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O menino Mané |
O garoto Vininha |
Vinicius, em 1958 |
Garrincha, na Suécia |
Seu uníssono canto de esperança.
Garrincha, o anjo, escuta e atende: - Goooool!
É pura imagem: um G que chuta um o
Dentro da meta, um L. É pura dança!
O menino Mané |
O garoto Vininha |
Vinicius, em 1958 |
Garrincha, na Suécia |
Não é efeméride, porque o número não é redondo. Mas é para lá de cabalístico. Faltando 666 dias, um efeito Orloff aplicado ao Estádio Nacional Mané Garrincha.
Quando pus os pés, embalados em sapato social, de mudança para Brasília, as obras do Estádio Nacional Mané Garricha estavam 50% concluídas. Isso quer dizer que, do anel superior, a parte de concreto das arquibancadas, só tinha pilares a meia altura. Muito vergalhão de aço galvanizado, guindastes, operários trabalhando a todo vapor, otimismo de uns moradores, dúvidas e ceticismo de outros tantos.
Faltavam 845 dias para a Copa.
Fotos: Futepoca
Em um dia 17 de junho como hoje o Brasil defendia seu
primeiro título mundial de futebol, conquistado quatro anos antes na Suécia. A base titular daquela seleção
era praticamente a mesma de 1958, inicialmente, apenas com
duas mudanças: os zagueiros, Mauro e Zózimo,
no lugar de Bellini e Orlando. Nílton Santos, mesmo com 37 anos e já
atuando como zagueiro pelo Botafogo por conta da idade, foi escalado
como titular, barrando Rildo, do Santos, que fazia parte da primeira
lista de 41 convocados mas acabou cortado. Já Coutinho, que vinha
jogando no time de Aymoré Moreira, foi para a reserva e cedeu lugar
para Vavá no Mundial, pois o treinador privilegiou a experiência
dos campeões de 58.
Dos 22 atletas que
foram ao Chile, sete eram do Santos, cinco do Botafogo, três do
Palmeiras, três do Fluminense e dois do São Paulo. Ainda havia
Zózimo, do Bangu, e o jovem Jair da Costa, da Portuguesa. O grupo da
seleção no torneio contava com México, Tchecoslováquia e Espanha.
A estreia foi contra os mexicanos e o Brasil venceu por 2 a 0, mas
não jogou um futebol convincente. Pelé fez o cruzamento para
Zagallo marcar o primeiro gol da partida, que só surgiu aos 11 do
segundo tempo e o próprio Dez marcou o segundo, depois de driblar
dois adversários, aos 28.
Hoje, no Dia Nacional do Samba, postamos uma homenagem a quatro brasileiros que, no futebol, tiraram muitas vezes os adversários para sambar: Manoel "Garrincha" dos Santos, Ronaldo "Fenômeno" Nazário, Ronaldinho "Gaúcho" Assis Moreira e Róbson "Robinho" de Souza. Como só os brasileiros sabem fazer.
Na biografia de Garrincha, Ruy Castro diz que o jogador, quando criança, disputava peladas num campinho de terra todo esburacado, à beira de uma vala cheia de espinheiros. Quem derrubasse a bola ali teria que se cortar todo para buscá-la. Por isso, além de compensar a deficiência das pernas tortas, Garrincha tinha que driblar os adversários mais os buracos, para não torcer o pé, e controlar a bola de modo que não despencasse pela perigosa pirambeira. Segundo seus colegas de infância, ele foi o único que desenvolveu a técnica de fazer todo esse malabarismo simultâneo, o que teria contribuído de maneira decisiva para sua futura (e extraordinária) habilidade com a bola.
Pois bem, fuçando pela net, assiti uma reportagem com o Sócrates em que ele conta a origem de sua marca registrada, os toques de calcanhar. Segundo o ex-jogador, o motivo foi a falta de preparo físico. "Quando eu me tornei profissional, eu tinha que jogar o jogo inteiro. E eu não tinha físico pra, naquela situação, usar a mesma coisa que eu usava no juvenil. Aí eu comecei a jogar com um toque só. E era de calcanhar, de bunda, de joelho, do que desse", relembra o Doutor. "Porque ninguém podia encostar em mim, eu era um esqueleto. Se me dessem uma ombrada, me jogavam na arquibancada". Pois é, mais um caso em que a necessidade impulsionou a genialidade.
