O ex-integrante do pior ataque do mundo, Sávio, também sofria com as sarrafadas – aliás, Valdívia está mais próximo do ex-flamenguista do que de Robinho em termos de habilidade.

Luxemburgo prossegue:
– Nos dois últimos jogos, o Valdivia recebeu dois cartões completamente injustos. Ele é um jogador diferente, que parte para cima quando está com a bola. Qualquer atleta precisa ter liberdade para fazer o que bem entender dentro de campo, desde que com lealdade. O coronel [Marcos Cabral de Moura] Marinho [presidente da Comissão Estadual de Arbitragem] precisa pegar os três teipes e ver se foram justos os cartões que o Valdivia tomou.
O próprio técnico explica o menos controverso dos cartões – porque merecido – na partida contra o Santos:
– Não quis falar no dia para não polemizar, mas se você pegar o teipe da partida, vai ver que é o adversário quem dá um soco no Valdivia. Quem deveria ter levado cartão antes do meu jogador era o Adriano, pois ele não deixou o Valdivia jogar durante os 90 minutos. A Comissão de Arbitragem precisa estar atenta quanto a isso.
Dizer que ele foi vítima inocente do troca-tapas com o santista não cola. Meu ponto é que transformar o chinelo em vilão da história é um erro, porque o cidadão apanha em campo.

E vítima de pontapés em geral, ele é. Ter o sangue frio de não reagir e aprender a pular antes da chegada da voadora podem ser os instrumentos para ele ir mais ou menos longe do futebol.

sexta-feira, novembro 16, 2007

Vereadora é presa por torturar suposta amante um dia depois da eleição

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Ouroeste, cidade a 602 quilômetros da capital paulista, assistiu a uma prisão dentro da Câmara Municipal. A vereadora Maria Claudina (PSDB) foi detida na quarta-feira, 14, acusada de sequestro e tortura a uma funcionária pública em 4 de outubro de 2004. Atualmente com 52 anos, ela acreditava que Marilei dos Reis Machado fosse amante do marido.

A agressão ocorreu no dia seguinte ao pleito que lhe garantiu o segundo mandato no cargo, com 260 votos. Se Marilei era ou não amante, importa em nada. A condenação foi a cinco anos de reclusão em regime semi-aberto por seqüestro, constrangimento ilegal e injúria pelo Tribunal de Justiça de São Paulo. Cabe recurso. Duas outras pessoas acusadas como cumplices também foram condenadas.

Marilei foi obrigada a entrar no carro da vereadora, que seguiu a um motel. No local, o grupo teria agredido fisica e psicologicamente a funcionária pública, além de raspar seu cabelo e deixá-la nua na praça da Matriz da cidade vizinha Meridiano.

O presidente da Câmara, José Fábio da Silva (PSB), disse à imprensa que vai esperar o julgamento dos recursos para decidir se pede a cassação da colega. Por enquanto, segundo ele, a vaga da vereadora ficará vazia.

Enquanto os acusados planejam recorrer, a acusação pleiteia 700 salários mínimos a título de indenização por danos morais e materiais.

E depois é só Congresso Nacional que migrou pro noticiário policial.

segunda-feira, novembro 12, 2007

Tropa sem elite

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Damião Ferreira da Cruz (foto), baiano de Lauro de Freitas, tem 72 anos e, segundo ele, fugiu de casa aos 13 para escapar da brutalidade dos pais, que batiam nele com "cipó de cabo". Clandestino, viajou num navio em direção ao Rio de Janeiro. Chegando, foi morar na zona de prostituição. Entrou para a Marinha, mas continuou freqüentando bordéis e explorando mulheres como "cafetão". Nessa vida desregrada, desertou de um navio e foi morar com uma prostituta em uma palafita. Refeito do porre, tentou voltar para o quartel, onde foi condenado a um ano de prisão (um mês na solitária). Ali, aprendeu a "tocar" violão e transformou-se em Damião Experiença.

Fora da cadeia, a Marinha o aposentou depois que caiu do mastro de um navio e bateu a cabeça. Voltou a trabalhar como "cafetão" e, com o dinheiro, começou a bancar seus próprios discos. O primeiro, em 1974, chamou-se "Planeta Lamma". Ele gravou com um violão de uma corda só, um chocalho de tampinhas de garrafa, gaita e letras no "dialeto" do tal planeta. Mais tarde ainda gravaria outros álbuns, como "Damião Experiença Planeta Roça", "Damião Experiença Chupando Cana Verde no Planeta Lamma" e "Damião Experiença Cheirando Alho no Planeta Lamma" - muitas vezes usando uma banda de apoio (tudo está disponível no link http://www.damiaoexperienca.net/downloads.htm).

