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terça-feira, outubro 28, 2008

Criminalização dos pichadores OU "Fora Serra"

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Durante a abertura da 28ª Bienal de São Paulo, no domingo, dia 26, um grupo de 40 pichadores decidiu "arrombar a festa" dos culturetes e afins no Parque do Ibirapuera. Munidos com tinta em spray, eles invadiram o segundo andar do prédio rabiscaram nas paredes símbolos e frases como "Fora Serra" (acima) e "Isso que é arte" - em resposta á decisão da a curadoria da mostra de reservar aquele espaço para discutir a "crise da arte". A polícia baixou e pegou como bode expiatório uma jovem de 23 anos. "É o protesto da arte secreta", disse ela. As portas da Bienal foram fechadas, causando tumulto, mas metade do grupo conseguiu se misturar aos freqüentadores e escapar. A outra metade quebrou vidros e também zarpou fora.

É fato que muita gente não gosta dos pichadores ou do que eles fazem. Mas não quero, aqui, tratar da questão estética. Historicamente, a pichação sempre foi usada para protesto político (vide foto à esquerda, dos tempos da ditadura militar). O "Fora Serra" confirma isso. Não por outro motivo, como ocorreu no domingo, os governantes sempre mandaram a polícia em cima. Daí, a criminalização generalizada é inevitável. Recentemente, em Brasília, a Secretaria de Segurança Pública lançou um programa que pedia para os pais vigiarem os filhos para identificar potenciais pichadores. Um policiamento amedrontador.

Vejo muito exagero nisso tudo. Claro que ninguém tem o direito de sair pichando qualquer coisa em qualquer lugar, e há legislação para punir isso. Mas, como disse antes, há o contexto político. Na primeira versão de "Como vovó já dizia", Raul Seixas resumiu: "Quem não tem papel dá o recado pelo muro/ Quem não tem presente se conforma com o futuro" (o trecho foi censurado e ele teve que mudar para "Quem não tem filé come pão e osso duro/ Quem não tem visão bate a cara contra o muro). Na foto à direita, vemos outro exemplo de alguém que "deu o recado". Não sei até que ponto a propaganda eleitoral nos muros, painéis, bandeiras e outdoors espalhados aos milhares pela cidade é menos agressiva ou poluidora. E não deixo de respeitar a ousadia dos que foram à "festa dos contentes" na Bienal para cuspir no bolo. Se os bem nascidos chiam, é porque "Narciso acha feio o que não é espelho". É hora de debater melhor essa manifestação popular.

8 comentários:

Anônimo disse...

Vale relembrar o fato da “limpeza” do painel pintado pelos irmãos grafiteiros Gustavo e Otávio Pandolfo, na 23 de maio, em São Paulo. O painel foi apagado por uma empresa terceirizada que prestava serviço para a prefeitura. A situação causou polêmica, mas para quem anda por alguns bairros paulistanos (como o Cambuci) sabe que de fato pichação e grafite é a mesma coisa para essas empresas. E não interessa, a ordem é passar tinta cinza em cima.

Anselmo disse...

Não é cinza, é um bege acinzentado. Ou um branco que incorpora a poluição...

Mas qdo o tema é pichação e política, a primeira que me vem à mente é a "Quércia vem aí" que, até pouco tempo, ainda aparecia em alguns cantos. Bem bizarro.

Outra pichação curiosa, apagada em tempo recorde, foi contra a Veja, na avenida doutor arnaldo em 2006.

Acho só que tem que tomar cuidado ao considerar toda pichação como manifestação popular. Até pq o termo "popular" pode querer dizer um monte de coisas. Mas que a discussão vale, sem dúvida.

Glauco disse...

De pichação política lembro de uma antiga que dizia "A GM programou o câncer de Tancredo Neves" e, mais apolítica - ou não, outra que se espalhou em São Paulo e que afirmava "Jô Soares camufla".

Em tempo: ao contrário do trecho que fala da cidade com "propaganda eleitoral nos muros, painéis, bandeiras e outdoors", esses foram controlados por infringirem a lei Cidade Limpa em São Paulo e a legislação eleitoral também restringiu bastante a propaganda eleitoral(menos as bandeiras). Nesse aspecto, essas eleições foram bem menos poluídas do que as anteriores.

Fabricio disse...

A melhor que já vi ainda deve estar num lixo de concreto do lado do DCE da USP: "Entre e fique a vontade."

Sensacional.

Maurício Ayer disse...

Um grande amigo meu é grafiteiro/pichador. O fato é que nem para os grafiteiros/pichadores é muito clara a diferença entre as duas coisas. Essa coisa de "grafite é arte, pichação é sujeira" não é exatamente uma questão que aflige a mente de quem de fato faz grafite/pichação. Digo isso, claro, em geral.
Uma vez um grafiteiro disse que muita gente que acabava encampando
essa diferenciação por conta de uma disputa por muros. Se você diz que é grafiteiro e o outro é pichador, libera muros pra você e limita pro outro...
mas esse caso da bienal é sem dúvida uma intervenção muito interessante, que consegue furar o cerco de proteção ao governador Serra.

Anônimo disse...

Acho uma baita utopia ver muita politização nas pichações atuais. Se existem mensagens políticas na "arte" dos pichadores, elas talvez não superem os 10%.

A maioria é coisa de moleque mesmo, vandalismo barato, que merece punição das mais exemplares. Tenho uma dó danada quando passo numa casa de classe média ou mesmo média-baixa - não é só coisa de bem nascido - e vejo a fachada destruída por um monte de idiota que não tem o que fazer.

Nicolau disse...

De fato, a maior parte das pichações é molecagem mesmo. Mas as coisas políticas são interessantes. Eu estive na Bolívia faz uns anos e numa cidade pela qual passei, em Cochabamba, fiquei impressionado com a quantidade de pichações políticas que encontrei. O país estava passando por aquela fase de manifestações que derrubaram o governo de Carlos Mesa e questões como a privatização da água e a posse do gás estavam nas paredes. Sobre a ação dos pichadores na Bienal, achei excelente e corajosa.

Nicolau disse...

Uma questão nada a ver: é a Thalita na primeira foto do post?