Sócrates fazendo sua jogada característica contra o rival São Paulo
PINGA
(John Ulhoa)
Pato Fu
Eu tomo pinga
Eu não sei o que é melhor pra mim
Eu tomo pinga
Mesmo já sabendo o que vai dar no fim
Eu tomo pinga
Será que eu tô gostando de viver assim?
Eu tomo pinga
Será que isso é bom ou ruim?
Aah... aah....
Se eu fosse o Pelé tomava café
Se eu fosse o Tostão tirava o calção
Se eu fosse o Dario pulava no rio
Se eu fosse o Garrincha não pulava não
Eu tomo pinga
Eu não sei o que é melhor pra mim
Mesmo já sabendo o que vai dar no fim
Será que eu tô gostando de viver assim?
Será que isso é bom ou ruim?
Aah... aah....
Se eu fosse o Pelé...
Se eu fosse o Tostão...
Seu eu fosse o Dario...
(Do CD "Tem mas acabou", Sony BMG, 1996)
Enquanto se debate as dificuldades que as eleições municipais trouxeram ao ninho tucano, corre na Assembléia Legislativa que a discussão sobre a sucessão do governador Jose Serra está a todo vapor. Ninguém segura a informação da candidatura de Aloysio Nunes Ferreira (à direita), atual chefe da Casa Civil paulista, ao governo do estado. Segundo se fala, ele não saiu candidato nas últimas eleições porque foi incumbido de coordenar a futura candidatura de Serra à Presidência da República. E, ao mesmo tempo, articular a base eleitoral paulista. Assim como fez na Prefeitura de São Paulo, onde era secretário de Governo, está colocando pessoas de sua confiança nas regiões administrativas do Estado de São Paulo.
Pelo acordo do grupo, Serra se afasta para se candidatar à Presidência e o vice Alberto Goldman assume o governo para completar o mandato. Aloysio, tendo na administração do Estado homens de sua confiança, fica livre para disputar a indicação de seu nome ao governo de São Paulo pelo PSDB. De repente, chega no butiquim um deputado governista indignado com esta especulação. Ele lembra o folclórico diálogo entre o técnico Vicente Feola e o jogador Garrincha (acima, à esquerda), na Copa de 1958, minutos antes da partida contra a União Soviética. O técnico chamou o Mané e pediu pra ele, logo de cara, driblar seu marcador pela direita até a linha de fundo e cruzar. Mané ouviu tudo e questionou: "-O senhor já combinou com o gringo?".
Há uma corrente tucana que acredita na possibilidade do presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaff, ser o candidato do partido ao governo estadual. A eleição municipal nem acabou e a do governo do estado já está dividida...
Que Garrincha havia passado pelo Corinthians em 1966 eu já sabia, mas tinha dúvidas se, naquele mesmo ano, Didi havia jogado pelo São Paulo (na foto, os dois nos áureos tempos de Botafogo-RJ). Pois o mestre da folha-seca encerrou sua carreira, de fato, pelo Tricolor paulista. Didi havia pendurado as chuteiras pelo Botafogo em 1965, mas aceitou o convite para voltar, no ano seguinte, aos 38 anos. Estreou pelo São Paulo num amistoso em Araçatuba (SP), contra o Ferroviário local (vitória por 2 a 0), em 4 de outubro. Ele compunha o meio-campo com o histórico Roberto Dias. O técnico do Tricolor, na época, era Aimoré Moreira, que comandou Didi pela seleção brasileira no bicampeonato mundial, em 1962. E a zaga tinha Bellini, outro remanescente das Copas de 1958 e 1962, que havia disputado ainda a de 1966, junto com o também são-paulino Paraná.