No disco "Comando Planeta Lamma", de 1992, há uma música com o sugestivo nome de "Bar", em que Damião denuncia a violência da polícia: "Os bicho da cara preta/ Querendo me prendê/ Me dando tanta pancada/ E me prendendo/ Quando lá cheguei/ Tive que me defendê/ Mas não adiantô/ Fui mesmo pro xadrez". E prossegue: "Os bicho da cara preta/ Tão pegando e tão matando de escopeta/ Não tem medo de careta/ Eles são os bicho mais feroz do planeta". Usualmente vestido como um mendigo, Damião deve saber, na pele, como é tratado um negro pobre (e meio maluco) pelos policiais do Brasil. E particularmente do Rio de Janeiro, onde vive.

terça-feira, junho 26, 2007

“Foi uma coisa feia”

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Às 4h30 da manhã de sábado, a empregada doméstica Sirlei Dias Carvalho Pinto, 32, foi assaltada e espancada por cinco indivíduos num ponto de ônibus na av. Lúcio Costa, na Barra da Tijuca, zona oeste do Rio. Os agressores, descobertos pela placa do carro que usavam, anotada por um taxista que testemunhou a agressão, foram cinco rapazes de classe média, todos universitários: Rubens Arruda, de 19 anos, estudante de direito, Rodrigo Bassalo, 20, estudante de turismo, Felipe Macedo Nery Neto, 20, estudante de direito, Júlio Junqueira, 21, dono de um quiosque na praia da Barra e estudante de gastronomia, e Leonardo de Andrade, 19, técnico em informática.

Os cinco foram identificados pela vítima e estão todos presos. Segundo ela, quatro participaram diretamente do ataque, enquanto o outro ficou rindo e debochando. O caso inverte a lógica mais comum dos crimes de nossa sociedade: a vítima é pobre e os agressores de classe média. Isso gera situações que unem a tragédia ao ridículo.

O primeiro a ser preso foi o dono do carro, Felipe Macedo Nery Neto. Ele admitiu o crime, entregou os comparsas e declarou que o grupo pensava que a vítima fosse uma prostituta. Repetiu os outros bandidos endinheirados que, em 1997, assassinaram o índio Galdino, em Brasília. Daquela vez, pensaram se tratar de um morador de rua. Para quem não sabe, prostitutas e moradores de rua não são seres humanos. Pelo menos é o que se entende da fala dos dois grupos de rapazes.

A desfaçatez dos mais novos é reflexo da de seus pais. O empresário Ludovico Ramalho Bruno, pai de Rubens Arruda, declarou ao jornal Extra (está na capa) que acha a prisão do filho exagerada e que "mulher fica roxa apenas com uma encostada". Ele também falou hoje à Folha de S. Paulo, de onde transcrevo abaixo essa entrevista (para assinantes). Mais que a cara-de-pau do pai, espanta a docilidade do repórter. Leiam e pensem como seria sua postura se a situação econômica dos personagens envolvidos fosse inversa:

Folha - O sr. acredita na acusação contra seu filho?
Ludovico Ramalho Bruno - Eles não são bandidos. Tem que criar outras instâncias para puni-los. Queria dizer à sociedade que nós, pais, não temos culpa nisso. Eles cometeram erro? Cometeram. Mas não vai ser justo manter crianças que estão na faculdade, estão estudando, trabalham, presos. É desnecessário, vai marginalizar lá dentro. Foi uma coisa feia que eles fizeram? Foi. Não justifica o que fizeram. Mas prender, botar preso, juntar eles com outros bandidos... Essas pessoas que têm estudo, que têm caráter, junto com uns caras desses? Existem crimes piores.

Folha - O sr. já falou com ele?

Bruno - Não. É um deslize na vida dele. E vai pagar caro. Está detido, chorando, desesperado. Daqui vai ser transferido. Peço ao juiz que dê a chance para cuidarmos dos nossos filhos. Peguei a senhora que foi agredida, abracei, chorei com ela e pedi perdão. Foi a primeira coisa que fiz quando vi a moça, foi o mínimo que pude fazer. Não é justo prender cinco jovens que estudam, que trabalham, que têm pai e mãe, e juntar com bandidos que a gente não sabe de onde vieram. Imagina o sofrimento desses garotos.

Folha - O sr. acha que eles tinham bebido ou usado droga?

Bruno - Estamos com epidemia de droga. A droga tomou conta do Brasil. O inimigo do brasileiro é a droga. Tem que legalizar isso. Botar nas farmácias, nos hospitais. Com esse dinheiro que vai ser arrecadado, pagar clínicas, botar os viciados lá, controlar a droga.