O primeiro jogo oficial de Didi com a camisa do Tricolor, pelo Campeonato Paulista, foi uma derrota de 2 a 0 para a Portuguesa, no Pacaembu, em 12 de outubro. Na rodada seguinte, mais um tropeço: vitória do América de Rio Preto por 4 a 3, em pleno Morumbi. Didi foi sacado e só voltou contra a Portuguesa, em 24 de novembro: novamente no Pacaembu e outro resultado negativo, 1 a 0. Terminava ali, de forma melancólica (venceu só uma partida em quatro e não marcou um gol sequer), a carreira do "Príncipe Etíope", um dos meias mais clássicos e cerebrais que o Brasil já teve.
Curiosamente, naquele mesmo início de outubro de 1966 em que Didi estreava pelo São Paulo, Garrincha, então com 33 anos, se despedia do rival Corinthians. Foi no dia 9, numa derrota de 3 a 0 para o Santos, pelo Paulistão. Mané havia estreado em 2 de março, no Pacaembu, em outra derrota por 3 a 0, para o Vasco da Gama, pelo Torneio Rio-São Paulo. Os dois times, mais Santos e Botafogo, seriam os quatro campeões do torneio naquele ano, por falta de datas para as partidas de desempate. Garrincha marcou seu primeiro gol pelo alvinegro paulistano contra o Cruzeiro, em 13 de março, na vitória corintiana por 2 a 1.
No total, fez 10 jogos e 2 gols - o segundo, aliás, na vitória por 2 a 0 do Corinthians sobre o São Paulo, em 19 de março de 1966. Ao contrário de Didi, que era cinco anos mais velho, Garrincha ainda jogaria pelo Flamengo e o Olaria, até 1972. Despediu-se numa partida amistosa no ano seguinte, no Maracanã. Morreria em janeiro de 1983, e Didi, em maio de 2001.
Ulf (centro) com Magrão, um quadro com imagens do pai e garrafas no bar O Torto, em Curitiba (a foto é de Rodolfo Bührer, da Gazeta do Povo)
Aos 47 anos, o sueco Ulf Lindiberg Henrik já viveu quase o mesmo tanto que seu pai, o brasileiro (mais brasileiro, impossível) Manoel dos Santos (foto abaixo), o gênio do futebol Garrincha (1933-1983), morto precocemente por problemas de saúde causados pelo alcoolismo crônico. Ironicamente, o "herdeiro" europeu veio ao Brasil, desta vez, a convite de Arlindo Ventura, o Magrão, dono do bar temático O Torto, em Curitiba (PR). Ulf aproveitou para assistir o clássico Atlético-PR x Coritiba, na Arena da Baixada. Na oportunidade, espetou o técnico da seleção canarinho: "-Um time com Ronaldinho, Ronaldo, Kaká... tem de atuar sempre para a frente. Não dá para pôr apenas jogadores para destruir. Definitivamente, não gosto de Dunga".
A corneta de Ulf não significa nada, mas não custa lembrar o quanto seu pai trabalhou (e bem) pela seleção brasileira: foram 60 jogos, 17 gols, inúmeras assistências, três Copas disputadas e duas conquistadas, com participação crucial na Suécia e atuação de protagonista no Chile (abaixo, sete mexicanos tentando marcá-lo em 1962). Com ele em campo, o Brasil perdeu uma única vez, na Copa de 1966, em Liverpool, para a Hungria (3 a 1). De resto, foram fantásticas 52 vitórias e apenas 7 empates. Jogando ao lado de Pelé, nunca perdeu. "Entendo o interesse das pessoas pelo meu pai. Garrincha não foi tão mostrado na TV como Pelé. Pelé foi grande, mas tinha muita mídia. Muita gente que viu os dois diz que Garrincha foi melhor", exagera Ulf. Mas que a memória de Garrincha merecia um pouco mais de atenção nesse país, não resta dúvida. Quando Ulf visitou o Brasil pela primeira vez, em 2005, encontrou apenas um vaso velho com flores secas no modestíssimo túmulo do pai no Cemitério de Raiz da Serra, distrito de Magé (RJ), vizinho a Pau Grande. A precária pedra de mármore que cobre a terra foi comprada pelo ex-jogador Nilton Santos.
Em tempo: muita gente crê que Mané Garrincha gerou um filho na Suécia durante a Copa de 1958, mas não é verdade. A mãe de Ulf engravidou em maio de 1959, durante uma excursão do Botafogo àquele país. O menino nasceu no ano seguinte, foi abandonado pela mãe e adotado aos nove meses. A família adotiva revelou o nome de seu pai quando ele tinha oito anos. O teste que comprovou a paternidade foi realizado apenas em 1998. O sueco sempre quis conhecer o pai e teve uma oportunidade em 1978, mas não conseguiu fazer a viagem. Cinco anos depois, Garrincha perdeu a última batalha contra o álcool e acabou com as chances de um encontro. O ex-jogador teve 15 filhos reconhecidos, sendo 12 mulheres e três homens (acima, com Nenem, filho que jogou pelo Fluminense e faleceu em acidente automobilístico em 1992, aos 33 anos, quando estava no Belenenses, em Portugal). O outro filho, Garrinchinha, que teve com a cantora Elza Soares, morreu igualmente em acidente de carro, aos 10 anos, em 1986. Tereza e Edenir, as mais velhas do casamento com Nair, também já faleceram. Estão vivos, além de Ulf: Marinete, Juraciara, Denízia, Maria Cecília (à esquerda), Terezinha e Cintia (também filhas de Nair), Rosângela (filha de Alcina), Márcia (irmã de Nenem, filha de Iraci) e Lívia (filha de Vanderléa, ex-mulher do falecido jogador Jorginho Carvoeiro).
15 de junho de 1958. A terceira rodada da Copa do Mundo definiria os oito países classificados para as oitavas-de-final do torneio. O Brasil enfrentava a União Soviética e, em caso de vitória, asseguraria o primeiro lugar no grupo. O técnico Vicente Feola fazia, em relação à partida anterior contra a Inglaterra, três alterações: Vavá, que já havia entrado no jogo contra os ingleses no lugar o meia esquerda Dida, foi deslocado para o ataque, sua posição normal. Para a posição de Dida, Feola colocou o garoto Pelé. O ponta Joel também foi sacado para a entrada de Garrincha, enquanto Dino dava lugar a Zito.
A União Soviética, segundo a Gazeta Esportiva Ilustrada, tinha um esquema de jogo que se assemelhava mais ao sul-americano. O centro-médio soviético, ao contrário dos ingleses e da maioria dos europeus, apoiava o ataque, dando um caráter mais ofensivo ao time. Muito em função disso, o sistema vermelho “encaixou” com o jogo brasileiro, fazendo a seleção “levar de roldão” o adversário.
Os vinte primeiros minutos e os vinte finais foram de um domínio absoluto da seleção brasileira. Durante o resto do tempo, a União Soviética recuava a bola para Yashin (era permitido ao goleiro segurá-la com as mãos), tentando esfriar o ritmo da partida. As estocadas e dribles desconcertantes de Garrincha, que recebia passes longos e precisos de Didi, desnortearam a defesa soviética, como já dito aqui. Pelé e Vavá também protagonizaram lances vistosos, com tabelas curtas e rápidas como a que resultou no segundo gol brasileiro.
O final de 2 a 0, gols de Vavá, foi considerado injusto, dada a superioridade verde-e-amarela. Garrincha passou a ser chamado pelos suecos de “rei do dribbling” após a partida contra a União Soviética e o Gotemborg Handels estampou na capa: “Esse diabinho foi a alma danada dos russos”, referindo-se ao ponta. O primeiro lugar do grupo estava assegurado e o Brasil confirmava o favoritismo que muitos europeus atribuíam à seleção antes do início da Copa.
Partidas desempate
Na outra partida do grupo do Brasil, Áustria e Inglaterra empataram em 2 a 2. A regra dizia que, caso dois times empatassem em número de pontos, seria realizada uma partida desempate para ver quem avançaria à próxima fase. Foi o que aconteceu com Inglaterra (3 empates, 3 pontos) e União Soviética (1 vitória, que valia 2 pontos, um empate e uma derrota). Vitória dos soviéticos, 1 a 0 na peleja extra de 17 de junho.