Folha - Mas o sr. acha que eles poderiam estar embriagados ou drogados?

Bruno - Mas é lógico. Uma pessoa normal vai fazer uma agressão dessa? Lógico que não. Lógico que estavam embriagados, lógico que podiam estar drogados. Eu nunca vi [o filho usar droga]. Mas como posso falar de um jovem de 19 anos que está na rua numa epidemia de droga, com essas festas rave, essas loucuras todas.

Folha - Como é o seu filho em casa?

Bruno - Fica no computador, vai à praia, estuda, trabalha comigo. Uma pessoa normal, um garoto normal.

O jornalista aceita todas as justificativas do pai, não questiona a tese de que prender “pessoas que têm estudo, que têm caráter” seria castigo demais. E ainda levanta a bola, ao perguntar se eles estavam bêbados ou drogados. Será que a postura dele seria a mesma com o pai de um jovem de 20 anos morador de uma periferia qualquer? Na verdade, nunca saberemos, pois o jornalista jamais entrevistaria o pai de um “criminoso”, um “bandido”. Agora, com o civilizado o pai de “jovens agressores” dá pra conversar.

Gostaria de saber porque os caras que espancaram sem nenhuma justificativa uma mulher indefesa e bateram em mais duas na mesma situação, só por farra, porque acharam que se tratava de uma prostituta, têm “caráter”. Roubo do companheiro Glauco a tradução de uma frase do entristecido pai: "Mas prender, botar preso, juntar eles com outros bandidos... Essas pessoas que têm estudo, que têm caráter, junto com uns caras desses? Existem crimes piores." Tradução: "mas prender, botar preso, juntar eles com pretos, pobres... Essas pessoas que têm estudo, que tem dinheiro, junto com uns vagabundos desses?". Quando eu crescer, quero ter dinheiro para comprar caráter para mim.

quinta-feira, maio 10, 2007

Um milésimo que ninguém faz questão de ver

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Enquanto o Bento XVI passeia lépido e fagueiro em São Paulo, semeando a "paz na terra para os homens de boa-vontade", os cariocas estão na iminência de mais um milésimo histórico. Porém, ao contrário da contagem de gols do Romário, essa é uma marca específica que ninguém faz questão de ver: segundo o site Riobodycount (www.riobodycount.com.br), 877 pessoas foram mortas no Rio de Janeiro entre 1º de fevereiro e hoje, 10 de maio. Do jeito que vai, portanto, a milésima vítima deve ser morta antes dos Jogos Pan-Americanos.

Não sei o motivo de a contagem ter começado nessa data, mas quem faz o site se define como "um grupo voluntário, apartidário e sem vínculo com qualquer instituição. Não recebemos doações e não somos uma ONG. Reportamos incidentes de violência no Rio de Janeiro a partir de notícias da grande imprensa e outras fontes." A coordenação e edição ficam por conta de Andre Dahmer, Vinicius Costa e Léo Torres. Segundo eles, o site foi inspirado no www.iraqbodycount.org, que conta o número de vítimas de violência da guerra no Iraque.
"Queremos abrir discussão sobre os altos índices de violência no Rio de Janeiro. Não acreditamos em saídas simplistas e ineficientes de um Estado truculento e assassino. Não acreditamos em paz vigiada por câmeras, armas, milícias e carros de guerra", afirmam. O trabalho chama a atenção para o todo, em vez de incidentes isolados, e merece respeito pela simples comparação entre o caos carioca e uma guerra de proporções internacionais como a do Iraque. Triste é supor, sem exagero, que o milésimo caso fatal já teria sido registrado no site caso a contagem tivesse começado em 1º de janeiro.

sexta-feira, dezembro 29, 2006

Bebum dá tapa em policial dentro de avião

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Muitas pessoas viajam no final do ano e ainda existem companhias aéreas que continuam servindo bebida alcoólica. E como geralmente, nessa época, todo mundo quer mais é encher a cara até cair, o perigo de vexame público é consideravelmente maior. Durante um vôo que ia de Washington até a Flórida, nos Estados Unidos, um manguaça que estava bebendo licor começou a ficar descontrolado depois que uma comissária de bordo se recusou a servi-lo mais álcool. Nervoso, o bebum deu um tapa no passageiro ao seu lado que, por acaso, era um policial encarregado de cuidar do vôo. O agente federal deteve o homem e o prendeu assim que o avião pousou. "Ele teve uma péssima noite", disse outro policial, que preferiu se manter anônimo. (com informações da CNN)