No grupo I, a Alemanha Ocidental esteve duas vezes em desvantagem no placar, mas conseguiu empatar com a Irlanda do Norte, 2 a 2. Na outra partida, uma goleada daquelas da Tchecoslováquia sobre os hermanos argentinos: 6 a 1, a maior derrota portenha em Mundiais. Mesmo assim, os tchecos e os irlandeses terminaram empatados e tiveram que fazer mais um jogo: 1 a 1 no tempo normal e um solitário gol na prorrogação garantiu a surpreendente classificação da Irlanda do Norte como segunda colocada.
A Suécia, já classificada, jogou com cinco reservas para cumprir tabela contra o País de Gales no grupo II. O empate em 0 a 0 levou os galeses a disputarem o segundo lugar do grupo contra a Hungria, que vencera o México por 4 a 0. Na partida desempate, vitória de virada do time galês , 2 a 1. Pelo grupo III, a França derrotou a retrancada Escócia por 2 a 1, enquanto o Paraguai, em arbitragem tolerante com a violência da Iugoslávia, não passou de um empate em 3 a 3 com os europeus. A França terminou em primeiro e os iugoslavos em segundo.
Muito já foi escrito sobre o jogo entre Brasil e a então existente União Soviética, na Copa de 1958. Naquele dia, nossa seleção entrou em campo com três novidades: Zito, Pelé e Garrincha. O placar de 2 a 0 pode parecer pouco para as novas gerações, mas, na ocasião, soou como uma tremenda goleada em cima do "futebol científico" que havia faturado a medalha de ouro nas Olimpíadas de Melbourne, na Austrália, dois anos antes. Ruy Castro conta, no livro "Estrela Solitária: Um brasileiro chamado Garrincha" (Companhia das Letras, 1995), que, pouco antes de os times entrarem em campo, o técnico Vicente Feola olhou para o meia Didi e falou: "-Toque todas as bolas para o Garrincha". E, virando-se para o ponta-direita: "-Tente descadeirá-los logo de saída". Assim que o juiz apitou o início da partida, segundo texto da época, aconteceu simplesmente o seguinte:
Vavá toca para Didi, que lança Garrincha. O lateral Kuznetsov corre. Mané ginga o corpo para a esquerda, mas sai pela direita. Kuznetsov desaba de traseiro no chão. A educada torcida sueca não sabe se ri ou se aplaude. Na dúvida, deixa o queixo cair. Sete segundos depois, Garrincha tem de novo Kuznetsov à sua frente. De novo, balança o corpo para direita e passa como uma flecha para a esquerda. Repentinamente, pisa na bola e estanca. O lateral soviético volta à carga. Leva outro drible. E mais outro. A torcida fica de pé, atônita. Mané invade a área perseguido por Kuznetsov, Voinov e Krijevski. Dribla os três. Pelé está livre na pequena área. Mas Garrincha, mesmo sem ângulo, dispara a bomba. A bola explode na trave direita de Yashin e se perde pela linha de fundo. Um minuto de jogo. O estádio inteiro ri e aplaude com entusiasmo. Garrincha volta para o meio de campo com seu trote desengonçado. A defesa brasileira intercepta o tiro de meta soviético e a bola vai aos pés de Mané. Que passa para Didi. Para Pelé. Para Garrincha. Para Pelé. Outra bomba estoura contra as traves de Yashin. Dois minutos de jogo. Garrincha está de novo com a bola. Corre em ziguezague. Finge que vai, e não vai; finge que vai, e vai. Os soviéticos vão ficando estendidos no chão. Um a um. Didi lança Vavá. Gol do Brasil. O relógio marca três minutos.
"Foram os três minutos mais fantásticos da história do futebol e a mais assombrosa aparição na ponta-direita desde Stanley Mathews", escreveu, deslumbrado, o jornalista francês Gabriel Hannot. Só por esses três minutos, esse jogo já merece ser imortalizado como um dos mais espantosos da história do futebol. Ouça trechos da narração da Rádio Panamericana, de São Paulo, na época:
Ouça trechos do jogo
Se não abrir, clique aqui.
Ficha técnica
Data: 15/Junho/1958
Local: Estádio Nya Ullevi, Gotemburgo
Público: 50.928
Árbitro: Maurice Frederic Guigue (França)
Brasil: Gilmar; De Sordi, Bellini, Orlando e Nílton Santos; Zito e Didi; Garrincha, Vavá, Pelé e Zagallo; Técnico: Vicente Feola;
URSS: Yashin; Kesarev, Kuznetsov, Voinov e Krijevski; Tsarev, A. Ivanov e V. Ivanov; Simonjan, Iljin e Netto; Técnico: Gavril Katchaline;
Gols: Vavá (3) e Vavá (66).
O companheiro Marcão, nesse post, contou a versão de Feola sobre a escalação de Zagallo na ponta-esquerda na Copa de 58, preterindo José Macia, o Pepe (foto), que ficou na reserva. O ponta santista, em entrevista da qual participei para a revista Fórum, não contradiz totalmente os argumentos de Feola, mas relata de forma mais completa como ocorreu a decisão do técnico entre escolher Zagallo, Pepe ou Canhoteiro. Ele também não descarta uma certa pressão para que Pelé e Garrincha fossem escalados. Eis a versão do "Canhão da Vila":
Convocação
Em época de Copa sou muito entrevistado e realmente me aborreço muito porque não joguei nem em 1958, nem em 1962. Antes da Copa de 1958 fizeram exames médicos mais rigorosos na Seleção e me pegaram com um problema na gengiva e nos dentes. Tive de fazer algumas extrações e perdi tempo, fiquei sem treinar por uns dez dias e o Zagallo começou a ganhar a posição.
A dúvida do Feola [Vicente, técnico da Seleção] era se ia cortar eu ou o Canhoteiro. E, no jogo contra a Bulgária, Feola optou por ele. Quando estava 1 a 1 e faltavam 20 minutos para acabar o jogo, eu entrei e mandei uma bomba no peito do goleiro. No rebote, o Pelé fez 2 a 1 e eu fiz o terceiro. Os jornais diziam que eu tinha assinado o passaporte para a Suécia.
Amistosos e contusão
Depois, teve um jogo de “desagravo” contra o Corinthians, porque Luizinho não havia sido convocado e a torcida não aceitava. Ganhamos de 5 a 0 e já joguei de titular e marquei 2 gols.
Viajamos para a Europa e fomos enfrentar a Fiorentina, ganhamos de 4 a 0 e fiz um gol. O fatídico jogo foi contra a Inter de Milão, o último amistoso antes de embarcarmos para a Suécia.
Estávamos ganhando de 2 a 0, quando parti com a bola dominada e um italiano me deu uma no tornozelo direito que cheguei a virar o pé. Desembarquei na Suécia de chinelo com o pé muito inchado. Com o tratamento, fiquei bom só na quarta rodada e o Zagallo já estava jogando com o time embalado.
A Copa do Chile
Em 1962, pensava “agora é comigo mesmo”. Depois de 1958, fui titular em 1959, 1960 e 1961 e aí veio a Copa. No Chile, tive novamente problema de contusão, estava treinando e de repente cresceu uma bola na minha perna. Fiquei fazendo tratamento e não consegui me recuperar.
Naquela época, o tratamento era toalha quente, água quente, raios-X e infravermelho. Falei para o Mário Américo: “doutor, preciso ficar bom, preciso jogar. Lá no Santos, quando tem um problema muito sério, a gente toma uma infiltração e em três, quatro dias fica bom”. Aí ele me deu a injeção. No dia seguinte, teve uma missa e eu apareci agarrado em dois jogadores, nem podia andar por causa da reação que deu na perna. Não sei se houve imperícia da parte dele porque não estava acostumado a dar injeção, sei que perdi de vez o foco da Copa, não tive mais chance alguma de jogar. Vim para o Brasil e o médico do Santos me examinou e perguntou: “o que fizeram com você?” Estava com queimadura de terceiro grau no joelho.
O papel dos líderes em 1958
Eu fazia o meu papel e jogava, não participava de nenhum tipo de reunião com a comissão técnica. Pode ter acontecido com o Nílton Santos, com o Didi, o Bellini, jogadores mais experientes, que tenham pedido a presença do Garrincha e do Pelé. Não participei de nenhuma reunião, mas acho que houve. Estava saltando aos olhos que estávamos precisando do Pelé e do Garrincha, embora a gente não pudesse prever que um menino de 17 anos fizesse aquele estrago todo.